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Capital

Na prioridade aos jovens, mulher vê mãe de 82 anos morrer sem UTI

Tânia lutou para que mãe de 82 anos com covid tivesse direito à vaga em UTI, mas viu jovens serem priorizados

Paula Maciulevicius Brasil | 05/06/2021 10:01
Idosa ficou internada na UPA Vila Almeida desde o fim de maio. (Foto: Arquivo/Kísie Ainoã)
Idosa ficou internada na UPA Vila Almeida desde o fim de maio. (Foto: Arquivo/Kísie Ainoã)

Hoje, às 3h45 da madrugada, acabou parte da luta de Tânia Mara Martins da Silva. A filha que tentava vaga para a mãe em alguma UTI da covid recebeu a notícia de que Dilce Silva Martins, de 82 anos, não resistiu. Ele estava internada na UPA da Vila Almeida desde o dia 24 de maio.

A família chegou a conseguir na justiça o direito a uma vaga em hospital quatro dias depois da internação, no dia 28, mas viu a prioridade ser dada aos mais jovens. "Infelizmente, nem com esse mandado judicial que eu lutei, não consegui vaga para a minha mãe. Vi muita gente passando na frente", disse Tânia ao informar à equipe de reportagem a morte da mãe.

Dilce tinha 82 anos e segundo a família, mesmo com liminar garantindo vaga em UTI, ficou esperando duas semanas até morrer em posto. (Foto: Arquivo Pessoal)
Dilce tinha 82 anos e segundo a família, mesmo com liminar garantindo vaga em UTI, ficou esperando duas semanas até morrer em posto. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ela foi uma das primeiras familiares vítimas do colapso no qual a saúde do Estado se encontra. No dia 1º de junho, Tânia denunciou ao Campo Grande News a prioridade que jovens estavam tendo na hora de ocuparem os leitos vagos da UTI's na reportagem "Com filho internado, mas sem UTI para mãe, mulher denuncia prioridade aos jovens".

"E ontem [sexta-feira], eu até vi a diretora do Regional falando que ia dar prioridade para os mais novos. Os velhos que morressem à míngua", desaba a filha.

Quando Tânia Mara pediu socorro também à imprensa relatou que via sair da UPA vários jovens regulados para uma vaga hospitalar enquanto a mãe esperava há duas semanas. "Tanto novo quanto idoso tem que ter preferência. Não é porque é velho que vai deixar morrer. É minha mãe, mas podia ser a mãe de qualquer um, a sua, a do prefeito", chegou a dizer.

Dona Dilce teve complicações renais e precisaria fazer hemodiálise, o que não era possível no posto de saúde. "Eu tentei de tudo, fui para tudo quanto foi lado, e agora estou aqui com o coração partido, destruído. Por causa de uma vaga que ninguém arrumou a minha mãe morreu", diz desolada.

Tânia, que trabalha como recepcionista, foi chamada ontem na UPA para ouvir que conseguiram a vaga, mas dona Dilce não resistiria na transferência. "A médica disse que minha mãe não tinha condições nem de mudar de cama, que se fosse uma semana antes, ela teria chance", relata.

Dilce em foto de lembrança da filha Tânia Mara. (Foto: Arquivo Pessoal)
Dilce em foto de lembrança da filha Tânia Mara. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ao mesmo tempo em que Tânia Mara chora a partida da mãe, diz que precisa encontrar forças para lutar pelo filho que segue internado no Hospital Regional. O rapaz tem 38 anos e também está com covid. "Eu tenho que estar em pé para poder tirar meu filho de lá vivo, porque tenho certeza que ele vai sair de lá", acredita a mãe.

Antes de finalizar a entrevista, a recepcionista pede para que as autoridades sejam questionadas. "Cadê os hospitais de campanha? Que no começo, quando nem estava tão forte a pandemia assim, eles tinham montado, cadê? Agora que a gente está mais precisando, tinham que alugar um salão, um espaço e fazer. Não é só a minha mãe que está morrendo, são muitos", diz indignada.

Hospital prioriza jovens - Sinal mais evidente de colapso na saúde do Estado está estampado na triagem do Hospital Regional. O Comitê Operacional de Emergência do hospital adotou o protocolo levando em consideração quem ter mais chances de sobreviver à covid-19 – pacientes com mais anos de vida e em situação menos grave.

“É um protocolo que atende a princípios éticos e bioéticos. A gente até evita de falar, porque é difícil para alguém que está com um familiar esperando por uma vaga entender, mas não existe mais o individual. A regra é salvar o maior número vidas possível. É uma guerra. O soldado que está mais ferido é deixado para depois. É terrível. Mas, se pensar em outra perspectiva, os mais jovens vão deixar dependentes, toda uma família desassistida”, tenta explicar a diretora do HR, Rosana Leite de Melo em entrevista nessa sexta (4).

O boletim de sexta (4), divulgado pela SES (Secretaria Estado de Saúde), trazia a internação 1.303 pessoas em Mato Grosso do Sul com a covid e a taxa de ocupação de leitos de UTI SUS em Campo Grande está em 107%. A situação é tão dramática que pacientes começaram a ser transferidos para outros estados como Rondônia.

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