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Terremoto: a energia incontrolável

Por Alberto Veloso (*) | 05/06/2015 10:26

Quase todos os terremotos são produtos do deslocamento das placas tectônicas e o que ocorreu no Nepal não fugiu a regra. A sismicidade em torno dos Himalaias está inserida em um contexto maior, envolvendo as placas Africana e Arábica, que, junto com a Indiana, também colidem com a Eurasiana para formar a faixa sísmica Alpino-Himalaia, a segunda mais ativa do mundo.

Estendendo-se do sul da Europa/norte da África, até as Filipinas, ela passa por países com históricos de terremotos fatais como o de Lisboa, em 1755, com magnitude (M) estimada 8.5-9.0, que matou cerca de 40 mil pessoas, ou o recente, em Sichuan, China, em 2008, com M7.9, que ceifou 70 mil vidas.

O sismo de 25 de abril, com M7.8 e a menos de 80 km da capital Kathmandu, teve efeitos devastadores, que resultaram não apenas da elevada magnitude, como da profundidade rasa, apenas 10 km, e com epicentro muito próximo de duas cidades populosas e com construções frágeis.

Quase instantaneamente, o sismo liberou uma enorme quantidade de energia, na forma de ondas sísmicas, que mexeram violentamente com o chão à medida que se deslocavam em alta velocidade. É como se a natureza, num repente, descarregasse a energia equivalente a 500 bombas de Hiroshima, ou a totalidade da produção de dois meses da hidrelétrica de Itaipu. Como resistir a tudo isto? Somente edificações construídas para suportar altas acelerações do terreno tendem a ficar de pé. De outra forma, caem como se de papel fossem.

Para piorar, o terremoto chacoalhou as encostas íngremes das montanhas ocasionando escorregamentos de terra e avalanches de neve, matando pessoas, destruindo e bloqueando acessos para levar socorro aos locais isolados. Se hoje a situação é difícil, amanhã também será, pois a recuperação de um país pouco desenvolvido é mais custosa, lenta e totalmente dependente de recursos externos. Por tratar-se de um processo longo, não é incomum que promessas feitas no calor do desastre não sejam cumpridas e caiam no esquecimento.

Recentemente, sismólogos franceses chamaram a atenção das autoridades nepalesas sobre a possibilidade de um forte tremor atingir o país, pois suas pesquisas mostravam a repetição de sismos fortes na região, a cada 80 anos, aproximadamente. Não se tratou de previsão sísmica, mas de um alerta importante que não costuma surtir efeitos em países com parcos recursos econômicos e com problemas sociais de toda ordem. Situação parecida aconteceu no Haiti, pouco antes do terremoto de M7 quase aplainar a capital do país e provocar o espantoso número de mais de 200 mil mortos, em janeiro de 2010.

Como os terremotos não podem ser previstos, resta preparar as cidades e os seus cidadãos para enfrentá-los. Isso exige conhecimentos diferenciados e maciços investimentos para planificar as cidades, reforçar edifícios antigos, construir os novos com códigos antissísmicos e treinar as pessoas para situações de emergência.

Istambul, São Francisco, Tóquio estão na lista de prováveis candidatas a sofrerem terremotos fortes, em um tempo não tão distante. Espera-se que estejam preparadas para evitar numerosas vítimas, pois é para isto que se planeja e se exercita a cultura da prevenção a desastres de qualquer natureza.

É totalmente certo que as placas tectônicas seguirão em movimento e os terremotos acontecendo. Mas não se sabe quando, nem onde e de que tamanho será o próximo sismo. Não existindo preparação adequada, outros episódios como o do Nepal continuarão chocando o mundo.

(*) Alberto Veloso é geólogo, ex-chefe do Observatório Sismológico da UnB e autor do livro "O terremoto que mexeu com o Brasil".

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