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Economia

Com ação "formiguinha", trabalhador rala todo ano para ser campeão da reciclagem

Programa ambiental virou referência nacional e garante certificação pioneira de sustentabilidade

Por Inara Silva | 12/12/2025 08:48
Com ação "formiguinha", trabalhador rala todo ano para ser campeão da reciclagem
Marcos Roberto Barbosa de Souza, 51 anos, contribui com arrecadação de recicláveis. (Foto: Paulo Francis)

Marcos Roberto Barbosa de Souza, 51 anos, chega à empresa todos os dias pilotando uma moto Bis com um saco amarrado na garupa. Dentro dele estão garrafas, papelão, plásticos e até vidros, materiais que muitas vezes são descartados, mas que para ele representam propósito, renda extra e compromisso com o meio ambiente. A rotina de Marcos é também a de grande parte dos 210 funcionários do Grupo Real, em Mato Grosso do Sul.

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O Grupo Real, em Mato Grosso do Sul, conquistou o selo de primeira agroindústria do Estado certificada pelo Programa ESG-FIEMS através do Programa Ciclos, iniciativa que incentiva práticas ambientais sustentáveis. O programa, criado em 2007, já desviou mais de 1,4 milhão de quilos de resíduos do aterro sanitário. Entre os destaques está o trabalho do funcionário Marcos Roberto Barbosa de Souza, que coleta diariamente materiais recicláveis em sua motocicleta. A empresa premia mensalmente os colaboradores que mais arrecadam, além de investir em energia solar e reaproveitamento de água da chuva, demonstrando compromisso integral com a sustentabilidade.

O auxiliar de linha de produção mantém esse hábito desde 2015, quando entrou para a empresa Real H, em Campo Grande. Ele chama de “trabalho de formiguinha”, pois coleta, organiza, higieniza e entrega tudo pronto no Programa Ciclos, iniciativa criada para incentivar boas práticas ambientais dentro da indústria e que garantiu ao Grupo Real o selo de primeira agroindústria do Estado certificada pelo Programa ESG-FIEMS (Ambiental, Social e Governança - da Federação da Indústria de Mato Grosso do Sul).

A certificação foi conquistada após a empresa cumprir 69 indicadores de boas práticas ambientais, sociais e de governança estabelecidos pela iniciativa "Who Cares Wins", do Pacto Global da ONU, em parceria com o Banco Mundial e instituições financeiras. O Programa Ciclos tornou-se referência nacional ao integrar o grupo de 6 casos brasileiros escolhidos para ser apresentado na COP 30, conferência global sobre mudanças climáticas que foi realizada em novembro, em Belém (PA).

Com ação "formiguinha", trabalhador rala todo ano para ser campeão da reciclagem
Gerente Industrial da Real H, João Paulo Anjos, e Supervisor de Qualidade, Júlio Morais (Foto: Paulo Francis)

Concorrência - Pelas regras da empresa, mensalmente, os 12 colaboradores primeiros colocados em arrecadação de reciclados recebem prêmio em dinheiro. Os demais, que coletarem acima de 4 kg mensais, ganham itens da cesta básica, conforme a pontuação. Marcos tem orgulho em dizer que nunca ficou em 12º. “Se eu não sou o número um, estou entre os primeiros”, afirma.

Somente em novembro, transportando em sua motocicleta, coletou uma tonelada de recicláveis e garantiu o primeiro lugar. “É todo dia um ou dois sacos, uma ou duas viagens. Igual formiguinha. Quando vê, no fim do mês, virou um montão”, diz o auxiliar, que já trabalhou também como pedreiro e coletor de resíduo urbano na Capital. Ele afirma que hoje encontrou o lugar onde pretende se aposentar.

O trabalho de Marcos ultrapassa os muros da empresa. Ele recolhe materiais de vizinhos, amigos e comércios do bairro, sempre explicando como o programa funciona. “Eu separo o que é lixo e trago só o que dá para reaproveitar. Todo mundo me ajuda. Eles falam: ‘pode vir buscar e eu vou.” Até a filha de seis anos, Maria Cristiane, participa da rotina. “Ela me ajuda a recolher. O prêmio que eu ganho eu pago água, luz e às vezes uma coisinha para ela. Este mês ganhei R$ 200.”

