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A quebra e a divulgação do sigilo telefônico

Por Thiago Guerra | 28/02/2012 15:30

Temos visto constantemente na mídia a apresentação de transcrições de conversas obtidas por meio de quebra de sigilo e que, em decorrência de seus fins, são proibidas de serem divulgadas. Certamente, essa quebra de sigilo atinge diretamente o direito à intimidade, mas a violação resultante delas não se dá por igual, ou seja, não ocorre no mesmo momento. Cabe a nós problematizarmos essa situação tão corriqueira atualmente.

Segundo a doutrina constitucional e processual, a interceptação telefônica pode ser dividida em duas espécies: interceptação em sentido estrito e escuta telefônica. Na interceptação em sentido estrito, os interlocutores não sabem da captação da conversa por terceiro, ao passo que na escuta um dos interlocutores sabe que terceiro está tendo acesso ao diálogo. Quanto ao regime jurídico, ambas só podem ser determinadas por ordem judicial para fins de processo ou investigação criminal.

Pois bem, o que muitos desconhecem é que a quebra do sigilo telefônico somente pode ser usada para os fins que foram autorizados, quando muito como prova emprestada em processo administrativo disciplinar. Vale citar a lição de nosso maior estudioso do assunto, Paulo José da Costa Júnior, quando afirma que "na expressão ‘direito à intimidade’ são tutelados dois interesses, que se somam: o interesse de que a intimidade não venha a sofrer agressões e o de que não venha a ser divulgada.

O direito, porém, é o mesmo”. E esse autor ainda ressalta que “no âmbito do direito à intimidade, portanto, podem ser vislumbrados estes dois aspectos: a invasão e a divulgação não autorizada da intimidade legitimamente conquistada."

Ora, se a quebra de sigilo atendeu aos fins de investigação em processo penal, e tanto o inquérito como a ação penal correm em sigilo, a fim de que terceiros não interfiram no bom andamento do processo e da investigação, como tais conversas ainda podem ser divulgadas em âmbito nacional por meio da mídia falada e escrita?

Pensamos que se a nossa Constituição Federal autoriza apenas a quebra do sigilo telefônico para os fins de investigação criminal: não entendemos a razão legal de os textos dessas transcrições telefônicas serem amplamente vazados. Na nossa ótica, isso é configuração criminal e demais atos ilícitos; assim, tanto a autoridade competente de guardar o sigilo quanto os mass media de divulgação devem ser responsabilizados. Entenda-se que ambos devem responder por tal atitude arbitrária, visto que, ao ter sido quebrado o direito de intimidade por autoridade judicial, os frutos dessa quebra só poderão ser usados para os fins propostos. Afora isso, trata-se de violação do direito de intimidade.

Precisamos, no entanto, sempre atentar para o princípio da convivência das liberdades públicas, uma vez que nenhum direito ou garantia fundamental poderá ser utilizado de forma a efetivar prática de atividade ilícita, ou diminuir responsabilidades de natureza civil ou penal decorrentes dessa prática ilícita. A coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito devem evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros, numa relação prática e harmônica.

(*)Thiago Guerra é advogado criminal especialista em processo penal

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