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PSD, na corda bamba!

Por Nelson Valente (*) | 08/06/2011 11:03

Na história brasileira, já existiram dois PSDs, sob o número de legenda 41. O primeiro surgiu em 1945, apoiado pelo presidente Getúlio Vargas, elegeu Eurico Gaspar Dutra, Ulysses Guimarães e Juscelino Kubitschek.

A dissidência do PSD do Rio Grande do Sul foi contemplada na pessoa de Clóvis Pestana, Ministro da Viação, no período final do governo do marechal Dutra. Foi quem inaugurou a Estrada Presidente Dutra, entre Rio e São Paulo. Engenheiro civil, também formado em Direito, Clóvis Pestana pertence à representação do seu estado na Câmara Federal. É engenheiro da Prefeitura de Porto Alegre, já foi prefeito da capital gaúcha e era Secretário de Viação e Obras Públicas do Estado quando o marechal Dutra o chamou para o Ministério.

Com a queda de Getúlio Vargas, a presidência passou a ser ocupada por José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal. No período em que ficou no poder foram realizadas as eleições presidenciais. Concorreram Eurico Gaspar Dutra, apoiado pela coligação PSD-PTB, Eduardo Gomes (UDN), Yedo Fiúza (PCB) e ainda Rolim Teles (Partido Agrário). Saiu vitoriosa a candidatura do general Dutra, por ampla maioria.

Nas eleições presidenciais de 1956 foi eleito, novamente pelas forças getulistas, Juscelino Kubitschek de Oliveira, apoiado pelo PSD e pelo PTB. Derrotadas, as forças antigetulistas - notadamente a UDN - reagiram à ascensão de Juscelino e tentaram impedir a sua posse, que foi garantida pelo "golpe preventivo" do general Henrique Teixeira Lott, então ministro da Guerra.

Em, 1953, Jânio da Silva Quadros é apoiado pelos minúsculos PDC e Partido Socialista Brasileiro, enfrenta uma coligação de sete legendas (PSP, PTB, PSD, UDN, PRP, PR e PRP) e conquista a Prefeitura da capital com 284.922 votos – mais que o dobro de todos os outros candidatos juntos. Batiza sua empreitada de “revolução branca através do voto” e realiza uma administração saneadora das finanças municipais.

Em setembro de 59, Jânio voltou de viagem à Europa e começou sua campanha para a Presidência da República. Com os principais partidos políticos (UDN e PSD) enfraquecidos, a candidatura de Jânio – que sempre se manteve à margem dos partidos – começou a ganhar espaço.

O apoio de Carlos Lacerda foi decisivo para que Jânio conquistasse a UDN, formando uma ampla coligação, que incluía PDC, PTN, PL e PR. Seus adversários eram o marechal Henrique Lott (PSD-PTB) E Adhemar de Barros (PSP).

Também nos bastidores parlamentares, começam imediatamente muitas articulações destinadas a revitalizar os partidos e colocá-los em condições de sobreviver a impactos dessa natureza. Líderes do PSD e do governo tentam atrair deputados da UDN a um esquema único de autodefesa. Com essas manobras, pretendem aproveitar ao máximo os descontentamentos e as decepções dos udenistas em face do seu candidato, Jânio da Silva Quadros.

Foram exatos 6 meses e 25 dias de governo. Eleito com 5.636.623 votos, um recorde na história do País, o candidato da coligação UDN – PTN – PDC – PL – PR que havia assumido a presidência da República no dia 31 de janeiro de 1961, aos 44 anos de idade, não conseguiu fazer o Congresso, dominado pelo PSD e pelo PTB, aprovar as ambiciosas reformas que prometia. Jânio Quadros renunciou no dia 25 de agosto de 1961, denunciando a existência de “forças terríveis” que o impediram de fazer o governo revolucionário que prometera à Nação.

Na formação de seu ministério, Jânio Quadros procurou contemplar os partidos que o apoiaram, mas não teve dúvidas em buscar nomes em outros setores de liderança. Alguns já haviam colaborado com ele no governo do Estado de São Paulo. Um outro, Clemente Mariani, tinha sua filha casada com o filho de Carlos Lacerda. Alguns tinham entre si divergências irreconciliáveis.

