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Mudança na CLT cria flanco contra empregador

Por Fernando Borges Vieira* | 03/01/2012 13:30

Em 15 de dezembro passado, passou a vigorar a Lei 12.551, por força da qual o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) passa a ter a seguinte redação:

“Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.”

A alteração do referido dispositivo consolidado traz consigo relevantes consequências à relação de trabalho, possibilitando o reconhecimento do vínculo empregatício em favor daqueles que prestam serviços em domicílio.

Todavia, de atentar-se ao fato de que para o reconhecimento do vínculo hão de estar presentes os requisitos essenciais a tanto, quais sejam: habitualidade, onerosidade, subordinação, pessoalidade e alteridade.

Assim, em relação ao caput do novo artigo 6º da CLT não há motivos para grandes preocupações, apenas não havendo expressamente a necessidade de prestação de serviços na sede da empresa, permanecendo conservados os requisitos caracterizadores do liame empregatício.

A dúvida permanece quanto à forma de controle, por exemplo, da jornada de trabalho, pois a legislação considera como tal o tempo em que o empregado permanece à disposição do empregador, exercendo ou não efetiva prestação de serviços. Como lidar, por exemplo, com o trabalhador que durante algumas horas do dia exerce atividades particulares, preferindo cumprir suas tarefas à noite ou com aquele que tem por hábito adiantar estas tarefas domingo pela manhã ou, ainda, como promover o controle de jornada, evitando o injusto pedido de pagamento de horas extras? Enfim, há uma série de questionamentos cuja orientação caberá à jurisprudência por vir – o que é temeroso.

Nossa sugestão, sobretudo à primeira vista e sob o escopo de evitar pleitos de pagamento de jornada extraordinária sem razão qualquer, é que as empresas exijam de seus empregados a realização das tarefas “logados” à sua plataforma, de sorte ser possível o controle das horas trabalhadas.

Ainda, por extremada cautela, melhor pensar na identificação datiloscópica do empregado em determinados períodos ou para a realização de determinadas tarefas, identificando com menor possibilidade de erro que não seja pessoa distinta e que, de fato, esteja o empregado à disposição.

Pode até parecer cautela excessiva, mas em um país cuja legislação trabalhista é orientada por princípios protetivos tão prevalentes, nenhum cuidado por parte dos empresários é demasiado.

Preocupação maior há em relação ao parágrafo único do artigo 6º consolidado, o qual estabelece que os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

Maior importância tem o fato à luz da Súmula 118 do TST, a qual orienta no sentido de que intervalos concedidos pelo empregador na jornada de trabalho, não previstos em lei, representam tempo à disposição da empresa, remunerados como serviço extraordinário, se acrescidos ao final da jornada.

Assim, em breve síntese e em tese, o empregado que possui um smartphone corporativo e o deixa ligado após a jornada de trabalho teria direito à percepção de horas extras, bastando receber ou enviar um e-mail. Qual o quê!

Em nossa opinião o texto do parágrafo único do artigo 6º consolidado é muito deficiente e precário, pois possibilita a compreensão de que seria suficiente o controle, não havendo a necessidade de que haja ordem a ser cumprida emanada do empregador.

Há de se ter muita cautela, pois a compreensão dos Tribunais Regionais do Trabalho e do próprio Tribunal Superior do Trabalho não é uníssona acerca de ordens recebidas pelos empregados além da jornada e se impõe, urgentemente, a revisão do dispositivo legal de sorte a evitar os muitos conflitos que certamente se estabelecerão.

Na tentativa de se estabelecer regras regulamentadoras da relação de trabalho, o legislador abre um flanco contra os empregadores, tornando-os mais suscetíveis ao reclame e à verdadeira indústria de ações trabalhistas que assola nosso país.

Registre-se que somos, sim, favoráveis ao regramento, à obediência às normas trabalhistas e à defesa dos direitos dos empregados; todavia, não podemos cerrar os olhos à nossa realidade e deixar de perceber que os trabalhadores não são mais aqueles que antecederam a Revolução Industrial, impondo-se repensar os critérios de aferição de hipossuficiência e vulnerabilidade sob a luz de nosso século.

A modernização das leis trabalhistas é medida vital, pois necessário caminhar passo a passo ao lado das mudanças sociais, mas é preciso não agir de modo açodado, sob pena de se agravar ainda mais a já difícil condição dos empreendedores brasileiros.

Aos empresários a recomendação de que avaliem com segurança as vantagens do trabalho em domicílio, verificando quais profissionais podem desenvolver seus misteres nesta modalidade e quais as tarefas a admitem, pois, como costumamos dizer: é melhor prevenir do que indenizar!

(*) Fernando Borges Vieira é sócio responsável pela área trabalhista do Manhães Moreira Advogados Associados.

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