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Anônimos levam reabilitação até para quem não se acha neurótico

Luciana Brazil | 30/10/2013 15:32
Depois de encontrar o pai morto, Neuróticos Anônimos foi uma escolha para Bya.(Foto:Luciana Brazil)
Depois de encontrar o pai morto, Neuróticos Anônimos foi uma escolha para Bya.(Foto:Luciana Brazil)

No primeiro instante o assunto parece ser insignificante ou até mesmo engraçado. Porém, aos poucos a seriedade surge aos olhos. O grupo dos Neuróticos Anônimos (NA), uma irmandade onde homens e mulheres compartilham experiências e problemas emocionais, tem apenas um objetivo: reabilitar.

Segundo a literatura médica, 95% da população mundial são neuróticos. Além do estresse, insatisfação, solidão, ansiedade e pânico são alguns dos sintomas que caracterizam de forma ampla o indivíduo com neurose.

Respeitando o anonimato, uma das integrantes do grupo “Renovação Neuróticos Anônimos”, que se existe em Campo Grande há 30 anos, chegou às reuniões “carregando” um cadáver nas costas. Bya, 40 anos, relembrou o episódio triste que a levou a procurar ajuda.

Há três anos, depois de brigar com o pai que sofria do coração, Bya ficou quatro dias sem visitá-lo. “Eu dizia que ele tinha que fazer tudo diferente, do meu jeito, e disse que só voltaria na casa dele quando ele me chamasse. Quatro dias depois ele ainda não tinha me ligado. Resolvi procurar ele”.

Chegando à casa do pai, Bya percebeu o tempo que perdeu exigindo das pessoas que elas fossem como ela queria.

“Ele não atendeu a porta. Chamei a polícia, eles arrombaram a porta. E meu pai estava morto, deitado na cama”, relembrou.

“Naquele momento (morte do pai) me senti impotente diante das minhas emoções. Não podia voltar atrás. Ali, a linha tênue, entre ficar nervosa de maneira normal, de brigar com alguém por coisas cotidianas, e ser uma neurótica, foi rompida. Fiquei muito tempo com um grande complexo de culpa”.

O primeiro passo, segundo ela, foi reconhecer o problema e procurar ajuda. Há um ano, diferente da maioria, Bya procurou sozinha o grupo.

“Eu sei que fui uma exceção. A maioria que vem para o NA diz que é para ajudar a mãe, traz um parente, diz que é a mãe que precisa de ajuda. Quase sempre as pessoas fogem”.

Mas aos poucos os depoimentos, as experiências começam proporcionar o reconhecimento da neurose e o caminho para a recuperação. A proposta não é diagnosticar, analisar ou doutrinar os membros, mas levá-los ao autoconhecimento.

Grande parte dos integrantes do programa não identifica os sintomas, sejam eles mais ou menos evidentes, logo no começo. O reconhecimento vem com o tempo, onde as pessoas geralmente percebem o descontrole a que estão enraizadas.

Conforme Bya, o período em que a pessoa não se reconhece com os depoimentos, é chamado de arrogância neurótica. “Isso acontece muitas vezes por causa do que nós chamamos de arrogância neurótica. Tem gente que no começa acha que não tem nada a ver com o que as pessoas estão falando, mas depois isso cai por terra”.

“Estou em tratamento, mas já sou outra pessoa”, afirma feliz.

Doença X NA: Considerada uma doença grave, a neurose também é progressiva, mas tem cura. “A chave da cura é o autoconhecimento. É uma doença que pode levar à morte, suicídio ou até mesmo a matar alguém”, ressalta Bya.

Outro detalhe apontado pelos membros do NA, é receptividade do grupo diante dos problemas de cada um dos membros. “É diferente falar da nossa vida para uma pessoa que você encontra na rua e que não está se importando muito, do que falar para aqueles que se identificam com você e que chegam para você e dizem: olha, você está sentindo isso que está na literatura, eu também sinto. É muito bom”.

O preconceito com a irmandade ainda existe. O medo de ser chamado de louco, ou taxado como descontrolado e agressivo afasta muita gente das reuniões semanais do NA.

Porém, o programa é destinado às pessoas que estão mentalmente e emocionalmente aflitas. Ainda de acordo com a literatura estudada pelos membros, o grupo Neuróticos Anônimos foi criado para “qualquer pessoa cujas emoções interfiram em seu comportamento de qualquer forma e em qualquer grau”.

O NA também é definido como um programa espiritual, porém sem caráter religioso, e, além disso, é gratuito. No grupo, não são investidas autoridades, profissionais ou orientadores. “Ninguém vem pela profissão. Se vier algum terapeuta, ele vem como membro”, ressalta Bya.

O anonimato pessoal é preservado entre os membros da irmandade. “Isso é amplamente resguardado por todos. Aqui contamos coisas pessoais. Ninguém pode sair daqui e expor os outros membros”.

O NA foi criado em 1964, em Washington, pelo psicólogo e alcoólatra recuperado Grover Boydston. Por causa da bebida, ele se tratava com AA (Alcoólicos Anônimos) e resolveu utilizar a mesma metodologia para curar suas neuroses. Em Campo Grande, a irmandade chegou em 1973 e já são cinco grupos na Capital.

Renovação: O grupo Renovação, que se encontra na Igreja Católica Cristo Luz dos Povos, completa no dia 23 de novembro 33 anos de história. Para comemorar a data, um encontro com o tema Depressão e Ansiedade, será realizado por um membro do NA de Goiânia.

O encontro será das 8 às 11h30 e das 13h30 às 17h30, no salão da paróquia, na Avenida Bandeirantes, n° 2306, na Vila Bandeirantes. Mais informações pelo telefone 9221-0276 / 9276-8167.

O grupo se reúne todas às terças e sextas-feiras às 19 horas. Na quarta-feira, o grupo estuda a literatura médica da doença.

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