O resultado final foi um verdadeiro balaio de gatos, como se vê a seguir:

Relações Exteriores, Afonso Arinos de Melo Franco (UDN); Justiça, Oscar Pedroso Horta, advogado criminalista; Fazenda, Clemente Mariani Ribeiro Bittencourt (UDN); Saúde, Edward Catete Pinheiro; Agricultura, Romero Cabral da Costa, usineiro; Educação e Cultura, Brígido Fernandes Tinoco; Trabalho e Previdência Social, Francisco Carlos de Castro Neves, advogado trabalhista; Viação e Obras Públicas, Clóvis Pestana (PSD); Minas e Energia, João Agripino Vasconcelos Maia (UDN); Indústria e Comércio, Artur da Silveira Bernardes Filho (PR); Guerra, Marechal Odilio Denys; Marinha, almirante Sílvio Heck; Aeronáutica, Brigadeiro Grum Moss; Chefe da Casa Civil, Francisco de Paula Quintanilha Ribeiro; Chefe da Casa Militar, general Pedro Geraldo de Almeida; Secretário Particular, José Aparecido de Oliveira.

Nem bem a lista foi divulgada e logo começaram os comentários desfavoráveis, mesmo pelos setores que apoiavam o governo. Mas as críticas mais contundentes, como era de se esperar, vieram da oposição. O deputado trabalhista Wilson Vargas subiu à tribuna da Câmara para fazer a análise dos nomes, descartando-os um a um. De Clemente Mariani, insinuou que seu nome foi imposto por Carlos Lacerda. O Ministro da Agricultura era um usineiro do nordeste, e assim por diante.

Os dirigentes do PSD tinham as assinaturas necessárias para a formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para examinar as acusações do Governador da Guanabara – Carlos Lacerda – contra Jânio Quadros, convocando-o e chamando Oscar Pedroso Horta para prestar esclarecimentos. As linhas estavam traçadas entre Jânio e o PSD e Lacerda como um personagem poderoso.

O Presidente da comissão seria José Maria Alckimin, que chefiou a comissão interna do PSD, criada por Paulo Pinheiro Chagas, para "examinar" o impeachment de Jânio Quadros na medida em que Executivo e Legislativo estavam insuportáveis. Jânio Quadros não tomou a iniciativa de renunciar e sim o Congresso com o impeachment.

Jânio Quadros percebendo a realidade dos fatos, antecipou ao Parlamento, surpreendendo a todos com sua renuncia a permitir que seu Ministro da Justiça fosse levado a sentar-se no banco de réu para ser humilhado ou atingido na sua autoridade.

Jânio fora à presidência por uma explosão eleitoral, que submergiu a coligação política de cúpula feita pelo PSD e PTB. A união do eleitorado se dera quanto ao nome do presidente, mas quanto aos partidos continuavam divididas as correntes políticas. Por isso Jânio ficara fraco dentro do legislativo o que foi fator de insucesso do seu governo.

Atendendo a interesses políticos, os partidos PSD e PTB uniram-se para tornar definitiva tal renúncia. A renúncia de Jânio era como a oportunidade mitológica: cumpria aos dois partidos majoritários agarrá-la pelos cabelos, antes que escapasse.

Moura Andrade, pessedista e antijanista, tinha opinião oposta. Apressou-se em declarar aceita a renúncia. As forças reunidas do PSD e PTB queriam ver Jânio pelas costas, tanto que o portador do telex foi detido no congresso, como se estivesse portando documento subversivo. Mas, após afastarem o presidente, os dois partidos entraram em atmosfera de desconfiança, divergência e daí surge um novo movimento de aproximação desta vez entre o PSD e a UDN em torno da solução parlamentarista.

As eleições presidenciais de 1960 – Nas eleições de 1960 concorreram Jânio da Silva Quadros, apoiado pela UDN, e Henrique Lott, através da coligação PTB, PSD e PSB. A emergência de Jânio Quadros e o amplo apoio popular com que contou ofereceram aos setores da oposição, agrupados na UDN, a mais excelente perspectiva para quebrar a hegemonia PSD-PTB, herdeira do getulismo. A vitória janista foi verdadeiramente impressionante, com uma diferença de mais de 1 milhão de votos (5 636 623 contra 3 846 825).

