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Comportamento

Corumbaense de coração, há 70 anos argentino vende de tudo na Casa Katurchi

Paula Maciulevicius | 24/02/2015 06:45
Jorge José que chegou a Corumbá de navio, aos 6 anos de idade. (Foto: Marcos Ermínio)
Jorge José que chegou a Corumbá de navio, aos 6 anos de idade. (Foto: Marcos Ermínio)

Bairrista mesmo, filho de sírio e nascido na Argentina, os olhos apaixonados com que ele vê a Cidade Branca são os mesmos do menino Jorge José que chegou a Corumbá de navio, aos 6 anos de idade. Ainda pequeno, o pai já aguardava a família no cais e a lembrança que ficou não foi nem do abraço paterno, mas dos animais à beira do rio, no Pantanal.

Numa visita a Corumbá, a gente que é de fora se pergunta quem são os personagens que contam a história da cidade. Há 80 anos uma das famílias é a Katurchi, seu José e dona Amélia, que estabeleceram comércio, vida e trabalho ainda nos tempos de ouro da região, em 1932.

Batemos à porta de um antigo escritório, no cruzamento das ruas Frei Mariano e Dom Aquino Corrêa. Os dizeres da fachada já anunciam que ali encontraríamos o menino apaixonado, Jorge José Katurchi, hoje com 88 anos. Ao entramos, ele pede um pouco mais de tempo, precisa fechar o caixa que não está batendo. A mesa do escritório tem um telefone ainda do passado, calculadora e a mente de seu Katurchi a contabilizar.

Ainda pequeno, a lembrança que ficou foi dos animais à beira do rio. (Foto: Marcos Ermínio)
Ainda pequeno, a lembrança que ficou foi dos animais à beira do rio. (Foto: Marcos Ermínio)

Ele pede que a gente então se sente para ouvi-lo, mas de antemão avisa que não gosta de falar de si. Modesto, porque tem grande responsabilidade pela história que a Cidade Branca protagonizou. Já teve vários títulos e posições, só não ocupou cadeiras políticas - como ele mesmo diz - porque não quis.

"Corumbá, em outras épocas, foi importante, tinha o maior terceiro porto fluvial do Brasil, mas isso há anos atrás", diz como quem quer apresentar uma velha Corumbá. Nascido na Argentina, filho de um imigrante sírio, até os 18 anos de idade ele torceu para times argentinos, mas quando teve de fazer o serviço militar é que quis consolidar o coração corumbaense. Foi até a cidade natal, mas conseguiu ser dispensado.

"Eu sou bairrista mesmo, eu sinto um amor que você não tem ideia". Quando pedimos a ele que então descreva, seu Katurchi busca na memória o que despertou tanta paixão. "Nós chegamos de navio, eu tinha 5 anos de idade e eu nunca me esqueço, meu pai estava ns esperando no cais do porto. Aqui era terra prometida, ele saiu da Síria, foi para a Argentina e veio para cá. Minha primeira impressão que me atraiu muito, aquela maravilha, o Pantanal e principalmente o calor humano que é o corumbaense, você não me leve a mal...", brinca. Ele se desculpa por dar a entender que perto de Corumbá, o campo-grandense não tenha a mesma receptividade e ele está certo, mais uma vez.

Na memória e na gaveta, a passagem da primeira viagem do Trem do Pantanal. (Foto: Marcos Ermínio)
Na memória e na gaveta, a passagem da primeira viagem do Trem do Pantanal. (Foto: Marcos Ermínio)

A descrição não para durante toda a conversa: a natureza, o cenário, os animais na beira do rio... "Terminamos fazendo grandes amizades aqui que não cabe a mim citar. Criamos um amor muito grande pela cidade, meu pai tinha comércio na parte alta, trouxe o primeiro supermercado de Corumbá e nós fomos o mais antigo distribuidor de fermente Fleischmann do Brasil", conta.

Há sete décadas, a Casa Katurchi ocupa exatamente as esquinas do Centro onde está o escritório. O local já vendeu de tudo: milho, feijão, galinha, "a melhor laranja do mundo". De cereais a arames farpados, passando eletrodomésticos.

Corumbá devolveu o amor que seu Katurchi sentia pela cidade. "Eu vi minha mulher pela primeira vez no Porto de Corumbá. O andar mais bonito do mundo, é nessa que eu vou, eu vou casar com ela". E casou.

Nas memórias, além da vida inteira vivida ali, o bilhete do primeiro Trem do Pantanal ainda segue intacto na gaveta, ele apanhou sem destino, apenas para fazer e ser história. Ao final da entrevista, se lembra de mudar as folhinhas que carregam data e dizeres de inspiração e não é que o virar da página resume o que ele tem a dizer? "Cada pessoa cria seu próprio destino". E ele criou ali, em Corumbá.

Precursores de tudo, dona Amélia e seu José Katurchi, pais de Jorge. (Foto: Marcos Ermínio)
Precursores de tudo, dona Amélia e seu José Katurchi, pais de Jorge. (Foto: Marcos Ermínio)
Dizeres da porta anunciam que ali encontraríamos o menino apaixonado. (Foto: Marcos Ermínio)
Dizeres da porta anunciam que ali encontraríamos o menino apaixonado. (Foto: Marcos Ermínio)
Nas paredes de escritório, as fotos e recortes de jornais que contam o passado. (Foto: Marcos Ermínio)
Nas paredes de escritório, as fotos e recortes de jornais que contam o passado. (Foto: Marcos Ermínio)
A folhinha que marca o dia bem como a frase de inspiração. (Foto: Marcos Ermínio)
A folhinha que marca o dia bem como a frase de inspiração. (Foto: Marcos Ermínio)
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