Com ação "formiguinha", trabalhador rala todo ano para ser campeão da reciclagem
Sócio-proprietário, Mário Renck Real, foi o idealizador do Programa Ciclos (Foto: Paulo Francis)

Origem - O Programa Ciclos nasceu em 2007, pela iniciativa do diretor técnico-industrial e sócio-proprietário, Mário Renck Real, que identificou a necessidade de estruturar a destinação de resíduos, em uma época em que pouco se falava sobre ESG e três anos antes da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

A iniciativa ganhou força, envolveu famílias de funcionários, parcerias com escolas e apoio da comunidade, até se transformar em um projeto oficial dentro da empresa, estruturado e em expansão contínua.

O Ciclos se tornou referência em sustentabilidade, reconhecimento que Mário não imaginava quando iniciou o processo. Para ele, o maior impacto está no efeito multiplicador: toneladas de resíduos desviados do aterro e iniciativas semelhantes surgindo em outros espaços. “Prefiro fazer alguma coisa do que não fazer nada”, resume o idealizador.

O programa cresceu a ponto de ganhar um Departamento de Sustentabilidade, responsável por todo o fluxo de recebimento, separação, venda dos recicláveis e contratação de empresas certificadas para a destinação do que não pode ser reaproveitado. O único reciclável que a própria empresa destina internamente é o vidro, por conta da falta de locais adequados para envio. O material arrecadado é triturado e transformado em cascalho, utilizado nas vias internas e na jardinagem dentro da empresa. Supervisor de Qualidade, Júlio Morais explica que o produto fica sem ponta e não oferece risco de cortar pneus.

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Colaborador mostra vidro triturado, que é usado como cascalho. (Foto: Paulo Francis)

Recursos - Além da gestão ambiental, o programa gera resultados diretos para os colaboradores. Os materiais recicláveis são vendidos e o valor arrecadado abastece o caixa do Ciclos, que financia ações como Outubro Rosa, Novembro Azul, Setembro Amarelo, festas internas, como o Dia das Crianças, e premiações para os funcionários. A ampliação foi tanta que a empresa mantém hoje uma central de coleta de recicláveis na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, no bairro Monte Líbano.

Estrutura - Morais explica que o Ciclos é coordenado por um comitê interno que reúne gestores e colaboradores, responsável por direcionar ações ambientais, sociais e de governança. A empresa destina também recursos para patrocínio de projetos culturais,  educacionais e esportivos.

“Ele nasceu na reciclagem, mas hoje é um programa completo, com políticas internas, atendimento à legislação, logística reversa e documentação exigida pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) e órgãos ambientais”, afirma.

Um dos destaques é o atendimento integral à Política Nacional de Resíduos Sólidos, com parceiros devolvendo embalagens dos produtos, o chamado ciclo total. “Mando embalagem para eles, e eles voltam com a embalagem. Hoje a empresa é totalmente aderente à logística reversa”, explica Júlio Morais.

Com ação "formiguinha", trabalhador rala todo ano para ser campeão da reciclagem
Torneira identifica no jardim que a água não é potável, (Foto: Paulo Francis)

Energia - Embora o programa seja conhecido principalmente pela coleta e reciclagem, entre 2021 e 2022, a empresa investiu mais de R$ 2 milhões em placas fotovoltaicas instaladas nas unidades de Campo Grande e Cuiabá (MT). De acordo com o supervisor, o sistema hoje opera com capacidade superior ao consumo, devolvendo à rede a energia excedente produzida.

O gerente industrial, João Paulo Anjos, explica que a autossuficiência não se limita a uma única planta. São três usinas fotovoltaicas em operação: uma no laboratório homeopático, outra na fábrica de nutrição e uma terceira na unidade de Cuiabá. A produção combinada já responde por 80% a 90% de toda a energia consumida pelo grupo.

A política de reuso de água também faz parte desse movimento mais amplo de responsabilidade ambiental, com capacidade de armazenamento superior a 500 mil litros de água de chuva, tratada e reutilizada para limpeza externa, jardinagem e sanitários, em um sistema totalmente independente da água potável proveniente de poço próprio.

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Toneladas de recicláveis arradadas mensalmente são levadas para Programa Ciclos (Foto: Paulo Francis)

Desde sua implantação, em 2007, o Ciclos já:

  • enviou mais de 1,4 milhão de quilos de resíduos para reciclagem;
  • evitou a emissão de 1.355 toneladas de CO₂;
  • converteu toda a matriz energética para sistemas fotovoltaicos;
  • implantou sistemas de captação e reaproveitamento de água da chuva.

Por causa de todo esse trabalho, a empresa também acumula outros dois reconhecimentos: o Great Place to Work, que atesta um ambiente interno positivo e acolhedor para os colaboradores, e o Selo Verde Chico Mendes, certificação socioambiental que comprova o compromisso da organização com práticas reais de sustentabilidade em suas operações.

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