O marechal Lott já estava com sua campanha na rua, lançada pela Frente Parlamentar Nacionalista, com apoio declarado de Jango e de Brizola. Havia também o Movimento Militar Constitucionalista, que estivera por trás da entrega da espada de ouro, durante um agitado comício em que o marechal fizera seu début num palanque.

O PTB saiu na frente, levando como caudatários o PSD e o Partido Comunista Brasileiro, cujo líder, Luís Carlos Prestes, não se cansava de enaltecer as qualidades nacionalistas do candidato, no apoio às teses do Petróleo é nosso e na oposição ao FMI.

Para rechear ainda mais o leque partidário, o marechal recebeu posteriormente a adesão de outras siglas: o PSB (socialista), o PRP (integralista) e o PST.

A televisão e o rádio já eram então dois poderosos veículos de comunicação que começavam a substituir os grandes comícios. Mas a presença pessoal dos candidatos ainda rendia votos e era muito exigida pelos correligionários.

Os líderes do astuto PSD só faltavam morrer de raiva e de desgosto. Parece até que o marechal fazia de propósito para mostrar independência: "Era impossível escolher um candidato que cometesse mais gafes do que ele".

No dia 23 de setembro, realizou-se um comício em São João Del Rey, terra natal de Tancredo Neves. Talvez, por isto, a afluência dos correligionários ao palanque foi tão grande que, a certa altura, os promotores da manifestação recearam pela segurança do coreto.

Quando o marechal chegou, a comitiva acrescentou alguns quilos no palanque, que não resistiu e desabou.

Foi um corre-corre pois, receava-se de um atentado contra o candidato, ato de sabotagem. O resultado foi: muitos feridos e o próprio marechal fraturou a perna.

Enquanto isto, do outro lado do campo, o candidato Jânio Quadros se esbaldava com a vassoura em punho, ameaçando punir os corruptos e os negocistas, cruzando o País em todas as direções, a bordo de um DC-3.

Em relação ao seu adversário, o militar digno, honrado e sincero, Jânio ainda se dava ao luxo de fazer ironias, quando, por exemplo, ao ser perguntado por que ainda não visitara a cidade paranaense de Campo Mourão, respondeu com sarcasmo: "Porque já mandei o marechal no meu lugar. E basta".

Em 1954, ano do suicídio de Vargas, a ascensão de Jânio continuou, com a sua eleição para Governador de São Paulo, derrotando a máquina eleitoral formada pelos partidos do centro, PSD e UDN, que apoiavam a candidatura Prestes Maia, além do populismo, trabalhismo e comunismo, que se aliaram em torno da candidatura Adhemar de Barros. Jânio capitalizara os descontentes, em todas as áreas, num salto da prefeitura de São Paulo ao palácio dos Campos Elíseos.

Na campanha presidencial em 1955, os partidos não se apresentaram coesos. O PSD tinha três dissidências importantes (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Pernambuco). O PTB perdia substância em São Paulo, com o proletariado dividido e a massa urbana perplexa ante o apelo de Jânio Quadros em favor de Juarez Távora, a candidatura de Adhemar de Barros e a chapa pessedista-trabalhista, logo conhecida como "dobradinha" J.J. (Juscelino e Jango), afinal vitoriosa.

A aliança PSD-PTB não assegurará uma base parlamentar suficientemente forte para que o governo leve a termo a reforma institucional que dê ao Presidente da república o comando da maioria parlamentar.

A dissolução partidária refletir-se-ia no parlamento, cindindo os 2 blocos que apoiavam o governo – PSD sob o comando de Vieira de Melo, e o PTB, liderado por Fernando Ferrari, jovem político do Rio Grande do Sul, em constante atrito com João Goulart e Leonel Brizola, que disputavam a mesma área eleitoral. Ferrari chefiou uma dissidência no PTB gaúcho e criou o Movimento Trabalhista Renovador (MTR). Pouco antes, com a "campanha das mãos limpas", conquistara o primeiro lugar entre os Deputados federais eleitos pelo seu estado.

O pleito de 1958 foi de grande importância para a decisão final do eleitorado de 1960, já que se caracterizou como uma prova eliminatória para a sucessão presidencial, com eleições para Governadores e vice-Governadores em dez Estados.

