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Cidades

Empresário construiu um império, mas o 1º sonho foi a casa própria

Luciana Brazil | 15/02/2014 11:01
Aos 89 anos, empresário Ueze Zahran narra uma história de sucesso (Foto: Marcopolis.net)
Aos 89 anos, empresário Ueze Zahran narra uma história de sucesso (Foto: Marcopolis.net)

A voz é carregada de lembranças, algumas que talvez ele até prefira esquecer. A história de determinação que levou o empresário Ueze Zahran, 89 anos, ao topo é narrada por ele mesmo, pausadamente, com detalhes de uma vida que começou em Mato Grosso do Sul, mas hoje é reconhecida mundialmente.

A trajetória, que muitos conhecem com minúcia, dispensa adjetivos como sucesso e vitória, e expõem a força de um jovem que não se viu derrotado e venceu as adversidades com muita personalidade e humildade, qualidades que parece carregar até hoje.

Registrar aqui uma pequena parte da conversa que tive com Zahran é trabalho de responsabilidade. Na entrevista feita por telefone, já que a agenda do empresário é lotada, Ueze falou de sua vida, das histórias e de como conquistou todas elas.

Aos 13 anos, ainda um menino, Zahran decidiu realizar o sonho da mãe; ter uma casa. “Nós morávamos de favor”, conta.

Na época, a família tinha um restaurante e do caixa Ueze tirava todo mês uma quantia que guardava em segurança, no estabelecimento de um amigo barbeiro.

Sem que ninguém soubesse, o “pequeno empresário” juntou em pouco tempo grande parte do dinheiro para comprar a casa.

“Durante seis ou oito meses juntei metade do valor da casa sem que meu pai soubesse. Via minha mãe chorando porque queria uma casa e não tinha”, relembra.

A compra não deu certo, não por esforço, mas por motivos familiares que não valem a pena ser lembrados.

Antes de continuar, não posso deixar passar em branco o que, mesmo por telefone, ficou bastante evidente. Era só falar da mãe, o carinho se externava. Na voz era possível sentir a afeição que Zahran carrega por ela.

Voltando a vida do empresário, a luta pela casa já demonstrava que a determinação começava desde cedo a traçar os rumos de Zahran. Depois do restaurante, que não deu certo, a família alugou uma padaria. Ainda bem jovem, Ueze ficou responsável por fazer o pão.

Um acidente de trabalho fez nascer o grupo Zahran, como ele mesmo diz. “Perdi o dedo (indicador da mão esquerda) em um cilindro, em uma engrenagem da máquina. Era uma máquina perigosa e eu não deixava nenhum funcionário da padaria trabalhar, eu preferia correr esse risco”.

Machucado, ele ficou sem trabalhar por 30 dias. “E foi assim que começou o grupo Zahran”, descreve.

Afastado da padaria, Ueze queria trabalhar e ajudar a família. “Foi quando decidi ir para São Paulo. Lá, enfrentei um fila de 300 prefeitos para comprar farinha. Mas só os prefeitos conseguiam comprar as sacas de farinha”, lembrou.

Mesmo assim, incitado pela determinação e munido do ofício que já havia conseguido para ter a farinha, Ueze não desistiu.

“Me perguntaram o que eu estava fazendo naquela fila, já que eu não ia conseguir nada. Quando chegou a minha hora, me disseram que era apenas para prefeitos. Peguei uma cadeira, sentei do lado da fila e esperei por duas horas”.

Quando não havia mais ninguém, Zahran pegou o ofício e insistiu. O que parecia improvável aconteceu.

“Chamaram o secretario e ele me perguntou qual era a população da cidade. Na época, era 30 mil. E eles acabaram me vendendo a farinha. Na primeira vez comprei 200 sacos e paguei 12 mil réis. E a cada nova ida para lá, eles me vendiam mais”.

Revendendo o produto na Capital, Ueze começou a lucrar. “Vendi a padaria e comecei a exportar café”, relata.

A trajetória longa e abundante em detalhes passou da farinha para o café e do café para o gás. Com os lucros do café, Zahran almejou novas oportunidades. “Comprei quatro botijões a gás para minha mãe”, diz novamente com carinho. “Minha mãe ficou muito feliz em ver a chama embaixo da panela”, lembra.

O empresário percebeu que o gás poderia lhe render um negócio futuro. Começou como representante, mas não se viu satisfeito. “Não vou ser só representante, quero ser distribuidor”. E ele conseguiu.

Entre seus feitos, Zahran encontrava sempre uma maneira de transitar entre homens de “poder”, como no governo federal. Desde o início, ele procurou pessoas certas para alcançar seus objetivos.

"Quando entrei nesse setor (gás), percebi algumas aberrações. Por determinação da Agência Nacional do Petróleo apenas as multinacionais podiam atuar no Brasil. As empresas nacionais só podiam atender algumas regiões e, claro, sofriam a concorrência dos estrangeiros”.

Na tentativa de intervir pelo setor e derrubar a deliberação, Zahran procurou o vice-presidente da República à época, Aureliano Chaves. A empreitada deu certo e as empresas nacionais passaram a atuar em todo país.

Logo que criou a Copagaz, em 1955, recebeu a concessão para trabalhar em São Paulo e Mato Grosso, e com o tempo expandiu a atuação.

Entre os negócios, a Jovem Guarda, movimento musical brasileiro que explodiu em 1960, era um alento para a labor do empresário. “A Jovem Guarda era um descanso. Gostava tanto que quando vinha o cansaço, eu assistia e ficava melhor”, relembra.

Dez anos depois, do gás Zahran se arriscou na televisão e mais uma vez deu certo. Hoje, já são sete retransmissoras da TV Globo.

Filho de libaneses, Ueze comanda o grupo Zahran com mãos de ferro. Os pais vieram casados para o Brasil nos anos 20 e foram morar em Bela Vista, a 322 quilômetros de Campo Grande. O empresário é o segundo filho entre seis irmãos.

Assumidamente workaholic, seu foco tem sido a instalação de uma separadoras de gás no Estado. O investimento previsto no projeto é de R$ 1 bilhão.

Ueze parece gostar de um bom "papo". Quando pergunto sobre Campo Grande ele demonstra carinho pela Cidade Morena.

Ao falar de inspirações, o primeiro nome que surge é do ex-governador do Estado, Wilson Barbosa Martins. "Ele foi meu professor. Me inspirou. Quando eu me via desamparado me inspirava nele".

Mas ele não se faz de rogado e admite que também é inspiração para muita gente. E não teria como ser diferente. "Uma mulher me parou semana passada no avião. Me pediu licença e perguntou se podia tirar uma foto comigo. Eu disse:'claro'. Ela me disse que me admirava pela minha história e que eu a inspirava. Ela até me convidou para conhecer sua loja de roupas em Campo Grande".

Ao fim da conversa, ele ainda fala de novos projetos. A determinação parece estar constantemente impulsionando Zahran. Criador de cavalos árabes, ele construiu um império e não pensa em se afastar dele. Sobre trabalhos sociais desenvolvidos pelo Grupo Zahran ele diz: "Sou um minúsculo grão de areia",

Em em entrevista a um jornal de circulação nacional Ueze afirmou: "Eu não tenho tempo para morrer agora". E assim ele segue.

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