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Cidades

Compra de mansões na Bahia e Damha colocam desembargador na mira da PF

Fortuna de 2,7 milhões em reais e dólares foi apreendida na casa de Júlio Roberto Siqueira Cardoso

Por Aline dos Santos | 27/10/2024 11:46
Imóvel comprado por desembargador aposentado do TJMS na Bahia. (Foto: Reprodução)
Imóvel comprado por desembargador aposentado do TJMS na Bahia. (Foto: Reprodução)

A compra de mansões no litoral da Bahia e no condomínio Damha, em Campo Grande, sempre fazendo bons negócios, colocaram o desembargador aposentado do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), Júlio Roberto Siqueira Cardoso na mira da PF (Polícia Federal).

RESUMO

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O desembargador aposentado do TJMS, Júlio Roberto Siqueira Cardoso, está sob investigação da Polícia Federal por suspeitas de lavagem de dinheiro relacionadas à compra de imóveis de luxo na Bahia e em Campo Grande. A operação "Ultima Ratio" resultou na apreensão de R$ 2,7 milhões em sua residência e no afastamento de cinco desembargadores do tribunal. A investigação aponta que Cardoso adquiriu uma casa na Praia de Itacimirim, declarando um valor significativamente inferior ao de mercado, o que levanta suspeitas de ocultação de parte do pagamento. Além disso, foram identificadas transferências bancárias que somam mais de R$ 1 milhão, sem registro correspondente em suas declarações de imposto de renda, o que pode indicar atividades ilícitas durante sua carreira na magistratura.

Na quinta-feira (24), a operação Ultima Ratio (último recurso) cumpriu mandado de busca contra Cardoso e apreendeu 2,7 milhões em reais e dólares na residência dele, na Capital.

A operação afastou cinco desembargadores do TJ, no maior escândalo de suspeita de corrupção no Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul. No documento enviado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), que autorizou a operação, a Polícia Federal destacou a suspeita de lavagem de dinheiro por meio da compra de imóveis de luxo, com valor abaixo de mercado e transações sem origem dos recursos. O tema já estava em apuração num inquérito da PF.

“Assim, a nosso ver, tudo indica que Júlio Cardoso tenha utilizado mais de R$ 1 milhão de origem desconhecida (R$ 556.400,00 depositados em dinheiro em espécie por Júlio Cardoso na conta bancária de [...] e boleto no valor de R$ 509.340,00 pago em agência do Bradesco em Campo Grande/MS constando que [...] seria o pagador) para a aquisição da citada casa de praia na Bahia, sendo que, diante da suspeita de venda de decisão judicial, é possível que se trate de dinheiro obtido por meio de corrupção”, informa o relatório da investigação. O depósito, realizado em 31 de outubro de 2022, tem o CPF do depositante, que corresponde ao de Cardoso.

Detalhe na fachada da casa em condomínio na Bahia. (Foto: Reprodução)
Detalhe na fachada da casa em condomínio na Bahia. (Foto: Reprodução)

A casa litorânea fica no Condomínio Quinta das Lagoas, na Praia de Itacimirim, município de Camaçari, Bahia. O documento da Polícia Federal reúne fotos do imóvel, contrato de venda e até extrato do serviço de dedetização na mansão, tendo como solicitante Júlio Roberto, com celular de Mato Grosso do Sul. O orçamento era de R$ 2.100 pelo serviço de controle de pragas e cupins.

“Coisa de primeiro mundo” - Em pesquisas na internet, a investigação encontrou anúncio de venda (sem data, podendo ser anterior a 2022) com imagens que correspondem exatamente à casa adquirida pelo desembargador.

A propaganda menciona 436 metros quadrados de área construída, cinco suítes climatizadas, piscina, área gourmet com churrasqueira, quatro vagas na garagem, além de condomínio com infraestrutura completa.

O imóvel estava à venda por R$ 1,9 milhão na internet. (Foto: Reprodução)
O imóvel estava à venda por R$ 1,9 milhão na internet. (Foto: Reprodução)

O imóvel é anunciado por R$ 1,9 milhão, mas o desembargador pagou R$ 1.483.660,00, conforme declarado na escritura. Portanto, diferença de quase meio milhão.

