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Interatividade tem idade?

Por Pedro Panhoca da Silva e Camila Lourenço Panhoca (*) | 07/10/2017 11:40

Na Alemanha as editoras por vezes têm um problema quanto ao direcionamento de livros infanto-juvenis. Muitas vezes eles acabam ganhando capas que os tornam mais atrativos ao público infantil e afastam o público original por achá-los fúteis ou “pouco evoluídos” para suas pretensões. Mas será que ambos os públicos saem perdendo?

Cada vez mais o jovem leitor busca livros que lhe faz sonhar, viajar e se emocionar – e sempre foi assim. Mas nem por isso escritores da garotada precisam inventar e reinventar fórmulas e narrativas para rapidamente serem mimetizados e, logo, descartados.

Narrativas não-lineares (nas quais o autor é também o personagem principal e, literalmente, faz das suas escolham as dele) podem ser uma boa opção para tal. Sucesso nas décadas de 70 e 80, esses livros interativos conheceram um irmão chamado livro-jogo, narrativas interativas que acrescentavam elementos de RPG a ele, como dados e cálculos para se determinar o sucesso de algumas escolhas. Mas a essência era a mesma: mostrar ao jovem que ele não é só mero leitor, e sim dá sentido à narrativa, à existência do livro, e o mantém vivo através dessa interação livro-leitor. As ficções interativas podem ser o ponto máximo dessa metáfora, pois o leitor realmente é o herói do enredo.

Ao contrário da opinião de muitos que veem o livro como algo desinteressante e superado, que jovem só gosta de videogame e internet, ao apresentar o livro certo para a criança certa a mágica acontece. A grande mídia parece separar os jovens em times diferentes, quando a vantagem da cultura é poder usufruir de tudo o que ela oferece, poder se encaixar em vários grupos de interesses em comum. Crianças do 1º ano do Ensino Fundamental estão em plena evolução de escrita e leitura, e vêm da Educação Infantil com uma grande apreciação por histórias e livros infantis, hábito ainda mais espontâneo quando cultivado também pela família. Engana-se quem pensa que esse interesse se dá apenas pelos contos de fadas tão conhecidos no papel como nos cinemas. As crianças encantam-se com lendas folclóricas, conseguindo diferenciar o que pode ser real e o que não pode, divertem-se com as aventuras e malandragem de Pedro Malasartes, adoram as brincadeiras de rimas e jogos de palavras de Eva Furnari na coleção “Não cofunda!”, percebem-se leitores com os livros de Sonia Junqueira, os quais possuem indicações de dificuldades ortográficas para cada tipo de leitor iniciante. Imagina o choque positivo que uma leitura não sequencial pode causar neles?

As crianças enxergam nos livros exemplos do que seguir ou não, conseguindo refletir sobre diversos aspectos da vida, família, convivência. Ruth Rocha é um dos grandes nomes com os quais a leitura faz intertextualidade com o que os pequenos vivenciam, aliando graça e seriedade aos temas escolhidos, como por exemplo “O reizinho mandão”, o qual aborda a questão da convivência, da educação, do respeito e amizade, “Menina bonita do laço de fita”, que traz para a roda de discussões a diversidade cultural, de maneira leve e encantadora. As histórias permitem que emoções sejam reveladas e despertadas. E deixá-los recontar é uma outra deliciosa atividade de leitura e interatividade, seja pela compreensão do que leram, seja pela leitura das ilustrações do livro escolhido, dando espaço para a criatividade e sua leitura de mundo. Portanto, mesmo com leitura linear é possível haver interação.

Já os fãs de RPG se surpreendem como um livro pode ser também jogo, narrador e portal para um mundo novo. Não é difícil ver jovens em contato hipnótico com livros-jogos (quando o tem, já que nosso mercado editorial para isso depende praticamente de uma editora só) a partir do momento que o conhecem. Experiências em salas de aula vêm sendo feitas desde o final da década de 90 e, pela onda de nostalgia recente, tudo voltou a fluir: novidades, reedições, leitura, interação, divulgação e o ciclo desse consumo saudável girando um pouco mais a cada boa experiência de todos.

Não se trata de um abandono do novo pelo velho, e sim seguir dois caminhos que muito podem se beneficiar: a imaginação estimula a prática e vice-versa. Diferente da ficção interativa e do livro-jogo, na vida o jovem pode ir da página 1 para a página 38 e 67 ao mesmo tempo.

(*) Pedro Panhoca da Silva é mestrando em Literatura do programa de Pós-Graduação em Letras da UNESP – campus de Assis.

(*) Camila Lourenço Panhoca é graduada em Letras pela UNESP – campus de Assis, Pedagogia pelo Centro Universitário Claretiano (CEUCLAR), especialista em Educação Infantil e Alfabetização pelo CEUCLAR e professora do Ensino Fundamental I do Colégio Antares em Americana/SP.

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