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Capital

Projeto da Justiça garante entrega de bebês à adoção com sigilo e sem crime

De 27 mulheres atendidas em 2021, 11 entregaram os filhos e 16 ficaram com a criança

Aline dos Santos | 10/08/2022 08:39

“De longe te-hei de amar

da tranquila distância

em que o amor é saudade

e o desejo, constância”

Cecilia Meireles

Lei garante o direito da mulher entregar bebê para a adoção. (Foto: Paula Cayres)
Lei garante o direito da mulher entregar bebê para a adoção. (Foto: Paula Cayres)

Lançado em 5 de setembro de 2011, o Projeto Dar a Luz, realizado pelo TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), garante à gestante o direito de entregar o bebê para adoção. A possibilidade é prevista pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), portanto não há crime na entrega voluntária. Já deixá-los na porta de residências ou em terrenos baldios é crime de abandono de incapaz.

A iniciativa também assegura cuidados para que a mulher não seja vítima de julgamentos morais e inclui delicadezas, como evitar o contato pele a pele entre a mãe e a criança ou levar o bebê para a amamentação.

De acordo com a juíza da Vara da Infância, Adolescência e do Idoso, Katy Braun do Prado, a ideia do projeto surgiu diante da grande quantidade de mulheres que abandonam seus filhos ou procuram desconhecidos para assumirem sua criação, por não saberem que entregar um filho à adoção não é crime.

No ano passado, em Campo Grande, foram atendidas 27 mulheres: 11 entregaram os filhos e as outras 16 preferiram criá-los após receberem apoio.

A entrega voluntária de bebê para a adoção ganhou projeção em junho, quando a atriz Klara Castanho, 21 anos, que foi vítima de estupro, teve vazado os detalhes de que encaminhou a criança para a adoção após o parto. Em seguida, ela divulgou uma carta aberta em suas redes sociais.

“Pensei que levaria essa dor e esse peso somente comigo. Sempre mantive a minha vida afetiva privada, assim, expô-la dessa maneira é algo que me apavora e remexe dores profundas e recentes”, escreveu, num pungente relato sobre o tribunal da internet, enquanto a lei de fato garantia a ela e a todas as mulheres o direito ao sigilo da identidade.

Segundo a magistrada, os profissionais de saúde têm demonstrado respeito e sensibilidade no atendimento das gestantes e puérperas em Campo Grande. "Não temos enfrentado problemas de violação ao direito ao sigilo".

Contudo, de modo geral, ainda existe preconceito contra a mulher que entrega o filho para adoção. "Mas a sociedade tem compreendido que somente a gestante ou puérpera podem avaliar a situação que estão vivenciando e decidir sobre o melhor futuro para o filho. As mulheres que entregam os filhos estão sempre desejando o melhor para as crianças", enfatiza a juíza.

Passo a passo – “O que fazer quando a gestante, antes do parto, ou a mãe, logo após o parto, manifestar a intenção ou a vontade de entregar seu filho para adoção?”

Com essa pergunta, o manual do projeto “Dar a Luz” detalha os procedimentos em 11 etapas. O primeiro passo é encaminhar a gestante/mãe para a Vara da Infância e da Adolescência de sua cidade. De acordo com o ECA, a comunicação deve ser imediata.

Nesta etapa, uma parada fundamental, com orientação para os profissionais de Saúde, conselheiros tutelares, grupos de apoio e representantes do Ministério Público, Defensoria Pública e Polícia Civil: “Estes profissionais não deverão julgar a intenção da gestante ou da puérpera e nem tentar persuadi-la a mudar de ideia”.

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O segundo ponto é garantir à gestante ou à mãe o sigilo sobre a gravidez ou o nascimento da criança, se assim ela o desejar.

A equipe multiprofissional do Juízo da Infância e da Adolescência deverá acolher a gestante sem constrangimento; oferecer as orientações psicológicas e jurídicas sobre a adoção;  motivar a adesão aos exames de pré-natal; e entrevistar membros da família extensa, caso não haja recusa da gestante, na tentativa de avaliar a possibilidade da criança permanecer na família.

Na quarta etapa, o magistrado encaminhará o relatório da equipe psicossocial para o representante do Ministério Público ou defensor público formalizar o pedido de aplicação de medidas protetivas em favor da gestante e do nascituro.

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O magistrado determinará o encaminhamento da gestante, mediante sua expressa concordância, à rede pública de saúde e assistência social para atendimento especializado.

No caso de dúvidas da higidez mental da genitora, esta deverá ser encaminhada para avaliação psiquiátrica para garantir a certeza da manifestação da sua vontade.

A equipe psicossocial do Juízo da Infância e da Adolescência deverá articular com o serviço de saúde o adequado tratamento que será dado à parturiente, no sentido de que seja respeitado o desejo da mulher no que se refere ao contato com o bebê e amamentação.

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Após o nascimento da criança será designada a audiência para a oitiva da mãe a respeito de entregar a criança para adoção. Se houver pai registral ou se a mulher tiver cônjuge ou companheiro, ele também deverá ser ouvido pela Justiça.

Persistindo o interesse na entrega do recém-nascido para adoção pela puérpera e pelo genitor, se presente, a autoridade judiciária decretará a extinção do poder familiar e decidirá sobre o acolhimento familiar ou institucional da criança.

Os genitores podem exercer o direito de desistir da entrega até a data da audiência. Podem também exercer o direito ao arrependimento sobre a entrega da criança no prazo de 10 dias da data da sentença que extinguiu o poder familiar.

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