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Comportamento

A coragem de quem após anos decidiu oficializar o casamento

Paula Maciulevicius | 19/10/2012 14:21
Célia de Lima Caetano e Laércio da Rocha eram um dos 21 casais que passaram a união de anos, para o papel. O primeiro beijo como casados oficialmente. (Foto: Minamar Júnior)
Célia de Lima Caetano e Laércio da Rocha eram um dos 21 casais que passaram a união de anos, para o papel. O primeiro beijo como casados oficialmente. (Foto: Minamar Júnior)

Um amor que só se oficializou no papel quase 20 anos depois da história começar no bairro Iracy Coelho. Na manhã desta sexta-feira, Zenilda Shirley Silva, 46 anos, e Sidney de Andrade e Silva, de 43, tentavam explicar ao juiz, entre três certidões de nascimento, quais eram os filhos que o casal tem em comum.

Durante o casamento comunitário na paróquia São Judas Tadeu, os dois são exemplo de características da Capital que fica em segundo lugar no ranking de divórcios. Mas ao mesmo tempo, a cidade tem, da metade dos atendidos pela Justiça Itinerante, casais dizendo sim ao invés de brigar pela partilha de bens. Se no fim das contas estes mesmos casais aparecem de novo diante dos conciliadores pedindo o divórcio, a conversa é outra.

A história do casal é de um amor antigo. Que 20 anos depois foi passado para o papel. Hoje eles saíram da igreja de São Judas Tadeu, casados diante da Justiça Itinerante. Ela é recreadora, ele é motorista. Tiveram um filho há 19 anos, mas não ficaram juntos. Deram ‘um tempo’, como preferem dizer.

Amor antigo: depois de 20 anos e dois filhos, Sidney Silva pediu a primeira mulher, Zenilda Silva, em casamento. (Foto Minamar Júnior)
Amor antigo: depois de 20 anos e dois filhos, Sidney Silva pediu a primeira mulher, Zenilda Silva, em casamento. (Foto Minamar Júnior)

Ele se casou e teve outro filho, ela continuou sozinha, talvez esperando por ele. Até chegar aos 14 anos de união, os dois tiveram o segundo filho juntos, com quatro meses de diferença entre o segundo filho de Sidney, de outra relação.

Confuso? Pois era isso que explicavam ao juiz titular da Justiça Itinerante, Cézar Miozzo. Com três certidões de nascimento em mãos, o primeiro e o terceiro são filhos dos dois e o do meio, apenas do marido. Mas no resumo, os três são o motivo do casal oficializar o casamento. “Para dar exemplo aos filhos”.

Na brincadeira, eles começaram contando que fizeram um teste para ver se daria certo. Sidney não tem como negar, parece que deu, já que são 14 anos de convívio diário. “Eu acordei hoje sentindo uma coisa aqui no pescoço, parece uma corda”, dizia brincando sobre o fato de que agora estava ‘enforcado’ oficialmente.

“Já assinou? Então já era”, brincou um dos padrinhos do casal, que foi testemunha.

Zenilda é mais romântica e confirma que o sonho sempre foi de casar. “Sempre tive essa vontade, está no meu destino, não tem jeito, vamos acabar nós mesmos”, falava olhando para o agora, marido.

Eles até seguiram o que manda o protocolo de um casamento. “Teve pedido. Eu perguntei vamos casar? Ela sempre quis casar. Falei que ia ter casamento 0800 e ela aceitou”, conta Sidney.

A cerimônia religiosa será no próximo dia 27, com os mesmos 21 casais que hoje receberam o reconhecimento da Justiça como casados. Primeiro, eles tinham de estar ‘quites’ com o civil, para depois partir para a benção do padre na igreja.

O casamento foi adiado e depois de 10 anos, Roseli e Wacir viram no casamento comunitário, a oportunidade de realizar o sonho. (Foto: Minamar Júnior)
O casamento foi adiado e depois de 10 anos, Roseli e Wacir viram no casamento comunitário, a oportunidade de realizar o sonho. (Foto: Minamar Júnior)

Roseli e Wacir era um dos casais que não mostravam nervosismo, estavam preparados. O vestido de Roseli Almeida, 30 anos, tem o apoio de véu e buquê. Hoje ela era a única que de longe, dava a entender que se tratava de uma noiva.

“Eu achei que ia ter gente de branco. Sou a única ‘meio-noiva’ né?” dizia com vestido branco de renda. Os dois queriam casar há muito tempo, pelo menos 10 dos 11 anos que já estão juntos. Para ela esta era a primeira vez, para o marido, Wacir Piloto, 51, a segunda vez.

“A gente sempre teve vontade, fomos só adiando, adiando para quando tivesse dinheiro e fazer uma festa. Como as condições nunca vieram e surgiram esta oportunidade, vamos casar”, disse Wacir.

E entre todos os ‘sim’, tinha um policial militar a trabalho. Mas não era para obrigar noivo fujão a casar, era para garantir a tranquilidade que cabo Elsio Santos Amaral, 46 anos, estava lá.

“Não, em casamento é sempre na paz. Agora vai vendo quando é divórcio e briga por pensão alimentícia. Às vezes complica porque o cara traz a atual para tratar do assunto com a ex?” brincou.

Para o juiz titular da Justiça Itinerante, Cezar Miozzo, que já está há quase 10 anos levando casamento e divórcio até as pessoas, o perfil varia: jovens, gente de pouca idade, mais idade e de todas as classes sociais, mesmo o programa sendo voltado às pessoas que não tem condição de pagar pelas despesas matrimoniais, que saem em média R$ 450 para casar no cartório.

E como Mato Grosso do Sul bate o recorde do segundo estado brasileiro com mais divorciados, segundo o Censo 2010, não é incomum encontrar por duas vezes o mesmo casal diante da Justiça Itinerante.

“Tem casal que a gente faz o casamento e depois eles voltam para o divórcio. A gente até questiona e eles dizem que a relação já estava meio assim e que arrebentou mesmo depois de casar. Eles estão bem menos tolerantes”, comenta o juiz.

Quem acompanha há quase 10 anos casais convertendo união estável em casamento esteve presente de homens que separaram da primeira esposa, casaram novamente e depois voltam para a primeira mulher.

“Eles descobrem depois que o divórcio não era a solução e sim o começo de outro problema”, brinca.

Sobre a confusão de certidões de nascimento, o magistrado diz que é muito comum não saber de primeira quantos filhos juntos aquele casal tem, fora os enteados. “Você vê cada coisa aqui que não dá para imaginar como estas pessoas vivem. Com um grande número de filhos e às vezes em casa com duas peças, mas eles arrumam jeito de se acomodar que a gente não consegue imaginar”, finaliza.

O casamento religioso destes casais será realizado na Paróquia São Geraldo Magela, às 19h30, no bairro Jóquei Clube.

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