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Arquitetura

Mesa da avó e cadeira de barbeiro são história do médico que queria ser dentista

Paula Maciulevicius | 20/04/2015 06:34
Mesa estilo Luís XV foi presente da avó para deixar consultório do neto bonito. (Foto: Fernando Antunes)
Mesa estilo Luís XV foi presente da avó para deixar consultório do neto bonito. (Foto: Fernando Antunes)

A sala foge do ar de consultório médico e era exatamente esta a intenção do otorrinolaringologista, Pedro Paulo Bidart Sampaio Rocha. De que os pacientes que já chegam ali doentes pudessem se sentir bem, dentro do possível. Na esquina das ruas Piratininga e Goiás, no Jardim dos Estados, em Campo Grande, a mesa e a cadeira são destaque não só por serem onde médico e paciente se encontram, mas por contarem história.

De madeira e um peso que é preciso seis homens para carregá-la, a mesa modelo Luís XV, pertenceu à avó do médico. Apaixonada por antiguidades, assim como ele, que hoje coleciona de facas, machados e copos, até bengalas. O presente foi dado em 1986, para que o neto tivesse uma mesa bonita no consultório.

"É do século XVII ou XVIII. É uma coisa muito antiga, você fecha a gaveta do meio, as demais não abrem. Minha avó trabalhou com antiguidades durante anos. Se não era de família, veio por essa via", explica o médico. A mesa antes de ser o centro dos atendimentos do especialista em Campo Grande, passou por Pouso Alegre, cidade do sul de Minas Gerais. 

Pedro Paulo é nascido em São Paulo e por trás do diploma de médico na parede, existiu antes a vontade do jovem em ser dentista, como o pai. "Mas ele me dizia que médico era um trabalho superior, então ele me disse 'se você quer ser dentista, seja primeiro médico, depois faça Odontologia'", lembra. 

Cadeira foi comprada de barbeiro que se aposentou e hoje sentam nela pacientes. (Foto: Fernando Antunes)
Cadeira foi comprada de barbeiro que se aposentou e hoje sentam nela pacientes. (Foto: Fernando Antunes)

Obediente, ele terminou o curso para então prestar vestibular. "Aí fui fazer o meu sonho, a Odontologia. Mas na Medicina tinha que escolher residência e escolhi pela área mais próxima da boca e fui fazer otorrino", descreve. Quando já estava no terceiro ano da segunda faculdade, surgiu uma bolsa de estudos na França para especialização em cirurgia de ouvido. A Odontologia foi trancada e ele se mudou para a Europa.

"Quando voltei, não queria mais morar em São Paulo. Eu tinha um irmão em Minas, ele me convidou para dar aulas em Pouso Alegre, no sul do Estado", recorda. Foram 11 meses lá, até que eles sentiram necessidade de conhecer outras regiões. Passaram por Mato Grosso até chegar ao estado vizinho, de Mato Grosso do Sul.

"Minha avó materna é daqui e ela falava 'vem conhecer seu povo'. Saímos de Pouso Alegre e chegamos aqui com ruas largas, arborizadas, fomos muito bem recebidos e minha mulher nem voltou para buscar a mudança", narra.

Em 1987, otorrino e a mesa, presente da avó, chegaram para trabalhar na Capital. O encontro com a cadeira de barbeiro, que hoje serve para os atendimentos e exames no paciente, foi entre 1989 e 1990.

"No começo do meu trabalho eu visitava os pacientes em casa. Um dia eu fui num lugar, na Vila Liane, em frente ao aeroporto, cheguei com dificuldade, aquela época não existia GPS. Eu estava procurando a casa quando vi a cadeira de barbeiro embaixo de uma goteira, estava chovendo, era do vizinho da minha paciente que estava se aposentando", conta.

Depois de examinada paciente, ele perguntou se por um acaso o vizinho dela venderia a cadeira. Ela ficou de ver e quando voltou para a consulta de retorno, já trouxe a resposta. "Eu paguei o que equivale a R$ 50,00 do dinheiro da época, mas esqueci do assunto... Passaram uns meses ela me ligou, dizendo que o vizinho perguntou se eu não podia pegar a cadeira, porque ele está mudando". Pedro Paulo pediu então ao mecânico de confiança que fosse buscar e fazer os ajustes necessários.

A cadeira precisou apenas de óleo para que a alavanca fizesse a subida e descida. De ferro fundido, ela tem detalhes entalhados em madeira nos braços, que anteriormente eram escondidos por uma mão de tinta preta. "Quando ela ficou pronta, eu usava uma cadeira normal, aí troquei. Meu objetivo aqui era de não parecer consultório, porque eu atendo muita criança, adulto e quem está doente se sente mal e o paciente tem que se sentir bem aqui e eu também, já que fico aqui 8, 10h por dia", resume.

Quando pergunto então como ele avalia que seja a sala se não um consultório, o médico deixa a resposta no ar, quem sabe porque para cada paciente haja uma interpretação.

Quanto ao sonho de ser dentista, ele responde que ficou no passado. Em Campo Grande, Pedro Paulo ainda tentou transferir a faculdade, mas por cursar uma Estadual em São Paulo, não conseguiu a transferência para a Federal daqui. Sobre a sua idade, ele ri dizendo que "faz 8 anos que faço 51".

Apaixonado por coleções e histórias, otorrino quis que sala fosse de tudo, menos um consultório. (Foto: Fernando Antunes)
Apaixonado por coleções e histórias, otorrino quis que sala fosse de tudo, menos um consultório. (Foto: Fernando Antunes)
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