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Impasse: Crise de água em São Paulo X Normas brasileiras

Por Levi Garcia (*) | 03/01/2015 14:00

O que as normas brasileiras têm a ver com a atual escassez de água em São Paulo?

Temos observado muitos debates sobre a crise da água em São Paulo, onde se busca entender as causas e possíveis soluções para este problema. Apontado como causa maior, o fator ambiental tem sido objeto de pesquisas que mostram a gravidade e a tendência de piora para os próximos anos. Ouvimos duras críticas em relação à infraestrutura de reservação e a gestão da oferta - por não terem acompanhado as necessidades da megametrópole - tendo sido inclusive um tema relevante nos debates da última eleição e pauta dos principais veículos de comunicação.

Sabemos que a água ofertada pela mãe-natureza, na região, tem um volume finito, então em algum momento será insuficiente para uma população crescente. Entretanto, pouco se comenta sobre o lado da demanda, da forma como utilizamos a água. Temos diferentes hábitos de consumo quando comparado aos europeus, por exemplo. Tomamos mais banhos e mais longos, gostamos de uma ducha forte! Banho é higiene e prazer. A água sempre foi relativamente barata e economizá-la não traria um ganho significativo.

Hoje o custo já se tornou representativo no orçamento doméstico, forçando a mudança de hábitos, ou seja, o fator comportamental tem papel fundamental no uso racional da agua - URA. Os programas de incentivo sobre o tema, surgidos nesta situação de emergência, mostram caminhos práticos de como reduzir o tempo do banho, a utilização das máquinas de lavar, a limpeza de calçadas e carros, fechar a torneira com frequência, trocar equipamentos antigos por modelos economizadores, entre outras sugestões.

Quando falamos em aplicação residencial, os equipamentos poderiam colaborar de forma mais significativa. Segundo a Sabesp, as ligações residenciais respondem por cerca de 85% dos consumidores. Estudos sobre a distribuição do consumo mostram que os chuveiros demandam mais que 50% do consumo doméstico; pode-se dizer que um chuveiro comum instalado, por exemplo, com uma pressão de 40 m.c.a. (metros de coluna de água) pode gastar mais de 50 litros de água por minuto (além de gastar mais energia), enquanto um chuveiro com restritor de vazão apresenta ótimo conforto com apenas 9 ou 12 litros por minuto. As normas têm evoluído pouco neste quesito pela falta de direcionamento e compromisso do sistema de normalização para com esta causa.

O sistema brasileiro de normalização no campo das instalações hidráulicas prediais é composto por uma série de normas, destacando-se a NBR 5626 e NBR 7198, que tratam das instalações de água fria e água quente respectivamente, cuja revisão está em andamento. Por outro lado, os produtos que são instalados na rede hidráulica também são regidos por normas especificas para os diversos componentes como tubos, torneiras, válvulas, registros, louças sanitárias, etc.

De modo geral, estas normas servem de parâmetro para que fabricantes, especificadores e projetistas as utilizem para que o conjunto final de instalações tenha um bom desempenho. Entretanto não é consenso entre os participantes dos comitês de normalização, que o uso racional da água seja um critério obrigatório para este bom desempenho. Entendemos que sim, é possível e necessário, pois um bom desempenho deve considerar o uso racional da água. Isto se justifica pela relevância da situação, pela lógica da sustentabilidade tão propalada e por razões econômicas, pois em poucos meses o eventual incremento nos custos dos produtos e sistemas hidráulicos seriam compensados pela economia obtida.

Na revisão em andamento, este tema está considerado como opcional para aqueles que quiserem adotar o URA. Por outro lado, as normas sobre produtos não estabelecem limites da vazão máxima. Cada ano perdido na demora para a adoção de sistemas, aparelhos e práticas de uso racional, mais próximo ficamos de enfrentarmos o racionamento da água, o que de certa forma já vem ocorrendo.

As normas nem sempre são compulsórias, mas ganharam muita força como referência legal em decisões judiciais, principalmente na aplicação do código de defesa consumidor e servem como base técnica nos programas setoriais de qualidade (PSQ), dentro do programa brasileiro da qualidade e produtividade da habitação (PBQP-H). Portanto, normas mais alinhadas com os problemas atuais e futuros nos permite evoluir na busca do equilíbrio entre a qualidade dos projetos, as tecnologias empregadas, os custos das instalações, o meio-ambiente e o conforto humano.

(*) Eng. Levi Garcia, diretor de Tecnologia e Produção da Docol

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