ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
MARÇO, QUINTA  28    CAMPO GRANDE 29º

Capital

Consumo de drogas leva adolescentes ao crime e ao vai e vem de Uneis

Nadyenka Castro | 16/02/2012 10:35

É o que mostra perfil elaborado pela Justiça, que encontrou, ainda, histórico de famílias desorganizadas

O sonho de fazer do chute de bola o ganha pão ficou inviável quando deu lugar ao vício em drogas. Aí,o desejo de ganhar o mundo parou nas grades. (Foto: Marlon Ganassin)
O sonho de fazer do chute de bola o ganha pão ficou inviável quando deu lugar ao vício em drogas. Aí,o desejo de ganhar o mundo parou nas grades. (Foto: Marlon Ganassin)

Com apenas 17 anos e já quatro vezes apreendido. As duas últimas no intervalo de menos de um mês pelos crimes de roubo e tráfico. Este é o resumo dos últimos três anos da vida do garoto que sonhava ser jogador de futebol e diz, que agora, o sonho é com a “comida da mãe”, referindo-se à liberdade.

Segundo o juiz Roberto Ferreira Filho, da Vara da Infância, Juventude e Idoso, o perfil dos envolvidos em infração geralmente é de quem “está fora da escola ou têm atraso educacional, é dependente/usuário de drogas, reincidente, têm entre 16 e 17 anos e com a família desorganizada”.

Interno desde o início deste ano da Unei (Unidade de Internação Educacional) Novo Caminho,o adolescente é um exemplo da realidade constatada pelo magistrado. O garoto começou a usar drogas aos 15 anos e mudou de vida. Abandonou o sonho e as diversões que tinha.

“Antes eu sonhava ser jogador de futebol. Jogava bola, brincava na rua. Tinha namorada e a minha mãe. Perdi quase tudo”, fala o garoto. Ele diz que mudou a rotina quando aceitou a cocaína oferecida por um grupo de amigos. “Foi a primeira vez que me ofereceram e eu aceitei. Achei que ia ser tudo fácil, que todo mundo ia gostar de mim”.

Desde então, o adolescente largou o treino de futebol no campo do Cene, abandonou a escola, o namoro acabou e para sustentar o vício, passou a cometer crimes - tráfico de drogas e roubo -, que são chamados de infração quando quem comete tem menos de 18 anos.

A mãe, de 35 anos, dona de um bar no Jardim Noroeste, parece ser a única razão de viver do adolescente.Em quase todas as frases que fala cita ‘mãe’. “Agora, quero sair desse negócio de crime, ajudar a minha mãe”.

Ela faz visitas semanais ao filho, cujo pai é falecido e não é o mesmo da irmã de 19 anos. A mulher é a inspiração para o adolescente que afirma que irá ‘andar na linha’. “Quero mesmo é ajudar a minha mãe. Porque bom mesmo é comida de mãe”.

Mudar de vida - O rapaz divide o alojamento com outros quatro internos, “mas já chegou a ter 11”, conta. Segundo ele, a maioria não quer mais voltar aos crimes. “Tem alguns que não pensam assim”, revela.

Enquanto falava com a reportagem do Campo Grande News, o garoto estava na expectativa de ganhar novamente a liberdade. No entanto, durante audiência, o juiz Roberto Filho determinou que ele permanecesse internado, mas na Unei Dom Bosco.

Segundo o juiz da Vara da Infância e Juventude, “a grande maioria [dos infratores] demonstra motivação”. O problema da reincidência, de acordo com o magistrado, é o retorno ao mesmo ambiente em que vivia. “Ao sair ele enfrenta a mesma realidade”. “Tem casos de excelente mudanças de comportamento. Aí volta para o mesmo ambiente”, acentua o magistrado.

As grades do alojamento servem de varal para roupas dos garotos. (Foto: Marlon Ganassin)
As grades do alojamento servem de varal para roupas dos garotos. (Foto: Marlon Ganassin)
Magistrado diz que maioria dos adolescentes quer mudar de vida, mas, não consegue. (Foto: João Garrigó)
Magistrado diz que maioria dos adolescentes quer mudar de vida, mas, não consegue. (Foto: João Garrigó)

E voltar para o bairro onde morava até setembro do ano passado, trabalhar e ajudar a família é a vontade de outro interno da Unei Novo Caminho. Aos 17 anos, o adolescente confessa que matou uma pessoa em 2008 e três anos depois foi apreendido.

Antes do crime, assim como o colega de alojamento, passou a usar entorpecentes a pedido de amigos. “Foi a primeira que me ofereceram. A gente estava em uma festa. Tinha uns 12, 13 anos”.

Ele diz que no ano de 2008 fez vários crimes e também levou um tiro, depois de ter praticado o homicídio. Depois disso, não se envolveu mais em ‘coisa errada’ e foi apreendido devido ao mandado de busca e apreensão por conta do assassinato.

Segundo o adolescente, o tiro no pescoço e a dor da mãe foram as duas coisas que o fizeram pensar sobre o que estava fazendo com a própria vida. “Eu fiquei 45 dias no CTI. Vi minha mãe sofrendo. Olhava para ela e via que estava sofrendo demais”, desabafa.

Para reverter a dor que deixou no coração da mãe, empregada doméstica, e ser um bom exemplo para a irmã de 10 anos, o garoto afirma que vai arrumar um serviço quando sair da Unei e não mais retornar.

“Quero trabalhar como meus pais. Ajudar eles. Terminar os estudos”. Ele freqüentou somente até o 6º ano do ensino fundamental.

Dia-dia- Diretor da Unei Novo Caminho e agente de medidas sócio-educativas há 10 anos, Valdinei Figueiredo diz que ter respeito pelos “clientes” é a principal obrigação de quem trabalha com adolescentes infratores. “Esse é o meu trabalho. As vezes a sociedade não entende. Mas tenho que ter o compromisso de fazer que estes meninos saiam daqui, pelo menos, um pouco melhor de como entraram”.

E para Figueiredo, o respeito é o melhor caminho. “Eles chegam aqui totalmente estraçalhados. O nosso desafio é montar os cacos”, fala. Em uma década de experiência com menores em Uneis, o diretor explica que apesar de esforços para transformação do infrator, o destino de muitos não é a mudança de atitude. “É o que chamo de 3C: cadeinha, cadeião e caixão. Já vi muita mãe chorando em cima do caixão”, finaliza, referindo-se ao fato de que o envolvimento em crimes os levam à morte.

Nos siga no Google Notícias