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Cidades

Jornalista de MS conta a reação de portugueses à intolerância na Europa

Sandra Luz, de Porto, Portugal, especial para o Campo Grande News | 09/01/2015 17:44
Jornalista de MS conta a reação de portugueses à intolerância na Europa
Foto de cartunista cobre um dos prédios  mais altos de cidade portuguesa (Foto: Sandra Luz)
Foto de cartunista cobre um dos prédios mais altos de cidade portuguesa (Foto: Sandra Luz)

O silêncio tem sido uma marca das manifestações em torno da indignação aos mortos quarta-feira na redação do periódico francês Charlie Hebdo. No Porto, ao norte de Portugal, não foi diferente, algumas centenas de pessoas se aglomeram em frente à Câmara Municipal – órgão que equivale à prefeitura e depositaram velas junto à estátua de Almeida Garret. Fixadas ao pé do monumento, charges em lembrança às vítimas, ao trabalho do semanário satírico e, principalmente, a George Wolinski, cuja intimidade com o Porto consternou o presidente da Assembleia Municipal, Miguel Pereira Leite a convocar a homenagem.

Wolinsk, nascido em 28 junho de 1934, estava sempre que podia com um pé no Porto, participava de conferência e, como ocorria com o restante dos chargistas, influenciava. Era chamado amigo da cidade. No ano passado, foi homenageado pelo trabalho e na tarde de hoje, um painel com o retrato do chargista cobriu a torre mais alta do edifício da Câmara do Porto. Ali, na Avenida dos Aliados, onde os sotaques e idiomas se misturam, não foi preciso falar para entender o que havia.

A Europa tem medo, traduz Manoel Joaquim Freitas dos Reis, ocupou 53 de seus 79 anos como sub-chefe principal da PSP (Polícia de Segurança Pública), onde, entre outras atribuições, ficou responsável pelos presos políticos. Ele mesmo, por dois anos ficou preso na África e demonstra que o espanto está na insistência da intolerância que atinge a coletividade e não somente um país ou profissão. “Essa tragédia não está restrita à França. Hoje houve mais uma lá e isso nos comove e nos assusta”, afirmou em tom baixo para não destoar do silêncio imposto ao vazio de mais mortos hoje.

Mesmo sem o que dizer, o ato de estar em frente à Câmara Municipal é interpretado como obrigação para alguns. “É preciso, fiz questão e precisamos estar aqui. Não é só para prestar uma homenagem. É para dizer que essa vergonha terrorista já deveria ter acabado”, sussurra Antônio Mox, de 65 anos, tendo três décadas dedicadas à Universidade do Porto. Não há mesmo o que dizer e eles contemplam-se em dúvidas. Só mesmo quem não entende fala, e bastante, como o pequeno Lois Burnel, 3 anos, sob a atenção do pai francês, o produtor de televisão Christian Burnel, 46 anos, cuja calma foge à pergunta sobre os últimos acontecimentos. “O atentado ocorreu a uma distância de duas quadras do meu escritório e significa não somente um ataque à liberdade de expressão, mas à facilidade com que as pessoas acreditam que podem fazer justiça”.

A Europa tem medo, diz Manoel, que ocupou 53 de seus 79 anos como sub-chefe principal da Polícia de Segurança Pública (Foto: Sandra Luz)
A Europa tem medo, diz Manoel, que ocupou 53 de seus 79 anos como sub-chefe principal da Polícia de Segurança Pública (Foto: Sandra Luz)
Jornalista de MS conta a reação de portugueses à intolerância na Europa

Os nocivos efeitos do atentado, na avaliação do produtor, que trabalha para uma emissora brasileira, vão além do luto e medo, demonstram que a intolerância é cíclica e há, sim, a possibilidade de mais vítimas. “As pessoas estão em busca de algo que não tem a ver com ser muçulmano. Talvez, o Islã esteja passando por sua inquisição neste momento”, avalia quando se refere à pressão aos muçulmanos. E a fala dos participantes, mesmo em baixo volume, era acompanhada de olhos espantados com as notícias dos últimos acontecimentos na França hoje. Também condenavam a intolerância e a busca por justiça contra os muçulmanos, o que resumiu o jornal Libération, que essas pessoas não devem desculpar-se por atos que não praticaram.

“Quando a Ku Klux Klan pendurava negros em nome da supremacia branca e cristã, ninguém exigiu que o clero cristão norte-americano se dissociasse. Ao longo dos três décadas de ataques na Facção do Exército Vermelho na Alemanha, ninguém exigiu que a esquerda alemã reafirmasse o seu compromisso com a democracia. Da mesma forma, mais recentemente, na França na década de 1980, ninguém pensou em suspeitar que os extremistas não deixassem de rejeitar ataques de ação direta. Por quê? Porque em todos esses casos, considerando-se esta última como a priori suspeito de simpatia para o absurdo, ridículo, e, francamente, estúpido”.

Ao meio de intolerância – foram 15 ataques contra mulçumanos contabilizados nos últimos dois dias pelo Libération – as manifestações seguem e atraem não só os cidadãos temorosos, assustados e impotentes.

No domingo, o primeiro-ministro britânico David Cameron confirmou a participação na marcha republicana em Paris. Pelo Twitter, revelou que aceitou o convite do presidente francês François Hollande. Como um cidadão quase comum, disse que o ataque foi um “ultraje”.

Charges são usadas em protesto em cidade de Portugal (Foto: Sandra Luz)
Charges são usadas em protesto em cidade de Portugal (Foto: Sandra Luz)
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