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Reportagens Especiais

Mistério, astúcia de bandidos e crimes sem solução assombram a cidade

Luana Rodrigues | 24/08/2015 08:00
Maioria dos casos nem chegam à Justiça. (Foto: João Garrigó - arquivo)
Maioria dos casos nem chegam à Justiça. (Foto: João Garrigó - arquivo)

Não é a imperícia de investigadores, nem a lentidão da Justiça, mas a astúcia dos criminosos, apontada como o principal motivo pela dificuldade de identificação e punição dos responsáveis por homicídios no Brasil. Não há números exatos, mas em todo o País, famílias de vítimas da criminalidade aguardam há anos pelo desfecho de casos que, muitas vezes, acabam no esquecimento e prescrevem. Em Campo Grande, alguns marcaram a história ao longo de 116 anos, vamos abordar quatro mais recentes.

Escaramuça - No dia 29 de outubro de 1997, o radialista e apresentador de TV, Edgar Lopes de Faria, o “Escaramuça”, foi assassinado com cinco tiros quando chegava a uma padaria, na rua Amazonas, bairro São Francisco. O caso passou a ser investigado pela DEH (Delegacia Especializada em Repressão a Homicídios) e de lá para cá, oito delegados assumiram o inquérito policial.

Em 18 anos, muitas suspeitas pairaram sobre o crime, entre elas o fato de a vítima ter feito graves denúncias de “esquemas”, por meio de reportagens investigativas. “Acredito que não há interesse por parte da Polícia em desvendar este crime e outros de pistolagem que vem ocorrendo no Estado. Para mim, não tem outra linha de investigação que não seja as denúncias que ele fazia, tanto na televisão quanto na rádio. E com o tempo tudo isso vem sendo esquecido, mas para a família não, que até hoje permanece intrigada com o crime”, afirmou o filho da vítima, o radialista Marcos Antônio Lopes de Faria, 46 anos, em entrevista ao Campo Grande News, em 2013.

Em dois anos, o caso irá prescrever, já que de acordo com o Código Penal Brasileiro, a prescrição ocorre 20 anos após o crime.

Caso Motel - Em 21 de junho de 2005, ocorreu o caso que deu origem a uma das investigações mais rumorosas já feitas no Estado. Murilo Boarin Alcalde e Eliane Ortiz, ambos de 21 anos, foram encontrados mortos no quarto de um motel, no jardim Paulista. A mulher estava em cima da cama com uma meia no pescoço, enquanto o rapaz foi encontrado no chão sem marcas de violência, os dois sem roupa.

As investigações foram concentradas no Gaeco (Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado). Na peça de acusação, foram responsabilizados pelo crime os policiais militares Getúlio Morelli e Adriano Araújo Melo, o traficante do Mato Grosso Irio Vilmar Rodrigues e Ronaldo Vilas Boa Ferreira, que inicialmente era apontado como matador de aluguel.

Pela versão para o crime apresentada pelo MPE, os assassinatos tiveram relação com o tráfico de drogas. Murilo teria sido confundido com um informante da polícia e Eliane teria sido morta por tentar abandonar a vida de crimes e ameaçar denunciar traficantes, para quem teria trabalhado.

Em 2010, ao inocentar os acusados, a Justiça afirmou que essa versão se revelou fantasiosa e, ao invés de esclarecer o crime, dificultou ainda mais o trabalho policial. O relator do caso, desembargador Carlos Eduardo Contar, definiu a peça acusatória como "enormidade de inconsistências, provas precárias e insuficientes". Os desembargadores também afirmaram que toda a investigação se materializou em provas frágeis. Dez anos depois, o caso está "engavetado".

Eduardo Carvalho era ex-PM foi morto em frente de casa, na rua Cláudia, bairro Giocondo Orsi (Foto: Nyelder Rodrigues)
Eduardo Carvalho era ex-PM foi morto em frente de casa, na rua Cláudia, bairro Giocondo Orsi (Foto: Nyelder Rodrigues)

Jornalista - Na quarta-feira, em 21 de novembro de 2012, o jornalista Eduardo Carvalho, 52 anos, proprietário do site "Última Hora News" foi executado na rua Cláudia, no bairro Giocondo Orsi. Carvalho, um policial militar aposentado, que também exercia o cargo de editor-chefe da publicação online, foi baleado por dois homens armados com pistolas, que estavam em uma moto e o esperavam em frente a sua casa. O comunicador, chegava em casa com a mulher, e estava manobrando a moto enquanto a mulher guardava o carro na garagem, quando foi atingido por cinco tiros.

