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Maldito café

Por Porto Vanderlei (*) | 22/10/2015 16:26

A presunção de inocência cabe a todos. Trata-se de um princípio constitucional, cujo instituto é previsto no artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal de 1988, que não declara a inocência do culpado, contudo, demonstra o fato dele não ser necessariamente o possuidor da culpa pela prática do fato que lhe é imputado.

O indício é um sinal; um vestígio; uma indicação; (jur.) uma circunstância conhecida e provada que, tendo relação com determinado fato, autoriza, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias, segundo Aurélio Buarque de Hollanda.

Ora, se alguém, atualmente, ganha um salário de 15.582,00 e efetua compras, tais como um veículo no valor de R$ 39.350, logo a seguir outro no valor de R$ 89.790,00 e da forma semelhante, também compra imóveis na faixa de R$ 400 mil a R$ 800 mil tudo isso à vista, há indícios de que essas aquisições não são compatíveis com este salário e com seu “statu quo” anterior, abaixo daquela renda.

Segundo a mídia local, vereadores de Campo Grande estão sendo investigados por força da operação “Coffee Break”, que verifica a suspeita da compra de votos para a cassação do atual prefeito desta capital, Alcides Bernal. Embora, sabe-se que não é fácil materializar vantagens obtidas para esse fim, o qual culmina enriquecimento ilícito, mas também não há como negar que o fato principal, hoje, aqui e agora, é a investigação sob a responsabilidade do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco).

Ninguém investiga ninguém à toa ..., à toa. Neste sentido, em tese, há quem diga que o indício considera-se provas indiretas porque não apontam o fato desconhecido diretamente, mas sim por meio do raciocínio silogístico.

Para o promotor Marcos Alex Vera, coordenador do Gaeco, muitas provas contra os investigados existem (conforme notícias da imprensa local). Afirma ainda, que há indícios de enriquecimento ilícito entre eles, isto é, entre esses vereadores.

O raciocínio silogístico se pauta na dedução. Silogismo é o termo filosófico com o qual Aristóteles designou a argumentação lógica. Nesse sentido, ele é composto por duas proposições (maior e menor), a partir das quais se chega a uma conclusão. No caso em questão, veja o exemplo: todos os políticos perderam a credibilidade perante à sociedade. Vereadores de Campo Grande são investigados porque há provas, garantiu o promotor. Logo, são suspeitos por conta de uma lógica perfeita.

A propósito, a suspeição decorre de certas circunstâncias ou interesses intercorrentes que possam privar alguém – ... os investigados –, da exatidão no exercício de suas funções. O fato em destaque é a investigação em torno de se reunir provas da corrupção por conta da dissimulação da vantagem, fato que a sociedade sul-mato-grossense assiste em meio a tantas notícias diárias sobre “o escândalo da vez”, qual seja: vereadores da Capital que seguem investigados pelo MPE. Esse é o desenho atual.

Com base nesta elocução acima e com base nessa “bola da vez”, não há como a sociedade aceitar tranquilamente a presunção de inocência expressa por defesas públicas ou simples elucidações do naipe de um ou outro investigado tais como: “tenho minha consciência tranquila”, “sou inocente”, “o fato de indeferimento (TJ nega afastamento de 17 vereadores) tira aquela culpa que parava no ar de que os vereadores fizeram complô”.

Se não há culpados até o presente, há responsáveis, os quais são encarregados de conservar, de uma forma ou de outra, a Res publica, isto é, a “coisa do povo” com correção, retidão e pontualidade na realização de sua função outorgada pelo povo: função sem nenhuma mácula nem qualquer suspeição, sob pena de se assim deixar de ocorrer, tais suspeitos diminuem a escala ética da representatividade que se propuseram e, possivelmente, de todo Parlamento.

Só para ilustrar e/ou parafrasear, Dunga, em sua entrevista concedida recentemente a respeito do desempenho da seleção brasileira, disse que todo mundo fala de todo mundo sem provas. Em resposta, certo comentarista de TV ao comentar essa afirmativa, respondeu que se isso se fala é porque a seleção não joga bola. Daí concluiu: Isso é conversa fiada.

Se as defesas públicas dos vereadores campo-grandenses investigados não se constituem em conversa fiada, no mínimo, elas se assemelham a uma Ópera bufa, porque eles estão inchando as bochechas de contrastes fortuitos que parecem escárnios face às investigações.

Até porque, se a política dos políticos no Brasil revelasse seriedade, na concepção da palavra, todos os políticos suspeitos, moralmente, deveriam arguir sua suspeição, porque se culpados não são, no mínimo, responsáveis solidariamente pela coisa pública.

Somente o fato deles estarem sob a investigação de um grupo contra o crime organizado se deduz que há indícios de crime. Se deduz que a escala ética está sob suspeita. Se deduz que a imoralidade está em discussão. Resta se perguntar: quem, dentre todos os investigados, está neutralizando esse efeito moral?

Portanto, na altura desse escandaloso campeonato, cabe a todos promover a interlocução com a sociedade sobre o impacto de tudo isso e seu efeito, até porque, sucumbir esse maldito café poderia ser a ordem do dia.

(*) Porto Vanderlei, advogado e profissional de Educação Física

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