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Comportamento

Adeus à vida de doméstica, mulheres agora trabalham na construção civil

Ângela Kempfer | 09/02/2012 13:00
Mulheres em aula prática de curso de pintura predial realizado pelo Senai no Aero Rancho. (Foto: Marlon Ganassin)
Mulheres em aula prática de curso de pintura predial realizado pelo Senai no Aero Rancho. (Foto: Marlon Ganassin)

Encontrar uma empregada doméstica é cada dia mais difícil em Campo Grande, mas contratar uma mulher “pedreira” já não é coisa rara. Como o salário é bem maior, muitas fazem cursos técnicos para colocar a mão no concreto, no reboco, na tinta...

Há 1 ano e 9 meses, Ângela de Souza, de 42 anos, trocou o trabalho de diarista pelo serviço no canteiro de obras. Mãe de dois rapazes, um de 22 e outro de 16 anos, ela diz ter todo apoio do marido para incrementar a renda em casa. “Compensa muito mais aqui porque temos ticket refeição e também adicional pela produção”, conta durante a hora do almoço na empreiteira Cobravi.

A empresa é responsável por projeto da Caixa Econômica e levanta 860 casas no Jardim Carioca, em Campo Grande, com 60 mulheres contratadas, no total de 150 pessoas.

Já na entrada é possível perceber que o lado feminino é forte. A engenheira responsável é mulher, há banheiro e alojamento femininos e por onde se olha estão as operárias.

No vestiário cor de rosa, 3 colegas almoçam sentadas no chão, apesar de haver um refeitório. No espaço reservado para as mulheres, as 3 parecem mais a vontade, uma apenas de sutiã e calça, o mínimo de conforto para quem não pode andar por aí sem camisa. São alguns aspectos que fazem do canteiro de obras um ambiente que precisou de adaptações.

“Não foi só abrir vestiário e banheiro feminino, tivemos também de dar um curso para os homens aprenderem a lidar com as mulheres, que são mais sensíveis. Havia muito palavrão, isso diminuiu”, lembra a engenheira.

As amigas Kátia e Divonete estão há 1 ano e meio na empresa.
As amigas Kátia e Divonete estão há 1 ano e meio na empresa.

As amigas Kátia e Divonete estão há 1 ano e meio na empresa. Já fizeram de tudo. A primeira parada das mulheres que trabalham na Cobravi é a fábrica de paredes pré-moldadas, feitas no chão com concreto, para depois as casas serem montadas.

Depois, elas vão para o acabamento. As mulheres costumam ser tão detalhistas e cuidadosas, que a equipe de pente-fino, que avalia a conclusão dos imóveis, é só composta por operárias.

O tempo rendeu experiência e, principalmente, mais conforto em casa para Kátia, de 30 anos, chefe de família que sozinha sustenta os 3 filhos, de 11, 8 e 5 anos. “Quando mudei, tinha apenas os colchões e um fogão. Quando comecei a trabalhar aqui, com o primeiro salário comprei uma geladeira e agora consegui até trocar os móveis”.

A idéia de que contratar mulheres pode significar problema é algo inimaginável no Jardim Carioca. Desde a implantação do canteiro de obras, há 3 anos, nunca houve uma licença maternidade, por exemplo. “Somos mais responsáveis em relação a tudo. O trabalho também cansa como qualquer outro, mas não é tão pesado porque a gente trabalha em equipe”, completa a trabalhadora Lúcia Souza, de 43 anos.

Jaqueline, de 22 anos, é auxiliar de eletricista da obra. Diz que sofreu antes de conquistar respeito profissional, mas não desiste de ser melhor. "Não penso em faculdade, mas em cursos para ser fera no que eu faço".

Operária entra em banheiro feminino, coisa rara em canteiros de obras.
Operária entra em banheiro feminino, coisa rara em canteiros de obras.
De baton, aluna aprende a preparar a parede para a pintura.
De baton, aluna aprende a preparar a parede para a pintura.

Em curso - Para formar essa mão de obra, o programa “Ação Fiems” leva cursos á perifeira de Campo Grande.

Na região do Aero Rancho, sete mulheres aprendem pintura predial. A mascar na boca esconde o batom, e o capacete ajuda a deixar homens e mulheres mais parecidos. Quem fala da diferença é o instrutor Marcos Vinícius Andrade, que já percebeu as vantagens femininas em uma obra.

“Elas são bem mais detalhistas. Enquanto os homens querem acabar logo com o serviço, as mulheres querem é fazer direito. Isso pode ser mais demorado, mas no fim das contas compensa bem mais porque não é preciso o retrabalho”.

A lata de tinta pesa 18 quilos, mas isso não é dificuldade até para quem nunca pensou em pegar no pesado. As meninas vão aprendendo juntas que tudo é possível em equipe. Rubelisia Pereira é cabelereira e descobriu que o trabalho na construção pode ser bem mais fácil. “Não é difícil, tem só de aprender a técnica. Na verdade, é mais fácil que cortar cabelo”.

No curso de 1 mês, são repassadas técnicas que vão até a aplicação de grafiato. São 70 horas, de segunda a sexta-feira. “Nunca houve uma desistência feminina e percebemos que trazer essa formação para o bairro é muito importante, porque tem muitas chefes de família por aqui”, justifica o gerente de formação do Senai, Artur Quintella.

Célia Regina de Jesus era garçonete, mas sempre quis trabalhar com construção. Pensa em um dia fazer Arquitetura, mas até lá quer se dedicar à pintura. “Vou me especializar em pinturas especiais”.

O colega no curso de pintura, Osmar de Souza, de 42 anos, diz que ficou surpreso foi com a demora na abertura do mercado para o sexo feminino. “Já tava na hora, o problema vai ser para madame arrumar empregada doméstica agora”, reforça.

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