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Capital

Alteração em regra para planos de saúde pode comprometer tratamento de autistas

Caso parecer final do STJ seja positivo para a taxação, pacientes podem ter procedimentos suspensos

Karine Alencar | 02/04/2022 09:58
Criança que sofre com TEA pegando o cachorro no colo pela primeira vez após sessões para interação. (Foto: Jéssica Ferreira)
Criança que sofre com TEA pegando o cachorro no colo pela primeira vez após sessões para interação. (Foto: Jéssica Ferreira)

Possível alteração nas competências de planos de saúde pode colocar "em xeque" o tratamento de pacientes com TEA (Transtorno do Espectro Autista). A medida será julgada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) e o alerta vem de médicos e famílias que cuidam de pessoas com a condição neste 2 de abril, Dia do Orgulho Autista.

Caso o parecer final seja positivo para a taxação, os pacientes podem ter inúmeros tratamentos suspensos. A decisão tem preocupado profissionais da área e pais de crianças que lutam contra o transtorno do neurodesenvolvimento, como é o caso da enfermeira Jéssica Ferreira de 25 anos, que há cinco anos, já enfrenta dificuldades para conseguir tratamentos para o filho de 8 anos.

O menino é autista e assim que recebeu o diagnóstico, ela procurou especialistas para auxiliar na evolução do pequeno. Logo foi direcionada para a terapia ABA (Sigla do inglês- Applied Behavior Analysis, que significa Análise de Comportamento Aplicado).

Mesmo pagando o plano de saúde, ela conta que precisou recorrer à Justiça para conseguir subsidiar parte do procedimento. "Hoje em dia, os tratamentos efetivos como o ABA só são conseguidos com ação judicial ou pagamento parcial de 50%,. Só isso já é dificultoso. Precisei ir à Justiça e só consegui depois de 8 meses", relata.

Jéssica explica que a terapia ABA "ajuda a criança a se integrar na sociedade". "Sem esse método, a saúde é impactada. Com os tratamentos, meu filho passou a ter convívio social, interação, compreensão e raciocínio. Ele tinha medo de cachorro, por exemplo, e hoje em dia, ele brinca e pega no colo", detalha a mãe toda feliz.

A ABA exige que o autista faça, por exemplo, Terapia Ocupacional e de Intervenção Sensorial, recursos já limitados no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Por vezes, alguns pacientes precisam de mais sessões do que as estipuladas para conseguirem resultados com essas terapias. Por isso, no atual modelo, conseguem a aprovação de pagamento pelo plano de saúde.

Segundo o médico especialista em pacientes com autismo e diretor do iABA (Instituto de Análise do Comportamento Aplicada), André Varella, poucas famílias tem o poder aquisitivo preciso para custear os tratamentos sem apoio dos convênios, que também geram custos pesados. "Essas crianças precisam ser acompanhadas por vários profissionais. Como o quadro é crônico, em inúmeros casos o tratamento é necessário por muitos e muitos anos, por uma boa parte da vida. Assumir esse custo é uma condição muito rara que famílias podem proporcionar, mais ou menos 1% da população no País, sendo que 2 milhões de pessoas sofrem de TEA no Brasil. É muita gente, então essa decisão é uma grande preocupação para a saúde pública", destaca.

Em Mato Grosso do Sul, 612,3 mil pessoas são assistidas por planos de saúde. Em Campo Grande, são 251.283, sendo a Unimed e a Cassems (Caixa de Assistência dos Servidores Públicos de Mato Grosso do Sul) os maiores convênios.

Vale destacar ainda que, segundo profissionais do setor, diversas terapias poderão ser suspensas dos planos, como alguns tipos de quimioterapia e radioterapia para pacientes com câncer.

O trâmite - O STJ já havia decidido que os planos eram obrigados a custear tratamentos médicos, listados ou não no rol da ANS, explica Giovana Trad, advogada especialista em Direito Médico e da Saúde. "Em 2019, a 4ª turma abriu uma divergência e passou a entender que apenas o que está na lista da ANS faz parte da obrigação dos planos de saúde. Com isso, as opiniões ficaram divididas. Aí o STJ disse que era preciso uniformizar esse entendimento, foi quando a 3ª e 4ª turmas começaram a analisar de novo todo o processo", disse.

O relator da ação Luiz Felipe Salomão entende que só deve ser cumprido o que está na lista, mas a ministra Nancy Andrighi tem opinião contrária. Para ela, o rol da ANS deve ser usado apenas como uma referência para o dever dos planos de saúde. "Foi um voto muito humano e técnico porque ela defendeu que quando um beneficiário contrata esse tipo de serviço, é para que caso ele precise, tenha segurança. Ele não tem como prever o que você pode precisar futuramente", pondera a advogada.

O entendimento do STJ ainda não foi concluído, mais 8 relatores precisam votar.

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