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Comportamento

Depois de histórias tristes, casal estende a mão e adota família completa

Paula Maciulevicius | 07/06/2012 09:35
A foto é de família. Mesmo posada, os sorrisos saem espontâneos de quem, graças a solidariedade amiga, tem onde morar. (Foto: Pedro Peralta)
A foto é de família. Mesmo posada, os sorrisos saem espontâneos de quem, graças a solidariedade amiga, tem onde morar. (Foto: Pedro Peralta)

A casa de Neusa ganhou mais quatro pratos à mesa na hora das refeições e o barulho de crianças pelos cômodos. Há pouco mais de uma semana, ela e o marido trouxeram para dentro de casa uma família completa. Pode-se dizer que adotaram a mãe Simone Ferreira Neri, 31 anos, e seus três filhos: Gabrielly, 13 anos; Pedro, 7 e Jhulia, 5 anos.

O exemplo de solidariedade partiu do casal que já não tem mais filhos morando com eles. Maria Neusa Guaresi, 46 anos, e Idalvan Alves Martins, 53, têm, além de bom coração, histórias de vida de quem deu a volta por cima e hoje estende a mão ao próximo sem querer nada em troca.

Ela sofreu violência doméstica durante 20 anos. Na carteira carregava em vez de fotos dos filhos, resmas de boletins de ocorrência registrados contra o até então, marido. Decidiu se separar há cinco anos. “Até que eu encontrei o amor da minha vida”. Enquanto fala, os olhos de Neusa olham carinhosamente em direção do marido.

Ele sobreviveu às complicações de um AVC (Acidente Vascular Cerebral) e dois anos de recuperação. Aposentado desde 2006 pela doença, foi forçado a trocar a vida ativa que tinha, incluindo viagens, à monotonia de uma casa.

Há dois anos o casal está em uma casa no Jardim Azaléia, onde também funciona uma sobaria à noite, o que motivou a primeira aproximação entre a família e Simone. As duas já trabalhavam juntas no Governo do Estado e para complementar a renda de Simone e de quebra, ajudar Neusa nos afazeres de uma casa grande, ela foi trabalhar na residência fazendo faxina.

Ele sofreu AVC e passou 2 anos em recuperação. Com filhos já adultos, diz que abraçou a causa. (Foto: Pedro Peralta)
Ele sofreu AVC e passou 2 anos em recuperação. Com filhos já adultos, diz que abraçou a causa. (Foto: Pedro Peralta)
Ela sofreu violência doméstica, foi acolhida por uma amiga e hoje retribui a mão que já estenderam à ela. (Foto: Pedro Peralta)
Ela sofreu violência doméstica, foi acolhida por uma amiga e hoje retribui a mão que já estenderam à ela. (Foto: Pedro Peralta)

Da faxina, Simone também começou a auxiliar na cozinha. Há 15 dias, uma ligação telefônica mudou o destino dessas duas famílias. E pra melhor. “Ela me ligou dizendo que o marido tinha ido embora e ela precisava devolver a casa onde moravam, no Santa Emília. Ela não tinha para onde ir e estava procurando uma casa para alugar”, conta Neusa.

O marido de Simone, padrasto dos três filhos dela, deixou a casa e para a família um prazo de 10 dias para mudar. A mãe conta que chegou a procurar casas, mas não achou local onde o aluguel coubesse no orçamento.

Dias depois da ligação, Simone foi com as crianças até a casa de uma vizinha para fazer faxina. Por acaso Neusa os encontrou no meio do caminho.

“Eu estendi a mão e a menininha pediu benção. Me quebrou ali. Eles queriam me abraçar e eu dei a mão. Fiquei com isso na cabeça e pensei vou lá ver como estão as crianças. Quando eu vi, elas estavam sentadinhas na pontinha do sofá, acoadas, olhando para a televisão”, lembra.

A cena emocionou na hora e emociona Neusa quando ela repete a história. Pegou as três crianças pela mão e levou para casa. “A menininha falava tia, mas como a sua casa é bonita. E já ficaram lá em casa, dormiram lá e no dia seguinte fomos buscar as coisas. Ela disse ainda para mim, tia, hoje é meu dia de sorte”.

A conversa de Neusa com o marido foi surpreendente. Ela com jeitinho pediu a Idalvan, que aceitasse abrigar a família em casa. “Eu estava com medo de falar com ele. Quando eu disse, nunca pensei que ele ia aceitar, me surpreendeu muito. Ele respondeu Deus mandou, vamos abraçar”, diz.

O casal acertou com um vizinho de pegar a caminhonete emprestada para fazer a mudança já no dia seguinte. Idalvan imaginava que ia levar o dia todo. “Você pensa entrar em uma casa que não tinha nada? Só fogão, geladeira, colchão e os três filhos. O fogão estava sem boca, o sofá não tinha como sentar. Não tinha nem o que trazer”. Quando ele descreve a cena que viu ao chegar a casa onde a família morava, as lágrimas correm pelos olhos.

Os olhinhos brilhando já refletem a alegria da pequena Jhulia. Quando mudou para a casa de Neusa, disse que era seu dia de sorte. (Foto: Pedro Peralta)
Os olhinhos brilhando já refletem a alegria da pequena Jhulia. Quando mudou para a casa de Neusa, disse que era seu dia de sorte. (Foto: Pedro Peralta)

Durante a entrevista, Simone era só alegria. Os olhos brilhavam ao ouvir da boca de quem estendeu a mão dessa forma, a felicidade do casal em partilhar da família. “Para mim foi maravilhoso. O que ela fez, nunca ninguém tinha estendido a mão assim, de receber uma família com criança que vai fazer barulho, bagunça”, relata

Ao arrumar o quarto dentro da própria casa, Neusa relembra do que fizeram por ela. “Me acolheram também. Quando eu separei, uma amiga tirou a filha do quarto para me dar e eu sou muito grata por ela ter feito isso por mim”.

As crianças assistiam televisão, mas com a chegada da equipe, abriram sorrisos largos e tratou de sentar todo mundo junto para contar da nova casa. A caçulinha, Jhulia também pediu benção quando a equipe chegou. Com os olhinhos brilhando e as mãozinhas postas, depois de ter a resposta “Deus te abençoe”, ela rapidinho dispara a falar. Se refere à Neusa, como Neusinha. “Eu achei bom. Estou em casa, ela é minha tia”, fala toda sorridente.

A mais velha, Gabrielly, é quem entende a situação e a nobreza do gesto da amiga/tia. “Eu gostava de lá, dos meus amigos. Mas eu entendi que a gente tinha que sair, não imaginava não que ela fosse fazer isso”.

A foto é de família. Simone, os filhos, Neusa e o chefe de família, Idalvan em pé. “Eu acolhi ela aqui, com as crianças e me despertou essas coisas gostosas e maravilhosas. Era isso que eu queria compartilhar. Eu já tive muito sentimento nessa vida, de tristeza, revolta. Nunca achei que fosse sentir amor por estranhos assim. E é muito bom”, finaliza Neusa.

“Estou aí e abracei essa causa. Fazer o bem faz a gente se sentir muito bem. Ter criança preenche a casa”, completa o marido.

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