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Marco Civil da Internet: até quando a neutralidade conseguirá se sustentar?

Por Dane Avanzi (*) | 30/01/2015 12:00

A evolução das tecnologias de telecomunicações alterou profundamente as relações humanas, especialmente nas últimas décadas, com a disseminação da internet e a disponibilização de conteúdos em diversos formatos e volumes cada vez maiores e mais rápidos. Criada em pequenos laboratórios da universidade para uso acadêmico e, posteriormente, aprimorada por militares para troca eficiente de informações, a internet de 1960 jamais sonhava que se tornaria tão importante e abrangente para as pessoas em todo o mundo. A grande novidade dessa semana é que o governo iniciou uma consulta pública para que a sociedade colabore com o fechamento de algumas lacunas que ficaram no Marco Civil da Internet, que entrou em vigor em junho de 2014, mas deixou pontos polêmicos em aberto, como a neutralidade de rede e como ficam guardados os registros dos acessos a serviços na internet.

Antes de entrarmos nesse ponto, é interessante analisarmos um breve histórico da rede mundial de computadores. O grande "boom" da internet ocorreu no início da década de 1990, com a padronização das indústrias de hardwares e softwares que passaram a utilizar o protocolo TCP/IP para troca de informações na WEB. Essa padronização permitiu a criação de milhares de endereços padrão como IPV4, IPV6, etc, e possibilitou o crescimento exponencial da rede mundial de computadores que conhecemos hoje. Em razão de sua ascensão acidental e casual, a internet de hoje tem contas a acertar com seu passado.

É aqui que o conceito da neutralidade é questionado pelos respectivos segmentos das indústrias que hoje compõem o ecossistema da internet. Se antes as empresas com interesse na internet se resumiam a fabricantes de hardwares, softwares e operadoras de telefonia, hoje, além destes, existem várias outras empresas que nasceram durante a evolução da internet, como é o caso da Google, Netflix, Facebook, Yahoo, entre outras, e, ainda toda a cadeia de provedores de conteúdos multimídia, jornais, revistas, TV's e gravadoras.

Mas, afinal de contas, o que é essa tal de neutralidade? A neutralidade é o princípio basilar da internet que confere igualdade de prioridade no transporte de pacotes (informações) na rede. Essa igualdade que antes existia porque o ecossistema estava organizado para transportar pequenas quantidades de informações, hoje evoluiu. As operadoras perdem cada vez mais receita para aplicativos que são capazes de transmitir voz e dados a baixíssimo custo, querem rever as regras de cobrança para adequar a nova realidade a seus custos. Não é por acaso que recentemente as operadoras brasileiras anunciaram que os clientes teriam a velocidade diminuída de seus pacotes de dados ou deveriam migrar para planos mais caros.

O Brasil, ao publicar a Lei 12.965/14, definiu a neutralidade como princípio basilar, definindo normas de proteção à privacidade, responsabilidade por publicação de conteúdos e deveres das operadoras de telefonia no sentido de guardar registro de acessos dos usuários por seis meses e, proibindo expressamente que a transmissão de conteúdos fosse feita por tipo de mídia que fizesse distinção entre pacotes de vídeo, músicas, e-mails, etc.

O assunto tem sido motivo de lutas judiciais nos EUA, que ano passado decidiu pela quebra da neutralidade entre empresas dos bastidores, podendo as Telco's (operadoras) celebrarem contratos com outras corporações que disponibilizam conteúdo, proibindo que essas últimas cobrem por tipo de conteúdo. A discussão está muito longe de acabar devido à crescente utilização da internet em todo mundo, que pode dobrar de tamanho em poucos anos em decorrência da internet das coisas.

Se por um lado o acesso à informação é um bem fundamental ao ser humano, posto que vivemos na Sociedade da Informação, por outro, as operadoras necessitam de investimentos para manter o sistema com o mínimo de qualidade. A neutralidade, nesse sentido, tem produzido uma situação paradoxal na qual um bilhete de primeira classe está custando o mesmo preço de um bilhete da classe econômica. Essa disparidade ocorre porque tecnicamente o transporte de um pacote de vídeo é muito mais oneroso que o transporte de um pacote de texto.

Assim como temos que repensar nossa relação com a água, eletricidade e outros recursos, também temos que pensar a nossa relação com a internet, que em grande parte necessita de um recurso escasso, finito e não renovável: o espectro radioelétrico.

(*) Dane Avanzi é empresário, advogado e vice-presidente da Aerbras - Associação das Empresas de Radiocomunicação do Brasil.

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