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Cidades

Estudante campo-grandense é ferido durante ocupação do Pinheirinho

Paula Vitorino | 23/01/2012 13:19

Estudante levou um tiro de bala de borracha quando tentava registrar a ocupação da favela Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). O estudante diz que entrou no campo de batalha com o objetivo de mostrar a realidade dos moradores

Policiais fecharam área do Pinheirinho. (Foto: Hiure Queiroz)
Policiais fecharam área do Pinheirinho. (Foto: Hiure Queiroz)

De Campo Grande para São José dos Campos (SP), o estudante Hiure Queiroz, de 25 anos, foi parar no meio do campo de batalha da favela Pinheirinho, onde a Polícia Militar paulista realiza a retirada de cerca de 6 mil pessoas desde ontem, e se tornou mais uma vítima da ação.

Ele foi atingindo por uma bala de borracha no braço quando tentava registrar a ação da Polícia. “Depois que o conflito começou, você via gente ferida, caído, e tiro para todos os lados. Um cenário de guerra”, resume Hiure.

O estudante conta que chegou na região do Pinheirinho por volta das 10h desse domingo (22), junto com um grupo de amigos que tinha o objetivo de mostrar o outro lado da desocupação: os moradores.

A Polícia Militar ocupou a área no início da manhã de ontem e isolou o local. Com máquinas fotográficas em mãos, Hiure e uma amiga tentavam registrar a ocupação e passar pela barreira policial.

Hiure diz que estava a cerca de 5 metros de um grupo de policiais quando foi atingido e afirma que a agressão aconteceu sem motivo aparente. “Eles não queriam ninguém ali e ainda mais alguém com uma máquina fotográfica na mão”, diz.

A amiga do jovem filmou o momento em que acontece a confusão e Hiure aparece em outro vídeo logo depois de ser atingido, mostrando o ferimento no braço e revoltado com a situação.

“Fui perguntar o que eu tinha feito pra levar o tiro, mas o policial não falou nada e apontou a arma de novo, me ameaçando”, conta.

Lembrando dos minutos de terror, ele diz que só depois de alguns instantes é que realmente se deu conta de que estava ferido e “bateu” o medo.

“O medo é algo que vem só depois, quando você para pensar. Quando vi ele apontando de novo a arma e senti meu braço, aí bateu o risco que estava correndo, resolvi me acalmar e fui para junto do grupo de colegas”, diz.

Os amigos improvisaram um curativo no braço de Hiure, feito na casa da tia de uma amiga próxima a área, e logo depois o grupo voltou para o Pinheirinho. Os estudantes acompanharam a ocupação do lado de fora no início da tarde e voltaram à noite para acompanhar os abrigos para onde as famílias da favela estão sendo levadas.

Voz dos excluídos - Mesmo diante de tantos riscos previsíveis, Hiure conta que o sentimento que o motivava a enfrentar o campo de batalha era um só: mostrar a realidade das pessoas de bem que estavam sendo retiradas da favela.

“Eu conheço o local e muitas daquelas famílias e crianças, que pessoas do bem. A gente já estava lá e se nós não retratássemos aquilo, pessoas sendo agredidas e despejadas, ninguém mais ia fazer, só ia ficar a visão da mídia geral”, conta.

Desde que mudou para São José dos Campos ele e os amigos criaram uma espécie de rede de mídia alternativa, mostrando a realidade da cidade "sem nenhum partido por trás" e distribuindo as imagens e informações para sites.

De acordo com informações da Folha de São Paulo, a área do Pinheirinho foi invadida há cerca de 8 anos e é alvo de uma disputa entre os invasores e a massa falida da empresa proprietária do terreno. A área tem cerca de 1,3 milhão de metros quadrados.

Hiure e os amigos estão percorrendo os abrigos para mostrar a realidade das famílias e conta que o cenário é de total tristeza, com pessoas acomodadas de forma em locais sem estrutura e espaço.

As informações preliminares são de pessoas feridas, presas e até mortos, mas o estudante diz que ainda encontrou muitas mães que perderam os filhos em meio a confusão.

“Eu não sei como e onde vão colocar tantas pessoas, não tem lugar, não tem estrutura. A gente está tentando montar uma rede de informações pra ajudar essas famílias a encontrar as pessoas que estão desaparecidas”, diz.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região suspendeu na sexta-feira (20) a ordem de reintegração de posse da invasão Pinheirinho. A decisão também devolveu o caso para a Justiça Federal. No domingo, o presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Ari Pargendler, decidiu que a competência de decisão sobre a permissão de reintegração de posse era da Justiça estadual, o que valida a decisão de retirar os moradores da favela do Pinheirinho.

O estudante questiona o fato de quererem resolver uma situação que vem se empurrando há 8 anos em menos de 2 meses. “O que a gente viu foi a Polícia entrando, tirando as famílias, e a total desordem”, diz.

Ele também ressalta que boa parte dos conflitos com os policiais partiram de traficantes que moram no Pinheirinho e nas áreas vizinhas, e que não querem sair do local. Mas faz questão de lembrar que a maioria dos moradores foi para o local por não ter para onde ir e criou suas famílias ali.

“Gente desonesta existe em todo lugar, principalmente num local com mais de 6 mil pessoas, é claro. Mas não é possível que acreditem que aquelas crianças e todas as famílias também são bandidos”, chama a atenção.

Contraste - O estudante diz que ainda não conversou com a família, que mora em Campo Grande, sobre a agressão, que apenas acompanha algumas informações pelo Facebook do rapaz.

Ele diz que o que está vivendo na área não se compara a nada que já tenha sentido, mas conta que lembrou de quando cursava Física na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), em 2008, e os estudantes ocuparam o prédio para pedir diversas reivindicações.

“Eu levei choque de guarda, foi complicada a situação, lembrei muito daqueles momentos. Mas também não se compara ao que está acontecendo aqui. Aquilo era coisa de universitário, outra realidade, e aqui é a vida das pessoas e só violência, não tem diálogo”, avalia.

O estudante também lembra que Campo Grande tem também áreas ocupadas, mas o problema habitacional de São José dos Campos é muito maior. “Aqui a área é muito vertical, mais difícil de resolver e tem muito conflito”, diz.

Ele está cursando doutorado em Física no ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e diz que, apesar de amar Campo Grande, ainda não sabe onde vai morar depois que terminar os estudos. “Tudo vai depender de onde conseguir emprego, um concurso”, diz.

Enquanto isso, Hiure afirma que vai continuar acompanhando o conflito em Pinheirinhos, já que a Polícia continua na área e as famílias estão sendo removidas.

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