ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, QUINTA  25    CAMPO GRANDE 27º

Artigos

Meu pai, por Heitor Freire

Por Heitor Freire (*) | 18/06/2014 10:32

Todos nós temos dois personagens que marcam de forma muito significativa nossas vidas: os pais e as mães. São a nossa fonte. Outro dia escrevi sobre a minha mãe, hoje vou referir-me ao meu pai.

Meu pai, Luiz Freire Benchetrit, nasceu em Asunción, Paraguay, e ainda menino se mudou com a família para o Chile, onde trabalhou nas minas de carvão e estudou contabilidade, quando então desenvolveu uma caligrafia marcante e firme, característica do seu caráter. Ele sempre foi muito patriota e idealista. Quando foi deflagrada a Guerra do Chaco, entre o Paraguay e a Bolívia (1932- 1935), ele voltou para o seu país e se alistou no Exército para lutar.

Após a guerra, mudou-se para Pedro Juan Caballero, estabelecendo-se como comerciante em sociedade com o meu tio Manolo Cândia, seu concunhado. Tiveram primeiro a Casa Nippon e depois a Casa Estrella que, mutatis mutandi, seria o Shopping China de hoje. Conheceu minha mãe e se casaram em 1939. Eu e todos os meus irmãos (seis) nascemos naquela cidade fronteiriça.

Com o advento do golpe de 1947 em que o Partido Colorado tomou o poder, meu pai, sendo freberista (partido oposicionista aos vencedores), teve que abandonar o país, perdendo tudo o que até então amealhara e construíra e que era um patrimônio respeitável. Do lado brasileiro da fronteira assistiu a sua casa comercial ser saqueada por vândalos que arrastavam tudo o que encontravam, num delírio idêntico ao que assistimos hoje no espetáculo dos “black-blocs”.

Mudamos para Campo Grande, onde ele não teve nenhuma vergonha em recomeçar fritando pastéis no Bar Bom Jardim e eu, com sete anos, o auxiliava com a venda dos salgados. Daí foi para a gerência do Mate Índio, do meu avô materno Francisco Rodrigues. Depois adquiriu o Salão Cristal, que era localizado no hoje Edifício São José, na galeria com o mesmo nome. A seguir, estabeleceu-se na rua sete de Setembro, em plena zona do baixo meretrício, com o Mercadinho Popular.

Meu pai sempre foi muito trabalhador, inteligente, idealista. Assim, com a prosperidade nos negócios, adquiriu uma área rural perto da cidade, a Fazenda Formosa, que, no ato da compra, constava com quase dois mil hectares. Era amigo e profundo admirador do trabalho da professora Oliva Enciso, na Sociedade Miguel Couto dos Amigos dos Estudantes. Por isso e desejando contribuir para a implantação de uma escola agrícola para estudantes carentes, resolveu doar 300 hectares para a entidade presidida pela professora Oliva (que minha mãe sempre chamava de senhorita Oliva).

Ao ser feita a medição da área para desmembrar os 300 hectares doados, verificou-se que na realidade, a fazenda tinha apenas 1.200 hectares. Ante esse fato, a professora Oliva disse a meu pai que ele não precisava doar a área, em virtude da realidade da dimensão da fazenda, o que ele na sua consciência e no compromisso com a sua palavra, não aceitou. Disse que a área estava doada; e ficou com a parte remanescente da fazenda. Ele nunca contou isso para mim e para nenhum dos meus irmãos. Só a mamãe sabia e também nunca comentou nada conosco.

Eu só vim a saber disso muitos anos após a morte do meu pai. Quem me contou foi a professora Oliva. Esse fato voltou à minha memória quando encontrei casualmente o engenheiro Eduardo Fontoura, sobrinho-neto da professora Oliva e seu sucessor na direção da Sociedade.

O meu pai contribuiu também para a criação da Clínica Campo Grande. Era amigo e grande admirador do dr. Alberto Neder. Foi também membro da Seleta Sociedade Caritativa e Humanitária (S::S::C::H::).

A herança que ele nos deixou é imortal, pois sempre estamos recebendo algo dele mesmo tantos anos mais tarde, como quando encontrei o Eduardo Fontoura.

Gracias meu pai.

(*) Heitor Freire é corretor de imóveis e advogado.

Nos siga no Google Notícias