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Capital

Moradoras da periferia relatam espancamento e tortura psicológica

No mês da mulher, violência doméstica e medo do agressor ainda são realidade

Anahi Gurgel | 12/03/2017 16:11
Moradoras da periferia relatam espancamento e tortura psicológica
Moradora da Cidade de Deus na varanda de seu barraco. "É humilhante". (Foto: André Bittar)

O caso do homem que teria ateado fogo no barraco da ex-companheira no bairro Cidade de Deus, na madrugada deste domingo (12), escancara uma triste realidade de moradoras da periferia de Campo Grande. Menos de uma semana após o Dia da Mulher, muitos relatos trazem à tona o cotidiano marcado por espancamentos e medo do agressor. 

O incêndio transformou em cinzas o que Marilene Marques Ruberdo, 27 anos, já chamou de lar, onde ela morava com três filhas, de 04, 06 e 10 anos. Ela afirma que o crime teria sido motivado pelo término do relacionamento, no mês de janeiro. Durante o namoro, que durou pouco mais de 1 ano, ela sofria agressões verbais e físicas.

“Cansei de ser xingada e de levar porrada. Ele era muito ciumento e descontrolado e ainda usuário de drogas. Uma vez me bateu com uma garrafa de plástico cheia de água. Foi horrível. Cansei disso e terminei o namoro”, lembra, olhando a fumaça que ainda saía da pequena área antes ocupada pelo barraco. No incêndio, dois cachorros da vítima foram carbonizados.

“Ele não cumpria a medida preventiva, que proibia ele de chegar a menos de 300 metros de mim. Direto ele passava em frente de casa e sempre me ligava ameaçando a mim e minhas filhas”, relata.

Moradoras da periferia relatam espancamento e tortura psicológica
Elaine e a mãe, em frente ao barraco na periferia da Capital. "Violência doméstica é comum por aqui". (Foto: André Bittar)

Medo e vergonha - A poucos metros do barraco incendiado, a desempregada Sheila Gonçalves, 56 anos, ainda sente o reflexo da agressão sofrida pelo ex-marido há menos de 1 mês.

“Ele sempre me xingou e me destratou, mas eu aguentava tudo calada, porque tinha vergonha dos outros e medo dele, que é usuário de drogas. Mesmo assim, eu sempre cuidava dele. Até que descobri uma traição. Fui no trabalho dele tirar satisfação e ele me espancou tão forte que quebrou meu óculos e trincou o osso da face”, conta mostrando o roxo e o inchaço que ainda aparecem no rosto.

“Fiquei dez anos com ele. Dói na cara e também na alma, sabe? Eu nem saía de casa porque as pessoas riam do meu machucado. Ele me destruiu, me deixou sem nada. É muito humilhante”, diz.

De acordo com Sheila, ela está sendo constantemente ameaçada pelo ex-marido, que tem 43 anos, e até pela mulher que seria a amante dele. “Ela manda mensagem dizendo que vai tacar fogo no meu barraco. Estou com medo.”, frisa.

Sheila conta com suporte de filhos e noras e, mesmo tendo medida protetiva contra o agressor, sente-se insegura e impotente. “Mas isso é normal por aqui. Acho que minha vizinha também vive isso, viu?”, desconfia.

Mais adiante, outra moradora da Cidade de Deus, Elaine Aparecida Arruda, 29, reforça que a violência doméstica é corriqueiro na região.

“Me lembro que o barraco de um senhor que morava aqui perto pegou fogo e depois fomos descobrir que tinham colocado fogo porque ele abusava de mulheres e crianças”, lembra Elaine, que é empregada doméstica. Ela acredita que grande parte das agressões é provocada por vício.

“Mais de 80% desses casos acontece porque o homem é dependente de droga ou álcool”, diz.

Violência contra a mulher no Brasil - Dois terços das denúncias de violência contra a mulher são praticadas por atuais ou ex-companheiros, cônjuges, namorados ou amantes da vítima. Entre os tipos de violência conjugal estão a violência física, psicológica, moral, sexual, patrimonial, entre outras.

Segundo o boletim da Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180 da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), de 67.962 relatos de violências, 67,63% aconteceram em um relacionamento heterossexual. Em 41% dos casos, a relação durava há mais de 10 anos, e em 39,34%, a violência é diária.

A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) é bastante conhecida por tratar de casos de agressão física entre cônjuges, mas o texto também identifica como violência doméstica o sofrimento psicológico, como o isolamento da mulher, o constrangimento, a vigilância constante e o insulto, entre outros comportamentos agressivos e machistas.

 

 

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