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Artes

Foto no campus da UFMS mostra como eram os cineclubes em 1981 por aqui

Naiane Mesquita | 02/11/2016 07:10
Integrantes do cineclube no campus durante jornada; Diogo de está de camisa branca e bolsa lateral (Foto: Diogo Gomes dos Santos)
Integrantes do cineclube no campus durante jornada; Diogo de está de camisa branca e bolsa lateral (Foto: Diogo Gomes dos Santos)

Um grupo de jovens cruza um dos gramados da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Na imagem, além do amarelado, as roupas mostram que as décadas registradas ali ficaram para trás há muito tempo. O ano exato é 1981, durante a Jornada Nacional de Cineclubes, em uma época em que nem todo filme podia ser exibido livremente, com risco de ser confiscado pelo Estado.

Parte importante na formação de público e profissionais de cinema, os cineclubes espalhados pelo País não tem uma definição de atividade tão correta atualmente. De camisa clara e bolsa lateral na foto, Diogo Gomes dos Santos, 63 anos, viu de perto todas essas mudanças.

Da década de 80 quando desembarcou pela primeira vez em Campo Grande, a bordo do trem que seguia de Bauru para Corumbá e de lá recebia a alcunha de “da morte”, o cineasta e pesquisador percebeu muitas mudanças. “Esse encontro acontecia desde 1959. O objetivo deles era avaliar o trabalho dos cineclubes no País, estabelecer as novas diretrizes do ano seguinte. Contávamos com a presença de convidados, homenagens, era como um festival de cinema, mas sem o caráter de exibição de filmes”, explica Diogo.

As histórias da jornada em Campo Grande começam desde antes de embarcar no trem. “Tinha uma delegação do Nordeste que estava a caminho de São Paulo, então a delegação do Espírito Santo estava esperando, chegou com antecedência do horário do trem. Alguns eram de arquitetura e por decidiram passear pela região. Ficaram desenhando em um local quando foram abordados pela polícia e presos por atitude suspeita”, relembra Diogo.

Foi o suficiente para todo mundo parar na delegacia. “Precisamos mobilizar deputado, vereador. Eram tudo cabeludo, barbudo, maconheiro, como eles achavam na época”, ressalta.

Mesmo com o trem garantido, nem tudo estava certo no cotidiano dos cineclubes. Diariamente era preciso lutar contra a censura. “O Conselho Nacional de Cineclube tinha uma distribuição independente, normalmente com filmes que o mercado não disponibilizava. Era produção independente, com linguagem e conteúdo que era proibido pela censura”, explica.

Para burlar o sistema, o jeito era divulgar no boca a boca. “Falava para um estudante, na associação de bairro e o boca a boca corria. Era uma espécie de contestação velada contra aquele estágio de exceção”, frisa. Na primeira invasão que sofreu a distribuidora perdeu 76 filmes, depois 87. “Fora o que era levado durante as exibições quando cedíamos os filmes aos cineclubes”, diz.

Nesse ponto, o estranho era a Jornada ter o aval do Estado para ser realizada. “A própria Embrafilme patrocinava esses encontros da Jornada. De certa forma você tinha um acordo velado, posso até te apoiar em algumas coisas, mas em outras eu proibia. Então a gente contestava”, ri Diogo.

Apesar do apoio, um dos colaboradores regionais, o cineasta Cândido Alberto da Fonseca, diz que foi sondado para contribuir com o regime na época. “Pediram para fornecer o endereço e as informações sobre cada participante. Mas, eu neguei, demos os dados errados”, frisa.

Lotado na área de extensão da universidade, Cândido foi um dos participantes da jornada. “O que eu mais me arrependo é de não ter guardado um cartaz da jornada”, diz, saudoso.

Ele acredita que cerca de 100 a 120 pessoas participaram da reunião que durou cerca de cinco dias. “Não exibíamos muitos filmes, mas eram pessoas do Brasil inteiro. Pessoas que tinham prazer de mostrar os filmes que não estavam no mercado, que geralmente são de arte, de cunho político, que tem relação com a vida social. Não passávamos blockbusters”, ressalta, se referindo aos filmes arrasta quarteirões, de milhões de dólares.

Nessa década tivemos o Prata da Casa no projeto de extensão, com pessoas que são hoje grandes nomes da música regional, além da jornada. “Tudo dentro da extensão universitária. Campo Grande ainda é muito provinciana, não se abre para interagir com outros Estados, outras cidades. Existe uma participação individual, de alguém que conhece alguém, mas nada muito profundo, coletivo”, acredita.

Diogo que ainda faz parte da Associação Cineclube de São Paulo e já foi presidente do Conselho Nacional, acredita que falta uma delimitação da importância dos cineclubes no País. “Atualmente tem cerca de 2.400 cineclubes no País. Com o projeto Cultura Viva, com os pontos de cultura esse número aumentou. Mas, os participantes perderam um pouco a noção do que ele desenvolve, do filme como objeto de trabalho e do cineclube para a formação de profissionais que trabalham na indústria, do público e dos críticos de cinema”, diz.

A presidente do Cineclube Cinema de Horror, em Campo Grande e da diretoria do Guarani, Carolina Sartomen, 28 anos, explica que atualmente as jornadas acontecem sem uma periodicidade. “A previsão é de um encontro bi-anual, mas nem sempre foi possível. Eles retomaram em 2003 com as políticas públicas de fomento a Cultura”, explica.

Atualmente existem 12 cineclubes em Mato Grosso do Sul, nas cidades de Campo Grande, Corumbá, Dourados, Bonito, Aquidauana, Três Lagoas e Ivinhema.

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