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Estratégia de inovação em tempos de pandemia

Marcelo Caldeira Pedroso (*) | 23/05/2020 09:13

Provavelmente a melhor forma de lidar com as crises seja um misto de realidade com otimismo. Quando a crise é inevitável ou já está instalada (senso de realidade), vale a pena pensar em formas de potencializar as oportunidades dela decorrentes (senso de otimismo). Nas palavras de Albert Einstein: “A crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias”.

No momento atual, a crise tem nome e sobrenome: denomina-se pandemia do coronavírus covid-19 (Sars-CoV-2). Neste contexto, trazemos uma reflexão: como as organizações podem aproveitar a crise como um fator impulsionador da inovação?

O conceito de inovação, no sentido amplo, pode ser entendido como “algo novo” para uma organização e, de maneira geral, também para as pessoas por ela impactadas. Isso significa que inovação implica mudança. No sentido inverso, uma mudança significativa no ambiente externo pode gerar a necessidade de inovação.

Essa questão reflete o contexto atual: a inovação como um imperativo, ou seja, um elemento que se impõe para lidar com uma mudança significativa no ambiente externo (no caso, a pandemia e suas consequências).

Em geral, pode-se dizer que as pessoas (e também as organizações) mudam por necessidade. Segundo Sigmund Freud, “quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda”. Em outras palavras, as pessoas e as organizações mudam quando suas percepções dos benefícios para mudar compensam os esforços e riscos associados à mudança. No caso da pandemia, o benefício pode ser incomensurável. A depender do contexto organizacional, a pandemia pode trazer importantes consequências aos negócios de uma organização, ou até mesmo colocar em risco sua sobrevivência.

As mudanças impostas ou adaptativas decorrentes da pandemia têm proporcionado diversas novidades, dentre outras: novos hábitos sociais (ex.: distanciamento social), impactos econômicos e sociais devidos à restrição de atividades consideradas como não essenciais (ex.: fechamento de parte do comércio), adoção de novas tecnologias (ex.: plataforma de videoconferência), novas formas de trabalho (ex.: trabalho remoto) e novas regulamentações (ex.: telemedicina, flexibilização da jornada de trabalho).

Isso tem causado impactos substanciais em alguns setores da economia. Provavelmente, alguns destes serão tratados como “antes e depois da covid-19”. Vamos considerar um conceito da inovação para refletir sobre isso. Nos anos 60, Everett Rogers preconizou a teoria de difusão da inovação. Segundo Rogers, a difusão é o caminho pelo qual uma inovação é disseminada ao longo do tempo entre os participantes de um sistema social. Segundo esse conceito, as pessoas podem ser classificadas em grupos de acordo com o tempo que demoram para adotar uma inovação. Esses grupos são: os inovadores, ou seja, os primeiros a aderir à inovação (que representam cerca de 2,5% da população); os primeiros adeptos, que adotam a inovação logo após os inovadores (representam cerca de 13,5% da população); o grupo classificado como maioria inicial, ou seja, aquelas pessoas que observam e aprendem com as experiências dos grupos antecessores (representam cerca de 34% da população); o grupo tratado como maioria tardia, ou seja, aquelas pessoas que costumam aderir a inovações já testadas e consolidadas (também representam cerca de 34% da população); e os retardatários, que são o último grupo a adotar a inovação (representam os restantes 16% da população).

Quando a inovação atinge a maioria inicial, ela tende a se consolidar. Quais são as implicações da teoria de difusão da inovação no contexto atual? Em função da pandemia, alguns setores precisaram adotar inovações em grau elevado. Exemplos desses setores incluem a educação (por meio de diferentes formatos de educação a distância), varejo e logística (compras on-line e entregas no ponto de consumo), assistência à saúde (por meio da telemedicina), além de diferentes atividades administrativas (por meio do trabalho remoto), processos decisórios e de comunicação (por meio das reuniões e interações por videoconferência).

Em certos casos, muito provavelmente essas e outras mudanças já ocorreram numa prevalência que atingiu a maioria inicial ou até mesmo a maioria tardia da população atuante nesses setores. Isso tende a consolidar as inovações. Assim, após a pandemia, certamente esses setores deverão fundir, sobrepor ou equilibrar as novas práticas com as antigas. Ou seja, as mudanças impostas pela pandemia tendem a transformar determinados setores.

Em síntese, a pandemia implica uma mudança (em maior ou menor grau) no ambiente externo da organização, o que implica também a necessidade de adaptação desta a um novo contexto. Algumas mudanças realizadas tendem a se consolidar em determinados setores (ex.: educação, varejo e saúde) fazendo com que a premência de inovação seja evidenciada pela pandemia. Portanto, uma mensagem para as organizações é: além da estratégia de gestão de crises, aproveitem o momento para repensar sua estratégia de inovação.

(*) Marcelo Caldeira Pedroso é professor livre-docente da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo.

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