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As cadeias curtas de abastecimento e a relação com a pandemia

Christiane M. Pitaluga (*) | 29/05/2020 14:13

A pandemia de covid-19 tem nos evidenciado muitos desafios a serem transpostos, que vão muito além das particularidades dos sistemas de saúde do mundo. Estamos vivenciando uma situação completamente atípica e peculiar porque estamos diante de uma crise que nasce “fora da economia”, mas que traz implicações diretas para as decisões de gastos e de demanda, que estão sendo duramente afetadas.

Desta forma, estamos atravessando uma situação muita rara: de um lado temos uma crise de oferta e do outro uma crise de demanda por produtos e serviços. Uma crise da “economia real” (de produção, de emprego, de renda) Mas então, o que uma crise dessa magnitude e proporção sinaliza para nós, sociedade urbanizada, em termos de mudanças de hábitos de consumo e que possam se tornar permanentes? Para responder a tal questionamento, devemos pensar de forma equilibrada e isso significa que precisamos refletir sobre nossa saúde, sobre a saúde do ambiente e pensar sobre o que estamos consumindo.

Inseridos nesse contexto de pandemia precisamos repensar nossas “novas formas consumo” pois à medida que o mundo foi se globalizando os alimentos foram sendo paulatinamente “desenraizados” e com muita rapidez foram se distanciando de sua base natural. Precisamos mudar nosso padrão de consumo: a crise sanitária nos impõe alterações no consumo de alimentos provenientes de cadeias de suprimentos alimentares longas, que envolvem uma extensa e complexa rede de agentes que intermediam os processos e que praticamente anulam as relações diretas entre produtores e consumidores. Ou seja, os alimentos comercializados nos grandes pontos de venda à varejo se transformam em produtos de uma determinada marca, indústria, supermercados e ainda muitos destes carregam um “nome fantasia”. Neste tipo de cadeia ocorre o desaparecimento tanto da identidade quanto da procedência do produto.

É neste momento que devemos repensar a nossa atuação: a crise sanitária enaltece a importância de conhecermos a procedência dos alimentos. Questionamentos como “quantos quilômetros esse alimento viajou até chegar à nossa mesa” passam agora a ter outro sentido. Assim, devemos voltar nossa atenção para os agricultores familiares, localizados em regiões próximas às cidades e que serão os responsáveis por apontar soluções alimentares para a crise que estamos atravessando.

Pronto! Neste momento estamos preparados para discorrer um pouco sobre um novo modo de produzir e consumir alimentos. Vamos começar destacando que as cadeias curtas, ou também denominadas como circuitos curtos, buscam a promoção da inclusão socioeconômica de um grupo de produtores excluídos pelo sistema agroalimentar que domina o mundo.

Essas cadeias curtas se configuram como mecanismos para a criação de novas relações entre produtores e consumidores, pois aproximam as pessoas da origem dos alimentos, ou seja, promovem um contato direto entre produtores e consumidores, além de propiciar uma re-espacialização do alimento; isto significa dizer que oportunizam aos consumidores a valorização dos produtos locais e o “encurtamento” das relações junto aos produtores de alimentos.

No que se refere às políticas públicas, os holofotes devem se voltar para ações que apoiem os pequenos agricultores familiares, grupo que necessita de oportunidades de ordem econômica, de esforços na construção e promoção de espaços e eventos que oportunizem a manifestação dos consumidores no âmbito das suas preferências a favor de alimentos saudáveis, com procedência, com qualidade e sobretudo com preços compatíveis. Defendemos que a agricultura familiar é capaz de garantir que as pessoas que habitam as cidades possam ter acesso a alimentos sadios, seguros e com qualidade, contribuindo decisivamente com a saúde pública.

Mas afinal, qual é a relação da crise sanitária e econômica propiciada pela expansão da contaminação do coronavírus com as cadeias curtas? Considerando que desde março estamos diante de uma ruptura abrupta nas formas e níveis de comercialização, faz-se imperioso destacar que a promoção de novos hábitos de consumo alimentares são significativamente importantes e também se tornam responsáveis por alavancar e dinamizar as pequenas economias locais do Estado de Mato Grosso do Sul, em especial às que se encontram em fase de fortalecimento e de expansão dos seus negócios agroalimentares.

Por fim, não podemos deixar de referenciar que o ato de comprar e consumir produtos de origem local, diretamente dos produtores, reforça e promove diversos aspectos sociais, econômicos, culturais e de saudabilidade, dentre eles: o frescor e sabor dos alimentos, a qualidade nutricional, a confiança na origem e identidade do produto, o papel dos agricultores familiares como agentes propulsores de transformações no campo, a expansão e o fortalecimento da renda em tempos de incertezas e de retração de demanda, o desenvolvimento e o dinamismo local, elementos todos estes essenciais para a sobrevivência e enfrentamento diante da atual conjuntura econômica e social.

(*) Christiane M. Pitaluga é docente da Escola de Administração e Negócios da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, economista e mestre em agronegócios.

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