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Comportamento

Depois de aposentar das viagens a trabalho, ele virou turista pelos livros

Paula Maciulevicius | 24/10/2013 07:17
Mais uma das figuras da cidade. Depois de se aposentar, Idelfonso trocou viajar pelo trabalho pelas excursões aos livros. (Fotos: Cleber Gellio)
Mais uma das figuras da cidade. Depois de se aposentar, Idelfonso trocou viajar pelo trabalho pelas excursões aos livros. (Fotos: Cleber Gellio)

Há 8 anos as viagens à trabalho deram lugar às excursões pelas palavras. Idelfonso Silva Neto rejuvenesceu usando um antirrugas que ninguém mensura preço. É graças às páginas dos livros que ele não parece ter 71 anos. Depois da aposentadoria na carreira que o levou Brasil afora, ele passa os dias de olho nas estantes do maior sebo de Campo Grande.

“Precisava me aposentar e ter ainda um certo investimento. É que depois de certa idade, não se tem dinheiro suficiente para viajar. Então eu viajo pelos livros”.

Pronto. Está apresentado o melhor vendedor de livros da cidade. Só neste ano, ele já leu 137. Ano passado foram 281. Seja no trabalho, na segunda loja Maciel, na rua 14 de Julho, ou em casa, os olhos se dividem entre a vida real e o mundo onde o passaporte são as palavras e ninguém precisa de malas.

Nascido no Rio de Janeiro, ele explica que foi criado em Presidente Prudente e por conta da estrada de ferro, era bem mais fácil adquirir cultura lá do que em Campo Grande. A profissão é na área de técnico de eletrônicos e Enfermagem. Trabalhos que levaram ele a conhecer a América Latina, Estados Unidos, Europa e até morar na África por uma empresa terceirizada da Ericsson.

Para Campo Grande voltou em 1998, cheio de vida e história para contar. Daqui do País ele também conhece do Rio Grande ao Amazonas. “Você tem a opção de viajar ou ganhar dinheiro. Tem gente que está com 50 anos trabalhando, mas você acha que com 50 vai subir para Machu Pichu? Tem que aproveitar o tempo que você tem”.

A filosofia parece não ter sido aprendida nos livros. Vem da vivência mesmo. De quem “olha nos olhos da mulher amada e vê beleza”, solta em meio à entrevista. Apaixonado, está casado com a terceira esposa há mais de uma década. E jura que a frase não vem de escritor não. É de autoria própria.

Quem quiser uma boa dica e um papo de se perder na hora, é só aparecer na segunda loja Maciel, na rua 14 de Julho que vê seo Idelfonso como psicólogo e até mesmo dando uma de 'vendedor'.
Quem quiser uma boa dica e um papo de se perder na hora, é só aparecer na segunda loja Maciel, na rua 14 de Julho que vê seo Idelfonso como psicólogo e até mesmo dando uma de 'vendedor'.

“Sou meio filósofo, livre pensador. Vi milagres, mas a religião em si, é excludente. Como você vai acreditar que Deus criou a humanidade e só uma parte dela vai ser privilegiada? Milagres acontecem quando se tem fé, esperança e caridade”, desabafa.

Na hora de vender ele fala que não vai no ‘automático’, mas trata de assessorar o cliente da melhor maneira possível. O resultado é que para cada título ele sabe quantas e qual foi a melhor edição da obra. “Às vezes a pessoa fala quero a Arte da Guerra, mas tem 13 livros, qual você prefere? A obra Divina Comédia, por exemplo, da editora 34 é a melhor. Conheço, eu li o livro”, argumenta.

No ano passado depois de contrair H1N1, Idelfonso perdeu 70% da audição e nem por isso precisa que falem mais alto. Talvez até por respeito ao local, que longe de ser biblioteca, também é o templo de quem ‘namora’ livros.

Na vida ele ensina que existem três coisas infinitas. Seja lá de qual autor venha a teoria, está mais do que certa. “Deus, amor e o cérebro humano. Eu procuro estudar o ser humano e ele a mim. Ser sujeito e objeto, isso evita o Alzheimer, o Parkinson”, resume.

Para provar que tem os 71 anos bem vividos que, pelo menos no rosto está estampado, o vendedor se dobra para trás, encostando as mãos nos pés. Flexibilidade de quem sempre teve jogo de cintura para lidar com qualquer situação, ou seria algo que aprendeu nos livros?

Independentemente da resposta, os 137 livros lidos só neste ano podem se multiplicar segundo as contas de Idelfonso. É que para ele, ler é conceituar o livro. E não se pode ser leitor primário.

“Você só leu uma vez? Então você não leu o livro. Tem que ler no mínimo três e no máximo cinco. Assim se muda o modo e depois evolui”.

Quem quiser uma boa dica e um papo de se perder na hora, é só aparecer na segunda loja Maciel, na rua 14 de Julho. Na verdade elas são uma ao lado da outra, com entradas diferentes. No entanto, o expediente do Idelfonso é das 9h30 até 18h30, com 1h de almoço a partir das 10h30.

“A gente aqui é psicólogo e inclusive vendedor. A livraria é meio mercado persa. Tem PHD, tem drogado, tem mãe que vem chorar pelo filho. É aquilo que falei, você é o sujeito e objeto de pesquisa nesse sentido de você trocar cultura. Isso me dá felicidade, procurar o melhor a você, porque dinheiro, dinheiro só vai até certo ponto, depois disso não”. Sábias palavras de um leitor assíduo no sebo da cidade.

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