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Comportamento

Indesejada até na cadeia, Solange viveu 20 anos como Katita da Barão

Condenada por roubo, falsidade ideológica e tráfico de drogas, ela garante que renasceu e história será livro

Aletheya Alves | 09/08/2022 06:45
Solange conta sobre como sua história é prova de recuperação. (Foto: Arquivo pessoal)
Solange conta sobre como sua história é prova de recuperação. (Foto: Arquivo pessoal)

“Fui a pior interna. No presídio eu fui uma pessoa intragável, nem as próprias internas queriam que eu ficasse lá”. Condenada por roubo, falsidade ideológica e tráfico de drogas, Solange de Souza Duarte Lima conta que viveu por 20 anos nas ruas como Katita da Barão e, hoje recuperada, mostra que sua história é a prova de que é possível se recuperar.

Depois de cumprir toda sua pena, sofrer para voltar a viver em sociedade e pensar sobre a vida, Solange resolveu reunir alguns cadernos e escrever tudo. Agora, com ajuda de policiais penais que participaram da história de Solange, a narrativa irá se tornar livro.

Solange explica que costumava contar as etapas de sua vida para quem quisesse ouvir, mas decidiu unir tudo em detalhes como um testemunho de vitória. “Minha história é para quem já passou por abusos, quem caiu no tráfico, no crime. Jesus me ajudou e eu me recuperei, é preciso acreditar”, diz.

Relembrando sobre como acabou sendo indesejada até nos presídios, Solange narra que precisa voltar à sua infância para que tudo faça um pouco mais de sentido. “Quando eu era pequena fui abusada por parentes, mas depois que meus pais se separaram piorou. Minha mãe ficou mal com o divórcio, foi para São Paulo, me deixou morando com minha família aqui e foi piorando”, ela conta.

Toda a narrativa foi transformada em livro pela ex-presidiária. (Foto: Marcos Maluf)
Toda a narrativa foi transformada em livro pela ex-presidiária. (Foto: Marcos Maluf)

Sem conseguir entender o que deveria fazer, ela detalha que não sabia estar sendo abusada sexualmente, mas com 13 anos notou que aquilo não era “normal”. “Resolvi sair daquele lugar e fui morar na casa de menor abandonado com 13 anos, mas lá comecei a aprender de tudo e me aprofundei muito rápido no crime”.

Nesse período, Solange aprendeu a cheirar cola com um namorado e, em seguida, os furtos também surgiram. “Tudo em mim estava mudando. Com apenas 13 anos de idade, sem perceber estava me tornando uma criminosa”.

Como ela se lembra, a primeira vez em que foi levada pela polícia aconteceu aos 15 anos e, desde então, o retorno aos camburões se tornou frequente. “Com 16 anos eu já estava na Barão do Rio Branco usando craque, fiquei 20 anos no mundo do crime e 6 anos no regime fechado”.

Solange relata que foi presa diversas vezes, mas que o período mais extenso foi o de seis anos por tráfico. Nessa época, já sem se imaginar longe do vício, ela já se considerava a pior interna dos presídios pelos quais passava.

"Fiquei seis anos por indisciplina, era para eu ficar só um ano, mas era muita indisciplina. Tive que ficar até no presídio masculino porque chegou um tempo em que nenhum presídio daqui me aceitava”, diz Solange.

Solange ficou precisa em regime fechado por seis anos. (Foto: Arquivo pessoal)
Solange ficou precisa em regime fechado por seis anos. (Foto: Arquivo pessoal)

De acordo com a ex-interna, ela mantinha o uso de drogas nos presídios, furtava itens até dentro das celas e brigava constantemente com as companheiras que também estavam presas. “Eu não tinha nem chinelo. Não recebia visita, não tinha mais perspectiva de vida nenhuma”, diz.

Entre os problemas de disciplinas dessa época, ela conta que o pior de todos foi uma fuga do presídio feminino, sendo que após uma semana foi encontrada na Antiga Rodoviária.

Recuperação

Após retornar ao presídio, Solange seguiu os 6 anos internada e, quando recebeu liberação para cumprir a pena no regime semiaberto, fugiu mais uma vez. “Eu voltei a usar droga, mas um dia Deus falou comigo e eu soube que tinha acabado ali. Sabia que ele tinha coisas melhores para mim”, conta.

Ela detalha que foi para São Paulo com sua mãe e lá começou a se recuperar, mas ainda precisava terminar de cumprir sua pena em Campo Grande. “Deus começou a trabalhar em mim lá, fui me recuperando, melhorando de vida, mas sabia que precisava pagar o que devia para a Justiça. Jesus te perdoa sim, mas as consequências vêm e a gente precisa pagar o que deve”.

De volta a Mato Grosso do Sul, ela se entregou à Justiça e finalizou sua pena. Hoje, dez anos depois, Solange se prepara para lançar seu livro contando tudo em detalhes.

“Tive muita ajuda da Cleide, que hoje é diretora do presídio semiaberto feminino. Escrevi minha história nos cadernos e decidi ir até ela para pedir ajuda e digitalizar tudo. Quando eu estava presa, ela me ajudou e acreditou em mim, sou muito grata mesmo”, conta.

Sobre a experiência com Solange, a policial penal e diretora do Estabelecimento Penal Feminino de Regime Semiaberto, Cleide Santos do Nascimento Freitas conta que conheceu a ex-interna quando começou a trabalhar como agente penitenciária.

“Já ouvia falar das peripécias da interna Solange, vulgo Katita. Uma interna muito esperta, que se envolvia constantemente em confusões com as demais custodiadas. Solange sempre foi uma figura ímpar, ao mesmo tempo que nos dava trabalho, nos fazia rir com seu jeito malandro”, Cleide explica.

Especificamente sobre sua aproximação, ela narra que aconteceu quando Solange foi para o semiaberto. E, anos depois, o retorno da antiga Katita veio com a alegria de contar sua história com objetivo de ajudar outras pessoas.

Para Cleide, poder ajudar nesse processo foi motivo de orgulho, “eu sempre uso a história de Solange como exemplo para as demais. Sou muito grata por ter feito parte e por ter acreditado na verdadeira mudança dela. Claro que o mérito foi todo dela, eu apenas participei de uma pequena fase”.

Livro em produção

Ainda em processo de produção gráfica, o livro de Solange logo estará disponível para compra. Ela relata que quem se interessar deve entrar em contato através do número (67) 98415-8993.

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