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Em Pauta

Mais alto, mais forte, mais nazista

Mário Sérgio Lorenzetto | 12/11/2018 07:40
Mais alto, mais forte, mais nazista

As Olimpíadas de 1936 foram projetadas para ser uma grande propaganda nacional socialista, para exibir ao planeta a superioridade ariana. Os atletas alemães deveriam ser mais rápidos, mais fortes, mais altos e mais nazistas. Após a guerra, muitos mitos foram criados. O mais famoso é o da humilhação de Adolf Hitler pela quantidade de medalhas ganhas por atletas negros norte americanos. A verdade é que a Alemanha foi vitoriosa e Hitler passou semanas alardeando as vitórias de seus arianos.
A lenda mais recorrente, presente em livros e no cinema de Hollywood, é a de que o ditador nazista se negou a saudar Jesse Owens, atleta de raça negra e grande triunfador individual desses jogos. Hitler, na realidade, só saudou os vencedores no dia da abertura dos jogos. Owens, em suas memórias, escreveu que quem não lhe deu as mãos foi seu presidente, Franklin Roosevelt, enrolado em uma campanha eleitoral necessitando como nunca do voto do sul racista.

Mais alto, mais forte, mais nazista

Gretel Bregmann, a saltadora judia, camareira de hotel.

Gretel era, quando se avezinhavam os jogos em seu país, a estrela mundial no salto em altura. Mas não treinava na Alemanha. Tinha fugido para a Inglaterra, escapando da caça nazista aos judeus. Gretel não era uma alemã qualquer, era aquela que saltava mais alto que todas. E isso serviu para alguma coisa? Não quando Hitler chegou ao poder e desencadeou o ódio. Gretel foi expulsa de clube onde treinava e perseguida em todos os níveis. Quem se aproximasse da campeã, como de qualquer outro judeu, passava a ser suspeito e igualmente perseguido. A campeã fugiu para Londres. De repente, chegou a seus ouvidos a promessa de um milagre. Os Estados Unidos estavam dispostos a boicotar os jogos de Berlim se os alemães não demostrassem que não eram anti-semitas. Assim foi como a judia Gretel Bregmann foi seduzida pelos nazistas para retornar a Berlim e competir nos jogos. Ganharia uma medalha, seria o orgulho da "Grande Alemanha".
Gretel regressou e cumpriu o requisito. Saltou nas provas eliminatórias para escolher a alemã que representaria seu país e ficou em primeiro lugar. Hitler esperou que a delegação norte americana estivesse embarcada no navio para Berlim para anunciar que Gretel estava excluída dos jogos. Os nazistas vendiam a ideia da inferioridade dos judeus e não poderiam aceitar uma medalha ganha por um deles.
Gretel voltou a fugir da Alemanha, dessa vez para os Estados Unidos. Enquanto seguia saltando, arrumava as camas de um hotel, varria o piso e continuava colecionando medalhas. Morreu aos 103 anos. Chorou até o final de seus dias a cada vez que via uma prova de atletismo na televisão.
O regime nazista substituiu Gretel por um homem, Heinrich Ratjen, que se passou por uma mulher chamada Dora. Ficou em quarto lugar. Quando lhe pediram explicações pelo seu bigode afirmou que tinha hermafroditismo. Depois dos jogos, os nazistas acabaram prendendo Heirinch/Dora, acusada de ser travesti. Foi acusada de trair o mesmo Reich que a obrigou a mudar de sexo. "Eu sempre fui homem", disse anos depois.

Mais alto, mais forte, mais nazista

Luz Long: o alemão que desafiou os nazistas.

Jesse Owens foi a maior estrela dos Jogos Olímpicos de Berlim. Mas esta não é a história de Owens. É a história de Luz Long, um advogado alemão, nascido em 1913, que era visto como a grande esperança dos nazistas para conquistar a prova de salto em distância.
A concorrência de Jesse Owens, então detentor do recorde mundial, era dura. Mas Long tinha a seu favor os sucessivos títulos nacionais e a medalha dos jogos europeus, além da fanática torcida de mais de 100 mil espectadores no estádio de Berlim.
A história não têm suspense: Jesse Owens ganhou tudo que havia para ganhar em Berlim. Inclusive um amigo improvável. Sim, exatamente Luz Long. Disputava-se a qualificação para a final da prova e o objetivo era superar os 7,15 metros. Luz Long já tinha alcançado o objetivo, com direito a recorde olímpico. Owens tremia. Depois de uma primeira tentativa curta, o segundo salto havia queimado. O que aconteceu a seguir é contado pelo próprio Owens a Kai Long, filho de Luz, quando o norte americano regressou a Berlim em 1964: "O teu pai veio em meu auxílio. Ajudou-me a medir um pé de distância para a tábua e o mesmo no lugar que costumo correr. Consegui acertar mesmo no meio entre as duas marcas e foi assim que consegui a classificação". Foi o ponto de partida para a amizade entre Luz e Owens. No meio, houve um duelo espetacular na final. O norte americano saltou para a liderança na segunda tentativa, com 7,87 metros, mas o alemão, impulsionado pela torcida, não desistiu e levou o público ao delírio, chegou ao empate com Owens. Logo a seguir, Owens aumentou o salto em sete centímetros. Aí, o alemão queimou o salto e perdeu a luta. Owens ainda não havia saído da caixa de areia quando Luz correu e o abraçou. O público ainda estupefato viu Luz desfilar abraçado com Owens comemorando a vitória. Não o perdoariam pela amizade com um negro. Foi mandado para a frente de batalha na Itália onde morreu alvejado na coxa. Sangrou pela amizade.

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