ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SEXTA  19    CAMPO GRANDE 20º

Artigos

A selvageria pós liminar

Por Ronaldo Franco (*) | 16/05/2014 14:25

Não consigo vislumbrar outro adjetivo senão este acerca dos episódios que ocorreram ontem nos órgãos municipais após a concessão da medida liminar anulando o decreto legislativo que cassou o mandato de ALCIDES BERNAL.

Violação de intimidade, cárcere privado, usurpação de poder, peculato, depredação de patrimônio público, lesão corporal grave, ameaça, injuria, calúnia, constrangimento ilegal, exercício arbitrário das próprias razões entre outros ilícitos noticiados.

Tais atos foram fartamente divulgados e postados nas redes sociais, inclusive por seus autores, como se isto fosse o resultado desejado do restabelecimento da vontade popular.

Tenho três premissas necessárias para analisar os atos de ontem.

1ª) Os 270 mil votos concedidos a Bernal, incluindo o meu voto, não deram a ninguém a imunidade para praticar ou dar apoio aos atos violentos praticados ontem.

2ª) O sistema judicial e legal foi criado, concebido e instituído para que a solução de conflitos ocorra de forma civilizada. Bater nas portas do judiciário alegando perseguição e golpe e ao mesmo tempo participar, concordar e instigar com os atos de ontem demonstra despreparo e desprezo para o jogo democrático e institucional.

3ª) O Estado só é democrático porque é de direito.

Alguns episódios ocorridos ontem durante o retorno de Bernal me chamaram a atenção e acho que merecem apuração e providências.

Primeiro: Não entendi, até agora, porque um oficial de justiça acompanhou Bernal e sua turba até as portas da prefeitura para que ele retomasse o cargo de prefeito.

Consultando o processo percebi que havia mandados para os vereadores, para o Presidente da Câmara e para Gilmar Olarte.

Se o oficial que compareceu com Bernal e a turba realmente estava com o mandado de intimação dirigido ao Prefeito Olarte (tenho dúvidas disto) deveria ter certificado sua ausência e tentado buscar informações acerca de seu paradeiro e outros endereços para a devida intimação.

Ler o mandado para guardas municipais (como divulgado pela imprensa), fazendo com que Bernal e sua turba tomassem posse do prédio, me parece um ato descabido. No mandado direcionado ao Prefeito OLARTE não consta que caberia a adoção desta providência.

Segundo: Ninguém mais, além de Bernal, tinha sequer uma liminar para adentrar na SEDESC, SESAU, SAMU, SEMAD, CENTRAL DE COMPRAS ou qualquer outro órgão municipal para se declarar nomeado, dar ou revogar ordens, impedir a saída de servidores, demitir comissionados, revistar bolsas, reter bens particulares e proceder revista íntima em qualquer servidor. Sequer tinham atos de nomeação exarados por Bernal que os autorizassem a tomar posse de prédios e cargos públicos.

Os guardas municipais que admitiram estes comportamentos, por mera ordem verbal, se demonstraram despreparados para o exercício da guarda do patrimônio público e a preservação da integridade física dos servidores municipais.

Nenhum documento e equipamento público deveria ter sido retirado ou destruído, ainda que os referidos autores já tivessem sido nomeados e investidos, o que não era o caso.

Terceiro: O apoio político que Bernal recebeu dentro do paço municipal deveria ter se atentado para as formalidades e precauções que se exige de agentes políticos.

As pessoas que acompanharam Bernal do fórum ao paço ao ver agentes políticos, TAMBÉM presentes, sentiram-se autorizadas e apoiadas a praticar a selvageria ocorrida ontem.

O que esses agentes disseram hoje aos servidores agredidos e humilhados?

O que disseram aos agressores?

Qual a explicação ou a cobrança desses agentes para o sumiço de equipamentos e documentos públicos?

A pressa que alguns tiveram em hipotecar, presencialmente, apoio à posse de Bernal deveria se transformar em pressa em condenar de forma veemente os atos de selvageria ocorridos ontem. Há um silêncio ensurdecedor por parte deles no dia de hoje.

Nesta toada de silêncio se encontram outros agentes políticos que postam todos os dias opiniões sobre tudo em redes sociais.

Os três pré candidatos a Governador do Estado não emitiram um único ruído condenatório aos atos de ontem.

O presidente da OAB/MS não emitiu sequer um comunicado para reprovar e exigir punição aos responsáveis pela revista íntima feita na procuradora jurídica das SESAU, nossa colega de ofício. Será que não leu o noticiário hoje?

Nenhum sindicato saiu em solidariedade aos servidores, comissionados e efetivos, que viveram momentos de vexame e humilhação. O imposto sindical descontado em Abril deveria pelo menos ser retribuído agora.

Parece que os tais ‘270 mil votos’ de Bernal ainda existem no imaginário de muitos.

Nem um bilhão de votos justifica o que aconteceu ontem.

Acho que é a hora da polícia, MPE e própria administração apurar a responsabilidade civil, criminal e administrativa dos atos ocorridos ontem.

Todavia é preciso que aqueles que acreditam no Estado de Direito se posicionem de forma firme e em reprovação aos atos de violência, selvageria e depredação que ocorreram ontem dentro do paço municipal de uma capital com quase um milhão de habitantes.

O Bernal de ontem demonstrou que continua sendo o Bernal de 01/01/2013 a Março de 2014. Não mudou nada. Pelo contrário, está calado em relação aos atos de selvageria. Acha que 270 mil votos são propriedade particular, votos eternos.

Eu fico imaginando o que seria o dia de hoje no paço municipal sem a liminar que revogou a liminar.

A lição boa que ficou de ontem é que o sistema judicial e legal construído pela civilização para combater a barbárie garante aos inconformados o direito de recorrer.

(*) Ronaldo Franco é advogado.

Nos siga no Google Notícias