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Você é estagiário ou empregado?

Por Bruna Colagiovanni Girotto Fernandes (*) | 17/10/2013 14:28

Ao ler este questionamento, quem estagia fora da área do Direito pode responder: as duas coisas. Mas, para o mundo jurídico, estagiário e empregado têm características distintas. E é isso que procurarei abordar neste artigo. Ao terminar esta leitura, você saberá se é, para a lei, estagiário ou empregado, o que isso implica na prática e qual é o posicionamento da justiça trabalhista.

A função de estagiário não é nova. Em 1977, quando o Brasil era presidido por Ernesto Geisel, a Lei nº 6.494 entrou em vigor. Ela foi criada para dispor "sobre os estágios de estudantes de estabelecimentos de ensino superior e ensino profissionalizante do 2º Grau e Supletivo".

O estágio, segundo previa a lei, somente se verificava em unidades que tivessem condições de proporcionar experiência prática na linha de formação, devendo, o estudante, para esse fim, estar em condições de estagiar.

E essas "condições de estagiar" deveriam estar dispostas no texto de um Decreto criado em 1982, que tinha o objetivo de regulamentar a matéria. Ocorre que a norma não acrescentou tais condições e, ainda, em seu art. 4º, transferiu às instituições de ensino a responsabilidade de regulamentar à matéria contida no Decreto.

Os alunos especiais foram esquecidos pelos legisladores até a edição da Lei nº 8.859/1994. A partir de então, a norma passou a estender aos alunos de ensino especial o direito à participação em atividades de estágio.

E, após mais de três décadas da criação da Lei do Estágio, surgiu a Lei nº 11.788 em 25 de setembro de 2008. Ela fez aniversário no último mês de setembro: cinco anos de existência já. A questão é saber se, para comemorar este aniversário, a lei está sendo aplicada ou não.

Utilizando-se o conceito dessa norma, "estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos".

Estágio não cria relação de emprego. Estagiário não é empregado. A relação jurídica não será empregatícia em virtude dos objetivos educacionais do pacto instituído e desde que sejam obedecidos três requisitos.

Primeiro requisito: o educando deve estar matriculado e frequentando, regularmente, um curso de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e nos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos e atestados pela instituição de ensino.

Segundo requisito: deve haver a celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino.

Terceiro requisito: deve haver compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas previstas no termo de compromisso.

O legislador, no §2º do art. 3º da lei, atentou que “o descumprimento de qualquer dos incisos deste artigo ou de qualquer obrigação contida no termo de compromisso caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação trabalhista e previdenciária".

Caracterizar vínculo de emprego significa que o educando não será mais considerado estagiário. Ao invés de obedecer à Lei dos Estágios, ele terá todos os direitos e benefícios inerentes a um empregado e seu contrato será regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O jurista Maurício Godinho Delgado expôs acerca da matéria: “O estágio, portanto, tem de ser correto, harmônico ao objetivo educacional que presidiu sua criação pelo Direito: sendo incorreto, irregular, trata-se de simples relação empregatícia dissimulada. A correção e a regularidade do estágio são dadas pela ordem jurídica através de dois tipos de requisitos jurídicos: os formais e os materiais” (in Curso de Direito do Trabalho, 7ª edição, São Paulo: LTr, 2008, pag. 324).

Conforme recente jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a ausência de um dos requisitos jurídicos autoriza a conclusão de que houve o desvirtuamento do contrato de estágio, e assim, o que há, efetivamente, é uma relação empregatícia entre as partes:

“(...) resultou constatado o desvirtuamento do contrato de estágio na hipótese dos autos, visto que o reclamado não demonstrou o preenchimento dos requisitos necessários à validade de contrato de estágio, restando demonstrado que o reclamante não se submetia ‘a regular e permanente acompanhamento ou supervisão em seu trabalho pelo supervisor pedagógico da instituição o ensino, tampouco se ativava em atividades condizentes com a diretriz curricular da cadeira acadêmica que escolheu’. Incidência da Súmula n.º 126 do Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de instrumento não provido. (...)”. (TST-ARR-1282-53.2011.5.10.0012, 1ª Turma, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, DEJT 21/06/2013)
Agora você consegue responder a pergunta feita no título deste artigo?

(*) Bruna Colagiovanni Girotto Fernandes é advogada, especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet) e pós-graduanda em Direito do Trabalho pela Universidade Norte do Paraná (Unopar). Contato: brunagirotto@gmail.com.

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