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Comportamento

Há 20 anos, Josi acorda cedo e pedala 14 quadras para regar plantas em praça

Ela já plantou mais de 20 árvores na Praça do Panamá e afirma que cuida do local onde se curou da depressão

Alana Portela | 28/08/2019 08:00
Em sua bicicleta, Josi carrega as garrafas com água (Foto: Alana Portela)
Em sua bicicleta, Josi carrega as garrafas com água (Foto: Alana Portela)

Atitude é tudo, e isso não falta em Josi Garcia. Ela acorda cedo todos os dias para estar às 7h30 na Praça do Panamá, em Campo Grande. Na garupa da bicicleta, coloca cerca de 30 litros de água em 10 garrafas pet. Depois, pedala 14 quadras até chegar no local. Alí, rega as plantas.

“Amo este local, é minha terapia. Cuido da praça assim como faço na minha casa. De segunda a segunda venho aqui, isso já ocorre há mais de 20 anos. Fui eu quem plantei todas essas árvores na praça”, disse. Josi mora na Vila Palmira, mas já é conhecida pelos moradores do Panamá. “Muitos me veem cuidando, plantando. Vez ou outra, ajudam”.

Diferente dos reclamões, ela não gosta de desculpa, e ai de quem atrapalhe o seu serviço. “Sou eu quem estou fazendo; e respondo mesmo”, disse. Já plantou mais de 20 árvores desde que começou a cuidar do local. “O primeiro que plantei foi um pé de embaúba. Quando cresceu os tucanos desceram para comer as frutas. É muito lindo”.

Josi jogando água na planta (Foto: Alana Portela)
Josi jogando água na planta (Foto: Alana Portela)
Com a garrafa na mão, Josi falou que molha as plantas todos os dias (Foto: Alana Portela)
Com a garrafa na mão, Josi falou que molha as plantas todos os dias (Foto: Alana Portela)

Entre as espécies que plantou, estão o caju vermelho, banana, coco, jamelão, guariroba, goiaba, e ingá. Boa parte ainda está na fase de desenvolvimento, porém a falta de água atrapalha o crescimento. “Todos os dias faço três viagens, minha conta de água até aumentou. Mas o que jogo é pouco. Preciso que voltem a disponibilizar a água aqui, pois sem ela não há vida”, declarou.

Antigamente, a praça disponibilizava água. Contudo, há cerca de cinco anos isso parou. “Deixavam a torneira ligada. Conversei com um amigo que morava aqui em frente, ele pagou R$ 200,00 para fazerem um cercado de ferro e proteger o registro. Comprei cadeado e coloquei uma corrente grossa. Porém, os vândalos quebraram tudo. Hoje estamos sem água”, lamentou.

Para evitar que as espécies morram, ela uniu algumas plantas. “Coloquei duas juntas, assim a maior sustenta a menor. Me ensinaram essa técnica”, disse.

Coruja na árvore (Foto: Alana Portela)
Coruja na árvore (Foto: Alana Portela)
Placa colocada no poste por Josi (Foto: Alana Portela)
Placa colocada no poste por Josi (Foto: Alana Portela)
Cercado de ferro que protegia o registro de água da praça (Foto: Alana Portela)
Cercado de ferro que protegia o registro de água da praça (Foto: Alana Portela)

A praça fica entre as ruas Jerusalém e Náutico, e existe há cerca de 30 anos. Ao centro, fica uma figueira com mais de dez metros de altura. Sob ela, alguns bancos para os visitantes se acomodarem, mas também depredados. É um local geralmente usado para lazer das famílias, porém a falta de cuidados prejudicou o espaço. “Meu pedido é que coloquem guardas para que não depredem ainda mais”.

Contra os vândalos que depredam o local, ela acredita que tem a solução. “Se colocassem uma academia ao ar livre, em baixo da sombra da figueira, afastariam os vândalos. Essa é minha vontade”.

Terapia - Estar na praça virou terapia após ela passar por uma crise forte de depressão. “Tive uns problemas familiares. Nada mais parecia ter sentido, ficava sem banho por 15 dias, não cuidava mais da minha casa. Pensava besteira. Foi aí que uma amiga, durante um culto na igreja, sugeriu que eu fizesse um passeio nesse local. Foi um milagre, vi os pássaros voando, as árvores, e quis plantar mais”, relatou.

Quando a vida parecia sem propósito, ela enxergou um novo motivo para continuar lutando. Foi para casa, pegou algumas mudas e plantou, mesmo sem nunca ter feito nenhum curso de especialização. Naquela época, a praça ainda tinha água disponível o que facilitou na hora de regar. “Fiz alguns buracos, para que a água pare quando houver chuva e assim ter água para as plantas”.

