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Comportamento

Câncer castiga há anos, mas vivi para 1ª voo de avião e para ajudar cães de rua

Ângela Kempfer | 04/08/2015 06:23
Elizabeth no hospital.
Elizabeth no hospital.

Os últimos anos têm sido de batalha para a artesã Elizabeth Reis de Oliveira. Ela vivia de recolher papelão para a reciclagem, até descobrir o câncer, passar por 4 cirurgias e perder parte do pulmão. Hoje vive roxa de tanto tomar remédio na veia contra as dores. Mesmo assim, comemora o que a doença trouxe de boas transformações e novidades, como o simples fato de "andar de avião". Hoje ela também cuida de cães abandonados e tem muitos outros planos pela frente, que ela mesma enumera agora, como a Voz da Experiência de quem continua firme..

 

O diagnóstico chegou há sete anos. Câncer. Raríssimo. Tumor de Timo. Na verdade, eu sempre fui muito apavorada com relação à doença, qualquer anormalidade eu sempre corria para o posto e isso me ajudou. Mas não foi fácil. Minha família inteira desmoronou. A mais confiante, apesar de tudo, era eu.

Ainda me lembro daquela tarde em que todo o peso da palavra câncer caiu sobre mim. Ainda estava me recuperando da cirurgia que havia sido feita para a biópsia. Tantos planos e sonhos, tanta coisa a fazer e eu poderia simplesmente morrer a qualquer momento. Não que fosse diferente, todos podemos morrer neste instante ou durar muito tempo, mas é como se a partir daquele instante eu estivesse com a validade vencendo.

Veio a segunda cirurgia. Correu tudo bem, 90% do tumor foi retirado e eu poderia seguir minha vida, com exames a cada seis meses para acompanhamento, mas disseram que eu teria uma vida normal. Voltei para casa, pros meus cachorros, para o meu trabalho que era de catadora de papelão.

Não demorou muito e estava empurrando carrinho pelo bairro, com meu marido e tendo uma vida mais ou menos normal. Deixava ele fazer a maior parte do esforço. Mas acompanhava.

Em novembro de 2012 tive um princípio de infarto. Passei mal, fui internada com dores e fizeram um cateterismo. Não tinha veia entupida, nem pressão alta, nem diabetes. Não havia motivos para ter um infarto, mas continuava com dor nas costas, tossia muito. Fui atrás do meu médico, o Doutor Carlos Geraldo.

Novos exames, mas pela cara dele, nem precisava de diagnóstico. O tumor havia voltado, estava com sete centímetros e crescendo.

Novamente a família em pânico, meu marido aos prantos, os meus filhos com os olhos arregalados, olhar distante, minha mãe chorando e meus irmãos todos ao meu redor. De novo fui eu a segurar a onda e seguir confiante.

Nova operação foi marcada para a retirada do pulmão esquerdo. Foram 14 horas de cirurgia, a terceira. Saí de lá direto para a UTI, fiquei seis dias em coma. Minha família já não tinha esperanças. Mas, como que por um milagre eu abri os olhos e comecei a tentar falar sem parar. Estava rouca, minha voz praticamente não saía por causa da retirada de boa parte da faringe. Foi um alívio para todos.

Tinha que ficar com acompanhante o tempo todo. Minha filha e minha mãe, além de algumas vezes minha irmã, se revezavam na tarefa. Vieram os problemas decorrentes de ficar tanto tempo no hospital, peguei bactéria, voltei pra sala de cirurgia, no final das contas foram 23 dias internada no Hospital do Câncer. Uma eternidade para a minha família, mas eu acreditava e me sentia melhor a cada dia. Voltei a falar aos poucos, a voz começou a sair e já tagarelava o dia todo.

Depois de ir pra casa, descobri as deficiências. Não podia fazer nada, meu lado esquerdo ficou com problemas devido à retirada do pulmão. Eu me cansava com facilidade e tinha dores no braço. O tempo mudava eu ficava sem ar, tossia, era difícil. Não pude voltar ao trabalho. Meu marido e minha família me ajudaram e montamos uma lojinha, um sonho antigo, pois era um serviço mais leve.

Depois disso já fui internada para colocação de um marca-passo, uma quarta cirurgia e vivo roxa de tanto tomar remédio na veia para dores, que são constantes.

Durante um ano eu consegui auxílio doença do INSS, no início deste ano cortaram dizendo que eu poderia voltar a trabalhar, mas isso é mito. Não posso fazer esforço nenhum. E meu padrão de vida caiu bastante, pois faz falta o dinheiro do meu trabalho e a lojinha só dá pra quebrar um galho.

Estou sem vestígios da doença, mas a sombra da palavra ainda pesa na minha família. Todo mundo tem medo. Estou completando 50 anos em agosto e tenho muito a agradecer. Por estar aqui, por ter tido estes sete anos e tenho feito coisas incríveis desde então. Montei minha lojinha, comprei máquinas novas para costurar quando posso, andei de avião e cuido dos cachorrinhos que as pessoas abandonam.

Gostaria de deixar uma palavra de alento a quem por acaso esteja passando por algo parecido. O que parece impossível, não é.

Basta ter fé. Eu tive fé desde o primeiro dia que o diagnóstico chegou e continuo firme. Tenho muitos sonhos ainda para realizar, como tomar um café com a Ana Maria Braga na Rede Globo. Eu sei que um dia eu vou conseguir, e vivo cada dia intensamente. Estou viva! Só tenho a agradecer.

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