“Demonstrado, portanto, que Júlio Cardoso adquiriu a casa acima, em condomínio de luxo, próximo à praia, declarando em escritura o valor de R$ 1.483.660,00, por si só, é, a nosso ver, indício de ocultação de parte do valor pago, o que pode configurar crime de lavagem de dinheiro”, informa a PF.

Além disso, nos dados em nuvem do desembargador aposentado, duas imagens se repetem, mostrando o imóvel à venda por R$ 2,5 milhões. Em mensagem enviada em fevereiro de 2023, o desembargador aposentado é só elogios: “chama-se Praia de Itacimirim, Condomínio Quinta das Lagoas, coisa de primeiro mundo”.

No período de 6 de outubro de 2022 a 5 de setembro de 2023, Júlio fez nove transferências bancárias para o vendedor da casa, totalizando R$ 924.700,00. Somando o total com R$ 560 mil do depósito, chega-se ao valor de R$ 1.484.700,00. A escritura do imóvel na Bahia foi lavrada em 5 de setembro de 2023.

Casa do desembargador no condomínio de luxo Damha, em Campo Grande. (Foto: Reprodução)
Casa do desembargador no condomínio de luxo Damha, em Campo Grande. (Foto: Reprodução)

Condomínio de luxo – A Polícia Federal também aponta como relevante o valor declarado pelo desembargador aposentado pela compra de sobrado de 351,89 metros quadrados no residencial Damha. O imóvel custou R$ 1,4 milhão em 2018 e foi vendido pelo empresário Mauro Boer, também alvo da PF.

Conforme a investigação, pesquisas em fontes abertas mostram que o valor de mercado, atualmente, de uma residência nessa metragem no condomínio gira em torno de R$ 3,5 milhões a R$ 4,5 milhões. Mas, em 2017, um imóvel na mesma rua, com área construída um pouco maior (360 metros quadrados) foi anunciado para venda por R$ 2,2 milhões.  Em 2019, somente um terreno no Damha custava R$ 1,5 milhão.

“Portanto, a única dívida que Júlio Cardoso declara ter contraído em 2018 foi o empréstimo integralmente transferido para Mauro Boer no valor de R$ 450 mil, persistindo que o pagamento por ele de cerca de R$ 1 milhão na aquisição de tal casa não consta nos dados de sua declaração de imposto de renda, nem consta nos dados bancários recebidos na presente investigação”.

Ao Campo Grande News, no dia da operação, o empresário negou irregularidade. “Eu não o conheço. A única situação que existe é sobre um imóvel que eu vendi para ele [Júlio Siqueira] em 2018 e por meio de corretor. Não tive contato e só fui conhecer na finalização do negócio. Isso está tudo escriturado”.

Júlio Cardoso (ao centro do plenário) durante homenagem em 21 de maio deste ano. (Foto: Divulgação/TJMS)
Júlio Cardoso (ao centro do plenário) durante homenagem em 21 de maio deste ano. (Foto: Divulgação/TJMS)

Júlio Cardoso tem 40 anos de carreira na magistratura e se aposentou em 2024. Ele ingressou em 1984 como juiz substituto. Em abril de 2009, foi promovido a desembargador do TJMS por merecimento. Ao longo do período como desembargador, o magistrado fez parte da composição e presidiu a 5ª e 4ª Câmara Cível, além da 4ª Seção Cível. Também compôs a Seção Especial Cível e o Órgão Especial.

Nos 15 anos na Corte sul-mato-grossense, Júlio Cardoso julgou 36.180 processos e proferiu 15.827 despachos. Ao todo, participou de 1.032 sessões. O magistrado aposentado tem remuneração de R$ 57.193,47.

A PF chegou a pedir a prisão de Siqueira, mas o ministro do STJ, Francisco Falcão, indeferiu.  A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Júlio Cardoso.

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