ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, QUINTA  18    CAMPO GRANDE 27º

Comportamento

Como terapia, tetraplégico ensina a tocar cavaquinho, muitas vezes até de graça

Adriano Fernandes | 20/01/2016 06:34
O sorriso no rosto expressa a felicidade de quem, mesmo com limitações, deu a volta por cima para provar que é capaz.(Foto: Gerson Walber)
O sorriso no rosto expressa a felicidade de quem, mesmo com limitações, deu a volta por cima para provar que é capaz.(Foto: Gerson Walber)

O samba sempre esteve presente na vida do músico Luiz Freire Thomaz, de 45 anos, o Luizinho. Quando criança ele aprendeu com o pai, Lino Thomaz, os primeiros acordes no cavaquinho. Cresceu ouvindo clássicos do gênero nas rodas de samba junto de seu Lino, que foi também quem o inspirou desde cedo e fez nascer o desejo de ser um grande instrumentista.

Até que no início do ano de 1991, houve um acidente de carro e por consequência, a tetraplegia aos 20 anos de idade. Mas nem as limitações foram suficientes para que Luizinho deixasse de lado a vocação que veio de berço. O acidente despertou nele o desejo de ensinar, mesmo em uma cadeira de rodas e com os movimentos dos braços limitados.

Além das instrumentais, Luizinho deu aulas de reforço escolar de física e até química. (Foto: Gerson Walber)
Além das instrumentais, Luizinho deu aulas de reforço escolar de física e até química. (Foto: Gerson Walber)

Falante e de sorriso largo, as histórias de Luizinho estão longe de ser a de uma vida marcada pelos traumas de uma tragédia. Ele relembra que o acidente ocorreu durante o retorno de uma viagem ao Recife, depois que um amigo dormiu ao volante.

Com a colisão Luizinho fraturou duas vértebras e perdeu todos os movimentos do pescoço para baixo. Naquela época, ele era estudante de Direito e estava quase completando os 21 anos de idade.

“É claro que eu passei por um momento em que eu entrei em choque. Eu era muito jovem e tive que aceitar que não só meu corpo e minhas necessidades físicas e fisiológicas iam mudar. Mas eu também sonhava quase que diariamente, que ia ser um grande artista”, comenta.

O desespero nunca o dominou e o segredo, ele relata com orgulho. “Superei tudo o que passei com o apoio da família, dos amigos e principalmente: de Deus”, diz sorridente. E tanta força de vontade fez o tratamento progredir de forma positiva com o passar dos anos.

As fisioterapias fizeram com que Luizinho recuperasse, mesmo que de forma limitada a movimentação dos braços. Conquistas que já foram suficientes para que ele decidisse retornar a uma vida mais ativa. Em 1998 Luizinho retomou a faculdade de Direito, que manteve até a formatura com o dinheiro arrecadado nas aulas particulares de cavaco-banjo e cavaquinho, que passou a ensinar.

Além das aulas de música, até reforço escolar de matemática e química ele deu. “Eu sempre fui muito ativo e de certa forma minha deficiência contribuiu para que eu pudesse entender que eu podia dar aulas, mesmo com certas limitações”, conta.

Como Luizinho não tem o movimento dos dedos, nas aulas do instrumento ele ensina a parte teórica, instrui e aponta os arranjos e acordes para os alunos. O ritmo das melodias ele acompanha na percussão e o que antes era uma forma de complementar a renda, ele decidiu dar continuidade mesmo depois da conclusão do curso.

A cadeira de rodas nunca impediu que Luizinho se dedicasse ao samba. (Foto: Gerson Walber)
A cadeira de rodas nunca impediu que Luizinho se dedicasse ao samba. (Foto: Gerson Walber)

Luizinho conciliou as aulas com o trabalho de advogado por quase dez anos, quando em 2011 deixou de lado a carreira jurídica para dedicar mais tempo a mãe, diagnosticada com Alzheimer. O pai, o senhor Lino, um dos fundadores do Operário Futebol Clube, morreu em 2014, aos 108 anos.

As aulas são ministradas por ele em sua residência, atualmente no Jardim Pênfigo, duas vezes por semana e são para todas as idades. Mas que uma ocupação ou trabalho, Luizinho conta que fez da música e de suas aulas parte do tratamento contra a paralisia.

“A grande maioria dos meus alunos é carente e de alguns deles, eu nem cobrava. Exigia apenas um boletim, um bom desempenho escolar. Talvez eu também precise deles algum dia. Funciona como uma terapia para mim”, diz. Ele também integra o grupo Dom Brasileiro que tem como objetivo, popularizar ainda mais o samba de raiz pela cidade.

Noivo da técnica de enfermagem Gicele Moraes, o casamento é um dos planos para o futuro. “Todos acham que eu a conheci num leito de hospital, mas não foi. Foi no samba”, ele ri. A despedida da entrevista serviu de lição.

“As minhas dificuldades não são uma justificativa de que eu não consiga fazer algo. Muito pelo contrário. São dessas limitações que eu tirei a motivação pra mostrar que as barreiras estão aá pra serem quebradas e que eu posso sim superá-las, independente da minha situação”, conclui.

Interessados nas aulas, podem procurar o Luizinho pelo 9107-3343.

Curta a página do Lado no Facebook.

Nos siga no Google Notícias