Na praça, várias plantas estão em fase de crescimento. (Foto: Alana Portela)
Na praça, várias plantas estão em fase de crescimento. (Foto: Alana Portela)
Carlos de Oliveira de camiseta branca e Amarildo Lopes, carregando baldes de água para ajudar Josi na praça (Foto: Alana Portela)
Carlos de Oliveira de camiseta branca e Amarildo Lopes, carregando baldes de água para ajudar Josi na praça (Foto: Alana Portela)

Dia após dia, Josi aumentava o contato com a natureza e sentia-se mais leve. Com as plantas, mais pássaros começaram a visitar o local. “É pardal, pombo, tucano, João de barro, etc. Comecei a comprar os alpistes com meu dinheiro e trouxe para cuidá-los”.

Até as corujas fazem ninho na praça, e para protegê-las, Josi colocou duas placas, uma na árvore e outra em um poste de luz, escritas “Casa das Coruja. Respeite”. “Converso com as aves, não sentem medo de mim”, relatou.

Ela é autônoma, trabalha revendendo produtos de beleza e fazendo faxinas. O pouco dinheiro que ganha, usa para pagar as despesas de casa, mas tira também para praça. “Minha conta de água aumentou um pouco depois que passei a trazer pra cá. Compro até veneno para formiga para não matarem as árvores”.

Além de cuidar, ela também aproveita o local para fazer a sua caminhada. “Faço meus alongamentos e depois dou de dez a 15 voltas na quadra”. Josi afirmou ter fibromialgia. “É terrível, mas não fico parada porque é pior”.

Ao redor do pé de figueira estão jogadas algumas garrafas de cerveja (Foto: Alana Portela)
Ao redor do pé de figueira estão jogadas algumas garrafas de cerveja (Foto: Alana Portela)
Penas dos pássaros que foram envenenados na semana passada (Foto: Alana Portela)
Penas dos pássaros que foram envenenados na semana passada (Foto: Alana Portela)
Josi molhando a planta (Foto: Alana Portela)
Josi molhando a planta (Foto: Alana Portela)

Susto - Ela contou que todos os moradores do bairro já estão acostumados com sua presença. No entanto, uma pessoa que chegou recentemente na região não aceitava a atitude de alimentar os pássaros. “Mandou eu parar porque não queria. Não me importei e continuei. Isso já tem alguns meses”, disse.

Na semana passada, dia 23, quando chegou na praça pela manhã avistou uma cena terrível. “Envenenaram todos. Virou a ‘Praça do Cemitério’. Aquilo me causou tristeza, fiquei dois dias sem aparecer aqui”, falou. Mais de 50 aves foram mortas.

Por enquanto, Josi está dando uma pausa nos cuidados com os pássaros, para evitar mais tragédias com os bichinhos. “Foi uma orientação da própria Polícia Militar Ambiental”. 

Amarildo Lopes mora em frente à praça (Foto: Alana Portela)
Amarildo Lopes mora em frente à praça (Foto: Alana Portela)
Joaquim Lopes de Macedo vai todos os dias caminhar no local (Foto: Alana Portela)
Joaquim Lopes de Macedo vai todos os dias caminhar no local (Foto: Alana Portela)

Conhecidos - O trabalho de Josi é reconhecido pelos moradores do bairro. Para Amarildo Lopes que tem uma casa em frente a praça há mais de dez anos, os cuidados são necessários. "Sou comerciante e conheço ela desde que me mudei pra cá. Sempre que posso, tento ajudá-la a cuidar. Aqui é onde minha esposa vem para fazer os exercícios funcionais com outras mulheres, é um espaço importante", afirmou.

O aposentado, Joaquim Lopes de Macedo, 72 anos também frequenta o local. "Venho sempre para caminhar. Tinha problema na perna direito, depois que passei a dar voltas nessa quadra melhorei. Me tornei amigo da Josi, até faço companhia a ela enquanto está aqui", falou. Enquanto estão no espaço público, um distrai o outro "jogando" conversa fora. 

O militar aposentado, Carlos de Oliveira, 56 anos, mora no bairro há 30 anos. "Fiz minha casa em frente a praça. Depois que a Josi plantou as árvores aumentou o número de pássarinhos. Se tornou parte do local, os frutos atraem as aves. Muitos frequentam esse lugar. Embeleza nossa paisagem e só está dessa forma porque ela se dedica", destacou. 

Após verem Josi na praça, Amarildo e Carlos levaram quatro baldes com água para ajudar a molhar as plantas.

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A praça do Panamá tem várias plantas e uma figueira ao centro do local (Foto: Alana Portela)
A praça do Panamá tem várias plantas e uma figueira ao centro do local (Foto: Alana Portela)

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