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Arquitetura

A história da casa do ex-prefeito, que foi dividida ao meio na década de 20

Paula Maciulevicius | 01/12/2015 07:03
Dividida em duas desde o início, a história se perdeu em reformas que não preservaram sua estética. (Foto: Fernando Antunes)
Dividida em duas desde o início, a história se perdeu em reformas que não preservaram sua estética. (Foto: Fernando Antunes)

Do ano 1920, a casa com fachada ornamentada e relevos em estuque registrou na arquitetura a passagem do ecletismo em Campo Grande. O erguido naquela década, ficou só na memória da família que ali habitou. Dividida em duas desde o início, a história se perdeu em reformas que não preservaram sua estética. O imóvel foi moradia, do início da década de 20 de Eduardo Olímpio Machado, até sua despedida, em 1968. A casa foi sede do prefeito da cidade e também palco de seu velório.

Como "permuta", construída pelo engenheiro agrimensor Sotter França em 1920 e terminada em 1922, a casa foi "trocada" pela então residência de Eduardo Olímpio Machado, na esquina da Afonso Pena com a Rui Barbosa.

"O Sotter fez a proposta de permuta e depois ele disse para o meu pai que foi o melhor negócio da vida dele, porque ali na Afonso Pena tinha o quartel pertinho e ele conseguiu casar todas as filhas com oficiais do Exército", recorda Vera Machado Pereira, neta de Eduardo Olímpio Machado.

Eduardo Olímpio Machado, primeiro prefeito eleito pelo voto secreto em Campo Grande. (Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")
Eduardo Olímpio Machado, primeiro prefeito eleito pelo voto secreto em Campo Grande. (Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")

Aos 73 anos, dona Vera conta da casa como quem enxerga o avô da janela que se abria para fora, onde era o seu escritório. O pai, advogado e historiador Paulo Coelho Machado, nasceu em São Paulo, em 1917 e ela calcula que a família tenha se mudado entre 1924 e 1925.

"Eu nasci naquela casa, eu, minha irmã Vilma e meu irmão Eduardo, com parteira". A casa era cumprida e não tinha corredor. Nem de um lado e nem de outro, levando os cômodos a "darem" sempre um no outro.

"Na primeira casa, o escritório do meu avô era com as janelas dando na rua. E tinha uma sala muito chique, com papel de parede que veio da França e os móveis da minha avó. Ali também tinha um piano, tudo nessa sala de jantar", descreve Vera.

Da sala, se passava para a copa, onde ficavam os armários. "Lembro de tudo amarelado, em tons pastéis, e ali tinha um guarda-comida da minha avó, ficava no canto, fechadinho. Ela trancava e vivia com a chave dele na cintura", brinca.

O quarto da avó dava para essa copa, onde Vera se lembra de ter dormido fazendo companhia à dona Elvira.

(Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")
(Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")

Por fim, vinha a varanda com mais um quarto e um banheiro e um amplo pátio, sede do "reino de Vera". "Eu tinha uma casinha de brinquedo ali, era toda ladrilhada escrita: 'Reino de Vera Maria'". No quintal, mangueiras e jabuticabeiras faziam sombra.

O imóvel começava na 15 e ia até a rua de trás, 7 de Setembro, onde terminava na garagem.

Na segunda casa, ocupada por Paulo Coelho Machado e a esposa, Zilah Corrêa Machado, a distribuição de cômodos também começava pelo escritório, agora do pai de Vera. "Também com duas janelas que davam para a rua. Papai e meu avô eram advogados, atendim as pessoas ali", conta.

Depois vinha o quarto de dona Zilah e uma sala grande, com sofá e piano. "Estudei piano ali. Lembro que tinha só um banheiro para a casa toda e ficava lá na sala, longe do quarto", descreve o projeto.

Em seguida vinha um quarto pequeno, feito de roupeiro e a sala de jantar. "Do outro lado da sala tinha uma porta que dava acesso à casa da minha avó e uma cortina", lembra Vera.

Neta, dona Vera nasceu e cresceu na casa da 15 de Novembro. (Foto: Gerson Walber)
Neta, dona Vera nasceu e cresceu na casa da 15 de Novembro. (Foto: Gerson Walber)

Eduardo Olímpio Machado foi o primeiro prefeito eleito pelo voto secreto em Campo Grande, ocupando o cargo de 1937 a 1941. Nascido na Bahia, veio para o então Estado de Mato Grosso no início dos anos 1900, para ser juiz da comarca de Corumbá.

Tanto "Dr. Eduardo" como era conhecido e dona Elvira, foram velados ali. Ela morreu primeiro, e ele "velhinho", não soube. "A gente não contou nada. Ele ficava do outro lado da casa, ele já estava com mais de 90 anos, quando perguntava dela, dizíamos que estava em São Paulo e já ia chegar", lembra Vera. Três meses depois, a mesma sala de jantar velou o corpo do ex-prefeito, em setembro de 1968.

Primeira casa, mais preservada, era de seu Eduardo.(Foto: Fernando Antunes)
Primeira casa, mais preservada, era de seu Eduardo.(Foto: Fernando Antunes)
Segunda, já sem as janelas, foi onde morou Paulo Coelho Machado. (Foto: Fernando Antunes)
Segunda, já sem as janelas, foi onde morou Paulo Coelho Machado. (Foto: Fernando Antunes)
Ainda preservadas, janelas abriam para fora, onde era escritório do Dr. Eduardo. (Foto: Fernando Antunes)
Ainda preservadas, janelas abriam para fora, onde era escritório do Dr. Eduardo. (Foto: Fernando Antunes)
Por dentro, a única coisa do projeto original que ficou. (Foto: Fernando Antunes)
Por dentro, a única coisa do projeto original que ficou. (Foto: Fernando Antunes)
Com fachada ornamentada e relevos em estuque, casa registrou
Com fachada ornamentada e relevos em estuque, casa registrou
a passagem do ecletismo na Capital. (Foto: Fernando Antunes)
a passagem do ecletismo na Capital. (Foto: Fernando Antunes)

A neta conta que depois se casou e teve dois filhos no Rio de Janeiro. E quando retornou para Campo Grande, morou no imóvel da 15 por três meses. "Essa casa tem uma história grande de toda a nossa família. Quando meu pai morreu, eu fiquei com a metade e o neto da tia Inah Metello, com a outra", conta Vera.

O imóvel como um todo foi vendido oito anos atrás. E apesar de listado como bens de interesse de preservação histórica, através de uma lei de 2010, dentro do Plano de Revitalização do Centro, sofreu várias intervenções. Do projeto original, ficaram só as janelas e parte da fachada da primeira casa. Nos fundos, foi construído um estacionamento e na segunda casa, onde eram as duas janelas, uma porta foi aberta.

"Eu passo ali na frente e está tudo diferente", resume com nostalgia, a neta do ilustre morador.

Esta reportagem teve o apoio dos arquitetos Ângelo Arruda e Fernando Batiston.

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(Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")
(Foto retirada do livro "Eduardo Olímpio Machado: o homem, o meio, seu tempo")
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