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Comportamento

Em pé-de-guerra com a Arquidiocese, igreja radical quer construir convento

Ângela Kempfer | 05/07/2012 11:44
Missa é celebrada em pequena capela de pedras, alguns fiéis ficam na varanda. (Foto: Minamar Junior)
Missa é celebrada em pequena capela de pedras, alguns fiéis ficam na varanda. (Foto: Minamar Junior)

Todas as mulheres usam véu e saia na altura do joelho. Os homens ocupam os bancos da direita e elas os da esquerda. Não há mistura, uma forma de simbolizar a diferença entre os sexos e a submissão do feminino em relação ao masculino.

Na Sociedade Religiosa Regina Pacis, ou Escravas de Maria, as regras começam por aí. As missas, uma vez ao mês e sempre em latim, são o sinal de que nesta igreja o que vale é a tradição. O convento, de apenas duas irmãs, garante ser ainda mais radical que o grupo católico Opus Dei, que dentre algumas estranhezas ao mundo atual, proíbe as seguidoras de adotar qualquer método contraceptivo.

Na Escravas de Maria a pílula e a camisinha também são coisas pecaminosas e a mulher tem de ficar em casa, cuidando dos filhos. O trabalho fora só é aceito quando a família é humilde e precisa de renda extra.

Homossexuais podem frequentar a pequena capela de pedras, mas só se não praticarem “o pecado” propriamente dito. “A gente aceita a pessoa, não o pecado”, justifica a irmã Joana d’Arc.

Uma das meninas que freqüenta a igreja, já faz catequese há cinco anos. “São bem exigentes”, explica a mãe Cláudia d’Avalo, que também tem dificuldade para batizar os filhos. “Aqui não aceita casal que não seja casado na igreja. Como hoje todo mundo é só juntado, fica difícil encontrar alguém”, comenta.

Apesar de pregar o “Encanto e a Formosura”, já na abertura do material com as orientações aos fiéis, a madre que comanda o grupo é daquelas que enfrenta tudo com a postura de um zagueiro.

Com 1,80 metro, ex-campeã de basquete, com passagens por times de São Paulo, Gilcéia da Silva Oliveira mudou o nome e passou a ser a irmã Joana d’Arc, depois de ser convidada por uma colega a rezar um terço. “Escolhi esse nome porque é de uma guerreira, que todo mundo falava que estava errada e depois descobriram que era uma heroína”, explica.

Mulheres só podem acompanhar a missa se usarem véu. (Fotos Minamar Júnior)
Mulheres só podem acompanhar a missa se usarem véu. (Fotos Minamar Júnior)
Capelinha de pedras recebe os fiéis.
Capelinha de pedras recebe os fiéis.

A madre reclama da discriminação, principalmente da Arquidiocese de Campo Grande, que não reconhece a igreja “Escravas de Maria” com parte da Igreja Católica.

“Eles que são os errados, que mudaram a missa que querem fazer diferente. Nós somos a raiz, o puro, sem misturas, o que a igreja pregava lá no início”, defende. Para ela, a rejeição da cúpula da igreja em Campo Grande é “o que no basquete chamamos de jogo baixo”.

Gilcéia Largou a carreira promissora no esporte aos 20 anos e agora, 20 anos depois, garante que pouco se importa com o que os outros pensam dos dogmas que defende. “Podem me prender por preconceito, não tenho medo. O que acredito é na palavra de Deus e ele não aceito o homossexualismo, por exemplo. Já viu sair filho de dois homens ou de duas mulheres”.

Ela comprou o terreno e construiu a igrejinha em uma rua que mais parece picada aberta com nome de rua. Depois de 8 anos, a ideia é ampliar o convento, para receber outras meninas dispostas a vestir o hábito. Por enquanto apenas uma jovem, de 18 anos, atua na comunidade como candidata à freira.

Ao lado, já bem mais experiente, Joana D’arc tem uma médica. Maria de Cássia concluía a residência médica na Santa Casa, quando ao atender a irmã também resolveu largar tudo para se dedicar á igreja. “Aos 11 anos vi uma freira e achei lindo. Mas só fui pensar nisso de novo quando conheci a madre”, conta.

Médica abandonou Santa Casa para viver no convento.
Médica abandonou Santa Casa para viver no convento.
Irmã Joana D'arc faz tercinhos com motivos pantaneiros.
Irmã Joana D'arc faz tercinhos com motivos pantaneiros.

Na rua José Carneiro, número 83, no Jardim Auxiliadora, material de construção está espalhado por todo o terreno. Apenas a capelinha parece concluída. A imagem é bucólica, com uma cerca de bambu dividindo os quartos e escritórios do ambiente da missa.

Tudo é muito simples no local, com exceção das luzes verde e vermelha na porta do confessionário, que indicam quando o padre está disponível ou ocupado para ouvir os fiéis.

Os quartos das irmãs têm uma cama e alguns móveis doados. Em um dos cômodos, peças sobre uma mesa lembram artesanato. As irmãs produzem tercinhos com motivos pantaneiros para vender na feira e na internet e assim ir arrecadando dinheiro para a obra.

Hoje são cerca de 100 pessoas assíduas na sociedade, mas apenas 10 das redondezas. Antes de ir embora, a irmã entrega um folheto, com os ensinamentos da Escravas de Maria. Ao ler percebo que pode ser difícil encontrar fiéis dispostos ao levar as regras ao pé da letra.

As orientações são para não cultivar “namoros por passatempo”, fugir de “leituras” pecaminosas, do “mau cinema e do mau teatro”. Também é importante, na avaliação das irmãs, “fugir das ocasiões”, como “bailes perigosos e conversas em lugares retirados com os rapazes”.

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