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Um Parlamento forte para o Mercosul

Marta Ferreira | 14/02/2013 13:49

A reunião da chamada cúpula presidencial do Mercosul, que ocorreu no fim de 2012, em Brasília, foi oportuna ocasião para uma avaliação, ainda que breve, sobre o presente, as perspectivas e os impasses do Mercado Comum do Sul, instituído pelo tratado de Assunção, em 1991.

Ainda longe de se consolidar como União Aduaneira, ingenuamente prevista para 1994, e mesmo sem expectativa de que venha, em médio prazo, concretizar o ambicioso projeto da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi), criada pelo Tratado de Montevidéu, em 1980, mesmo assim o Mercosul vem se firmando, progressivamente, como instrumento de integração regional. Apesar dos muitos impasses.

A discutível suspensão temporária do Paraguai em consequência da forma “cirúrgica” como foi substituído o ex-presidente Lugo, e a concomitante oficialização da Venezuela como estado-membro pleno, com o que, aliás, a República Guarani não concordava, são exemplos desses impasses jurídicos do Mercosul.

Contudo, muito mais do que no terreno social ou na área política, é no contexto econômico, nas relações internas do Bloco, e nas práticas tarifárias de cada país-membro com outras nações, que essas dissonâncias suscitam dúvidas quanto ao futuro do Mercosul.

O que mais preocupa é que a maioria desses impasses tarifários e dessas dissonâncias mercantis se dá entre Argentina e Brasil, as duas mais fortes economias do Mercosul. Aliás, a musculatura exibida pelos dois países parece reduzir os outros parceiros a membros de segunda categoria, com todos os graves prejuízos comunitários daí decorrentes.

Ainda há pouco, a Presidente Dilma expressou, na Argentina, seu empenho para destravar o comércio bilateral que, embora tenha saltado de sete bilhões de dólares, há dez anos, para quarenta bilhões de dólares em 2011, não deve passar de trinta e quatro bilhões neste ano.

A grande questão é que essa pauta bilateral, naturalmente estratégica e inadiável, coloca Brasil e Argentina no camarote exclusivo, onde não há lugar para Paraguai, Uruguai, ou mesmo a Venezuela, o mais recente e festejado parceiro, cujo embarque, aliás, ainda depende da aprovação do parlamento paraguaio, no momento em que o passageiro mais pobre for reabilitado no bloco.

É a pretexto desse contencioso, que imbricou suspensão do Paraguai e admissão plena da Venezuela, que desejo fazer breve reflexão.

Quanto às instâncias decisórias do Mercosul, compostas pelo Conselho do Mercado Comum, Grupo do Mercado Comum e Comissão de Comércio do Mercosul, nada há a questionar se temos em vista a construção de uma futura união aduaneira.

Porém, se nossos olhos estão postos numa futura comunidade de nações latino-americanas, nos moldes da União Europeia, então não há dúvida de que temos o grande e urgente desafio de construir, paulatinamente, uma estrutura jurídico-institucional que, além de consolidar em princípios a legislação existente, quase toda de natureza “derivada” das demandas, constitua base fecunda e segura para o destino comum dos povos latino–americanos.

E não há dúvida de que o Parlamento do Mercosul, tal como o temos hoje, não pode dar conta de tão extraordinária tarefa. E, se não será esse Parlamento, que só não é honorário porque composto por membros dos congressos nacionais, menos ainda se poderá delegar às corporações a missão de estabelecer marcos de uma futura Constituição Comunitária. Pois essa é, obviamente, uma extraordinária e intransferível atribuição do Poder Legislativo de cada um dos países membros.

Para tanto, é fundamental e urgente que os legislativos nacionais definam mecanismos comuns para a eleição de congressistas que tenham, também, o mandato popular de representar seu país em um parlamento comunitário com efetiva representatividade.

É incontestável a consolidação do Mercosul como bloco comercial, embora ainda seja apenas o embrião de uma comunidade de nações. A entrada da Venezuela agregou ao Bloco mais 900 mil quilômetros quadrados, o equivalente à soma dos territórios de França e Alemanha. Mais que território, o ingresso da Venezuela agrega 29 milhões de pessoas ao comércio intra-bloco, e confere ao Mercosul o status de região com mais reserva de petróleo do planeta.

Em 21 anos - completados em 201, o comércio intra-bloco saltou de 4,5 bilhões para 50 bilhões de dólares anuais, enquanto cem milhões de dólares são aplicados anualmente, a fundo perdido, pelo Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) para diminuir as disparidades entre os países, principalmente em infraestrutura.

É nesse cenário de expansão vigorosa do bloco, e das divergências e impasses daí decorrentes, que identifico, com preocupação, o crescente déficit político entre a expansão geográfica, econômica e populacional do Mercosul e a tímida articulação dos legislativos nacionais para consolidar o processo de regulação comunitária.

No Brasil, é bom que reconheçamos, a academia tem sido muito fecunda na formulação de um arcabouço jurídico-legal, vasto e substancioso, sobre o Mercosul. Questões como as discrepâncias entre a estrutura constitucional de cada país-membro e o ordenamento jurídico do Bloco, assim como o próprio déficit legislativo da construção do mercado comum têm merecido competentes análises.

Os legislativos nacionais não podem seguir tendo atuação subsidiária no prodigioso processo de construção da comunidade latino-americana, em cuja direção o Mercosul representa decisivo passo.

(*) Fábio Trad é deputado federal pelo PMDB/MS

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