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Comportamento

Depois de 19 anos ouvindo que foi abandonado por amor, rapaz reencontra a mãe

Ângela Kempfer | 29/03/2012 16:36
Vinícius e as 3 mães: Maria Cristina, Lídia e Márcia. (Fotos: Marlon Ganassim)
Vinícius e as 3 mães: Maria Cristina, Lídia e Márcia. (Fotos: Marlon Ganassim)
O abraço do reencontro.
O abraço do reencontro.

Um encontro fácil de imaginar depois de anos de distância e um assunto mal resolvido, um caso quase cotidiano: o jovem adotado que reencontra a mãe biológica 19 anos depois. Mas nesta história, a maior lição vem da avó adotiva, dona Lídia Esteves, que aos 62 anos, depois de enfrentar algumas barras por amor ao neto que a vida deu, teve o desprendimento de buscar a mãe biológica do garoto por uma dívida, que parecia alimentar desde que acolheu Marcos Vinícius.

Na verdade, nunca houve dívida alguma, mas pelos relatos de dona Lídia, na cabeça dela o assunto mal resolvido ainda fazia mal ao neto, um rapaz “caladão demais”, e deveria atormentar a mãe verdadeira que fez questão de mandar um recado à nova família do filho no dia da separação. “A moça que entregou ele para a gente contou que ela tinha mandado dizer que não teve outra escolha, que não podia cuidar e que fez isso por amor”, conta a filha de Lídia, Márcia Esteves, de 38 anos.

A vida deu a Marcos Vinícius três mães, a adotiva, a avó de coração, e a biológica, que ele só conheceu hoje. O menino nervoso, todo arrumado ao estilo hip hop, é a cara de Maria Cristina Lemos Pavon e também de personalidade muita parecida, apesar de nunca ter convivido com a mãe verdadeira.

Aos 24 anos, Maria decidiu entregar o filho recém nascido à outra família, com medo de perder o emprego. “Eu trabalhava em uma casa e a patroa disse que eu ia ter de dar um jeito na criança. Por isso resolvi dar ele”, lembra.

A doméstica diz que abriu mão do menino porque já tinha outro filho, já criado pela avó. “Minha família não aceitava”, justifica. Mas antes de se despedir pediu para que à nova família do menino ficasse claro que ela não tinha outra alternativa e que amava o filho.

A mensagem foi repetida por anos a Vinícius, que garante não ter ressentimento algum. “Sempre entendi que ela me amava, mas não podia ficar comigo. Também sempre fui muito bem tratado, então não tenho do que reclamar”, conta o jovem.

Vinícius e ao fundo a mãe biológica e a irmã.
Vinícius e ao fundo a mãe biológica e a irmã.

“Ele cresceu sabendo que a mãe foi obrigada a fazer o que fez”, completa a avó adotiva.

Lídia acabou sendo a terceira e mais importante mãe de Vinícius. A criança foi dada à Márcia, outra jovem casada há 2 anos, mas sem filhos. O casamento acabou, a moça retornou à casa dos pais e o menino se apegou à avó, dona Lídia.

“Quando eu casei de novo e mudei de casa, ele ficava doente e só melhorava quando voltava para casa da avó”, conta Márcia, a segunda mãe na história do garoto.

Aos dois anos, a família descobriu um tumor em Vinícius. O câncer foi diagnosticado e as lembranças de dois anos de tratamento intenso ainda enchem os olhos de dona Lídia de lágrimas. “Foi o pior tempo da nossa vida. Chorava dia e noite”.

O garoto venceu a doença, cresceu, é um orgulho evidente para a família, mas a dificuldade de fazer amizades, o jeito caladão, passou a preocupar a mãe-avó. “Pensei que podia ser o que ficou na cabeça por causa da falta da mãe biológica”.

Dona Lídia chamou o neto e começou a discutir a possibilidade de reencontro. “Primeiro ele não gostou, mas depois disse que sim e pediu para eu sempre ser a mãe dele. Eu disse que isso não ia mudar nada o que eu sou para ele”.

A avó procurou a investigadora Maria Campos, conhecida por fazer esse tipo de reaproximação, e em uma semana o encontro estava marcado. Marcos Vinícius encontrou a mãe na delegacia do bairro Piratininga, com o abraço e um sorriso nervoso.

Maria Cristina, uma índia bonita, teve uma emoção quieta, contida. É a imagem de uma mãe dura, forjada por uma vida difícil. O pai de Vinícius morreu, depois de uma namorico com Maria. Só depois de 4 anos do nascimento do menino, ela conseguiu um relacionamento estável e teve outra filha, Eidi, de 15 anos.

As duas famílias continuaram vivendo em Campo Grande, Vinícius no bairro Silvia Regina e Maria Cristina na Vila Carvalho.

Quando alguém toma uma decisão tão drástica como a de “dar” um filho, os anos que seguem não são fáceis, garante Maria, que faz questão de não demonstrar arrependimento. “Eu não podia fazer nada diferente naquele momento da vida.

Fiz o que tinha de ser feito e pronto. Mas quando isso acontece com a gente, nunca mais acaba aquela sensação de que uma hora ele vai voltar. Eu sabia que ele ia me encontrar, mas nunca procurei por respeito a outra família”, diz.

Vinícius e a mãe trocam poucas palavras, marcam o próximo encontro, na casa da avó adotiva e combinam. “Agora a gente vai se conhecendo, né. Aos poucos”, comenta o rapaz com a nova mãe.

Muito falante, com os olhos vermelhos e um copo d'água na mão, para acalmar o peito, dona Lídia termina a tarde dizendo: "Agora sim, estou muito feliz".

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