Na época, a polícia suspeitou de pistolagem, mas o mandante não foi apontado, já que havia uma extensa lista de pessoas denunciadas pelo jornal eletrônico comandado pela vítima. O empresário, que já havia sofrido um atentado, dirigia o jornal digital que se caracterizou por publicar fortes denúncias contra diversos políticos e policiais, conhecidos como "do colarinho branco", no Mato Grosso do Sul. As informações publicadas pelo portal "UH News", em geral, eram baseadas em revelações de fontes de instituições que preferiam não se identificar.

Paulo Magalhães foi executado dentro do carro, na rua Alagoas(Foto: Marcos Ermínio)
Paulo Magalhães foi executado dentro do carro, na rua Alagoas(Foto: Marcos Ermínio)

Delegado - Em 2013, 25 de junho, o advogado e delegado aposentado Paulo Magalhães de Araújo, 57 anos, foi executado a tiros na rua Alagoas, bairro Jardim dos Estados. Paulo aguardava na fila para buscar a filha na escola, a duas quadras da sua casa. Chovia e ele estava dentro do seu carro, quando o bandido chegou a porta e atirou ao menos seis vezes. Meses após o fato, dois culpados foram denunciados. No entanto, os “mandantes” continuam impunes.

"Esta foi e é uma investigação complexa. O crime ocorreu praticamente no centro de Campo Grande, na porta de uma escola e que teve como vítima um professor, ex-delegado, advogado e pai de família, por isso tamanha repercussão social. Para nós, no entanto, a investigação de um homicídio é sempre a mesma, envolvendo certo risco", afirmou na época o delegado Alberto Vieira Rossi, um dos responsáveis pela investigação.

Polícia - Com 30 anos de trabalho na polícia, o delegado da Polícia Civil, Sidnei Alberto, afirma que a polícia não pode ser responsabilizada ou acusada de incompetencia pela falta de solução de alguns casos, principalmente se tratando de homicídios. "É um crime diferente de todos os outros crimes, principalmente, quando envolve suspeita de pistolagem. A verdade é que depois de 48 horas, qualquer crime se torna muito dificil de solucionar, mas homicídios são muito pontuais dependendo da quantidade de desafetos das vítimas", explica.

Conforme o delegado, o fato é que a polícia não descarta nenhuma possibilidade, e se a vítima tinha muitos desafetos, as informações devem se cruzar de maneira muito precisa até que alguém seja acusado como autor. "O desafeto nem sempre é o autor, pode ser o mandante que tem o alibe perfeito. E se o autor não confessa nem que praticou o crime também não entrega quem mandou executar", diz.

Justiça - O juiz de Direito da 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, Aluízio Pereira dos Santos, também não considera a falta de punição dos autores de alguns crimes uma deficiência do estado. "Muitas vezes a polícia investiga, ouve testemunhas e acaba delatando os autores, mas as provas não são suficientes porque a estratégia adotada para o crime não deixa indícios", explica.

O magistrado afirma que a tecnologia tem ajudado nesses casos. Câmeras de segurança, imagens de celulares enviadas por meio de denúncias anônimas, e até as denúncias em si colaboram com a polícia. "Temos hoje um aparato testemunhal diferenciado, isso ajuda e mesmo que não mostrem o autor e mandante, faz com que os indícios os apontem, o que colabora no momento do julgamento", finalizou.

De outro mundo - No anos 80, mensagens do "além" psicografadas por Chico Xavier, ajudaram a solucionar um crime e, quem sabe, evitar uma injustiça. A carta absolveu João Francisco Marcondes de Deus, acusado de matar a tiros a mulher, Gleide Maria Dutra, ex-miss Campo Grande, no dia 1º de março de 1980.

Sem testemunhas, o rapaz respondia por homicídio doloso e poderia pegar até 30 anos de reclusão. Mas a suposta comunicação entre vivos e mortos deu liberdade ao réu, pois o medium teria recebido o espírito de Gleide e contado que tudo não passou de um acidente. João de Deus foi absolvido. Em novo júri, chegou a ser condenado, mas a pena já estava prescrita.

Seria o surgimento de uma "prova milagre" a única chance de consolo das famílias de vítimas de "assassinos não identificados/ impunes"?

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