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A polêmica da herança do cônjuge no regime de comunhão parcial de bens

Por Franco Mauro Russo Brugioni (*) | 01/04/2014 09:03

Com o advento do Código Civil de 2002, houve uma sensível mudança em relação à herança, alçando-se, em alguns casos, o cônjuge também à qualidade de herdeiro. Neste artigo abordaremos apenas a polêmica envolvendo o regime da comunhão parcial de bens, o regime legal e que ainda tem sido o mais adotado.

No regime da comunhão parcial de bens comunicam-se os bens amealhados pelo casal ou por um dos cônjuges na constância do casamento. Há que se diferenciar, no entanto, as relações de direito de família e direito de sucessões.

No âmbito do direito de família, caso haja divórcio, os bens amealhados na constância do casamento são divididos em iguais partes. Mas o que ocorre em caso de morte de um dos cônjuges enquanto o casamento ainda vigia? Neste caso entramos na seara do direito das sucessões.

Acontece que no atual Código Civil, artigo 1829, inciso I, está expresso que o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário juntamente com os demais herdeiros, de todos os bens particulares do falecido. Em caso de divórcio, os bens particulares não entram na partilha uma vez que não amealhados na constância do casamento.

Melhor explicando, um casal com dois filhos, em caso de morte de um dos cônjuges, pelo que está disposto no Código Civil, o cônjuge sobrevivente permaneceria com a metade dos bens adquiridos durante o casamento (meação) e a outra metade e os bens exclusivos do falecido (aqueles doados, herdados e adquiridos antes do casamento) compõem os bens particulares e será dividida em três partes: filhos e cônjuge sobrevivente.

Apesar de clara a redação, no início criou-se uma polêmica doutrinária, com entendimentos e correntes de todos os tipos, até que a questão começou a ser submetida ao Poder Judiciário até chegar para interpretação e julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça.

Muito embora as diversas teses que se defendia, os juízes aplicavam o que está claramente disposto no Código Civil. O STJ, no entanto, conferiu uma interpretação inicial, que parece ainda majoritária, no seguinte sentido: em relação aos bens adquiridos na constância do casamento, cabe ao sobrevivente apenas a meação. Em relação aos bens não adquiridos na constância do casamento ou doados ou herdados o cônjuge entraria como herdeiro. Afastou-se, assim, o fato de o cônjuge além da meação ainda concorrer como herdeiro em relação à outra metade.

Ou seja, houve uma divisão em duas classes de bens: os adquiridos na constância do casamento no qual o sobrevivente fica apenas com a metade (meação) e não herda a outra metade em concorrência com os demais herdeiros, e os bens exclusivos (assim podendo ser entendidos aqueles recebidos em herança ou doação ou adquiridos antes do casamento), em que o cônjuge herda em concorrência com os demais herdeiros, e em partes iguais.

Este entendimento, no entanto, começou a ser modificado pelo próprio Superior Tribunal de Justiça. No Recurso Especial nº 1.377.084 – MG, por exemplo, verifica-se que o STJ no final de 2013 começa a construir um entendimento diverso ao que vinha sendo aplicado e que já era diferente do que está disposto no Código Civil.

Continua a divisão dos bens nas duas classes anteriormente citadas, mas a interpretação do artigo 1829, inciso I, do Código Civil passou a ser radicalmente diversa: os bens amealhados na constância do casamento seriam objeto de meação e herança pelo cônjuge, mas os bens exclusivos do falecido caberiam somente aos demais herdeiros, sem concorrência do cônjuge.

A questão não está pacificada no STJ e, para que seja resolvida, talvez dependa de novos julgamentos nesse sentido e, se for o caso, até de uniformização de jurisprudência e edição de súmula, mas já se verifica uma guinada de tese que pode afetar o direito das sucessões e aumentar a polêmica sobre a participação ou não do cônjuge na herança.

(*) Franco Mauro Russo Brugioni é advogado, especialista em Direito Civil e sócio do Raeffray Brugioni Advogados

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