Fernando Ferrari lança sua candidatura à vice-Presidência da República, com um programa de governo próprio e definido, acenando para a redenção das massas rurais que vinham sendo esmagadas pelo desenvolvimento econômico, cujos efeitos repercutiam sobretudo, em São Paulo, base da ação política de Jânio Quadros. A Ferrari interessava a "dobradinha" com Jânio.

Em 1965, foi extinto pelo regime militar. Passada a ditadura, nos anos 80, a sigla foi reativada por Luiz Pacces e Nabi Abi Chedid. Após uma derrota nas urnas, Chedid decidiu, em 2003, incorporar o partido ao PTB e chegou a presidir o diretório paulista dos trabalhistas.

O PTB assumiu então dívidas e pendências do PSD de Chedid e adaptou o estatuto para incluir princípios da social-democracia. Aí reside a discórdia. Na visão dos líderes do PTB, o nome e a sigla PSD passaram a pertencer aos trabalhistas e não podem ser usadas por Gilberto Kassab para fundação de um terceiro PSD. “Não se pode refundar o que não está extinto”, afirma o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson. “A coisa é tão incipiente, tão oba-oba, que eles pegam qualquer sigla e querem fundar um partido.”

Segundo o advogado do PTB, Itapuã Prestes de Messias, os trabalhistas são, até os dias atuais, responsáveis por prestações de contas do PSD. “O PSD está sob a guarda do PTB”, diz. “Escolher o PSD como nome deste novo partido é uma perda de tempo. Eles colherão assinaturas e depois serão questionados na justiça sobre a escolha do nome. Haverá um vício na criação da legenda.”

Os advogados comparam a incorporação do antigo PSD ao PTB com a incorporação de duas empresas, com base no direito societário. “Foram incorporados ativo e passivo. Ou seja, o nome, as bandeiras, a história, assim como as dívidas e as prestações de contas do PSD”, explica Luiz Gustavo Pereira da Cunha, que também advoga para o PTB. “Se o PSD tivesse sido extinto, não haveria problema em ressuscitá-lo, mas o partido, ativo, foi incorporado a outro partido. Logo, todo o patrimônio do PSD pertence ao PTB.”

A legenda de Gilberto Kassab enfrenta ataques desde antes de ser oficialmente anunciada. Com o nome provisório de Partido Democrático Brasileiro, foi apelidado de “Partido da Boquinha” por parlamentares do DEM, ex-partido do prefeito. A sigla PSD foi escolhida para fugir do desabonador acróstico e aproximar a legenda, ao menos no nome, do PSB.

A ameaça de perder quadros para o partido de Kassab irritou lideranças partidárias pelo país. Mesmo assim, o presidente nacional do PTB jura não agir em represália ao prefeito. “É uma questão meramente jurídica”.

A ideia de pedir a impugnação partiu do presidente do PTB paulista, deputado estadual Campos Machado. “Tenho a obrigação moral de manter a sigla do PSD com o PTB”, afirma o deputado. “Quando esse imaginário PSD protocolar seu pedido de registro, vamos impugnar. É uma apropriação indébita.”

Segundo advogados que trabalharam na fundamentação jurídica do PSD de Kassab, o nome aparecia como disponível na Justiça Eleitoral e, por isso, não havia necessidade de pedir autorização do PTB para usá-lo. Na visão dos advogados do prefeito, no momento da incorporação ao PTB, o PSD de Chedid deixou de existir.

O PSD não aparece na lista de partidos com registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso significa, em tese, que é possível pedir o registro de uma legenda com o nome. Porém, o desfecho do imbróglio é um mistério.

Coletar quase meio milhão de assinaturas em nove estados não será o maior desafio de Gilberto Kassab no caminho para a criação do Partido Social Democrático (PSD).

Acaba de surgir no horizonte a ameaça de uma batalha judicial com o PTB pelo nome da nova legenda. E os trabalhistas reuniram munição: destacaram dois advogados para redigir um pedido de impugnação do PSD. Tão logo Kassab dê entrada no registro da sigla (depois da coleta de assinaturas, prevista para terminar em julho), o PTB acionará a Justiça Eleitoral para impedir o registro.

Uma certeza ao menos há: o PTB já conseguiu embaralhar ainda mais os planos de Gilberto Kassab.

(*) Nelson Valente é professor universitário, jornalista e escritor.

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