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Economia

Fila de espera do INSS agrava quadro de miséria e desespero das famílias

Com mais de 18 mil famílias a espera da concessão de benefícios, buscar a Justiça pode ser um caminho

Rosana Siqueira e Danielle Errobidarte | 21/01/2020 08:42
Pessoas aguardavam em frente à agência da Rua Anhanduí. (Foto: Silas Lima)
Pessoas aguardavam em frente à agência da Rua Anhanduí. (Foto: Silas Lima)

Desespero, miserabilidade e até ameaça de suicídio são situações relatadas por muitas das 18,6 mil pessoas que estão na fila de espera por benefícios do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) no Estado. Diante do quadro crítico, procurar a Justiça pode ser o único caminho para tentar fazer andar estes processos.

Mesmo com a promessa de criação de uma força-tarefa convocando os militares da reserva para ajudaram a atender a demanda pelos benefícios no órgão, o Governo Federal ainda terá dificuldade para colocar o plano em ação. Isso deve demorar no mínimo, alguns meses. 

O alerta é da advogada especialista em Previdência Social, Priscilla Arraes Reino, ao avaliar a situação de caos que se instalou em todo País, e a fila de espera que se avoluma no Estado. “Acredito que este número de 18,6 mil é subestimado no Estado. Se pensar que no Brasil temos 1,4 milhão de pessoas esperando uma decisão há mais de 45 dias que é o prazo que o INSS tem para analisar ou indeferir um pedido, a gente tem um numero que não fecha”, enfatizou.

advogada conta que convive diretamente com a situação de desespero de algumas famílias. E mais, ela ainda teme pelo grave problema social que isso se tornou. “São 18.673 famílias esperando para saber o que vai ser de suas vidas. Muitas vezes sem nenhuma renda. Sem poder comprar a cesta básica. Gente doente, aguardando auxílio, salário maternidade que sai muitas vezes depois que a pessoa já terminou a licença. É preciso analisar esta situação pelo ponto de vista humano”, esclarece a advogada.

A educadora física Janine Collante, de 33 anos, sofreu um acidente com moto em 2-017. Ela ficou paraplégica e busca o benefício para pessoa com deficiência através da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Ela não sabia que tinha direito a salário e só deu entrada no pedido em janeiro de 2019. "Mesmo que tarde, dois anos após o meu acidente, já faz um ano que estou esperando e hoje vim fazer apenas o atendimento com a assistente social. Ainda preciso fazer o exame físico para comprovar a deficiência e a assistente não conseguiu nem marcar data ainda".

A situação de Janine pode ser a de muitos, que não têm conhecimento de que é direito receber o benefício. "Eu não sabia que podia, 'descobri' quando um agente de saúde foi visitar minha casa, conversou comigo e me encaminhou ao CRAS para conversar com uma assistente social do próprio bairro. Depois, me encaminharam para cá".

Janine sofreu acidente de moto e nem sabia que era direito seu pedir benefício do LOAS. (Foto: Silas Lima)
Janine sofreu acidente de moto e nem sabia que era direito seu pedir benefício do LOAS. (Foto: Silas Lima)

A advogada conta que, em meio a tantos requerimentos, que vão de pensão por invalidez, aposentadoria por idade e outros, tem casos de pessoas que aguardam o INSS implantar o benefício que já foi concedido. "Mesmo concedido judicialmente ou administrativamente eles têm demorado mais tempo do que o normal. Ou seja quando defere na Justiça o requerimento, tem 45 dias para entrar em vigor. Isso não está acontecendo e demora hoje de 2 a quatros meses para acontecer a liberação. Tenho clientes que estão a ponto de cometer suicídio, porque estão há anos esperando. Agora saiu decisão favorável e estão esperando o INSS cumprir. Isso é uma política que precisa mudar. Não podemos permitir uma coisa dessas. Que uma vida se perca porque por conta do atraso. Nos vamos perder vidas por causa disso”, enfatiza.

A crise na Previdência se arrasta há anos mas foi agravada pela redução no número de servidores e as mudanças na Reforma da Previdência que ajudaram a elevar ainda mais a busca por aposentadorias no último ano. “É preciso fazer concurso. Nós temos 5 mil servidores do INSS atuando hoje e mais 50% dos servidores tem condições de se aposentar e vão fazê-lo até o final de 2020. Ou seja o contingente cairá para 2.500 servidores públicos para responder por 1 milhão de pedidos mensais. É muito serviço, e não é culpa do servidor. Precisamos dizer que eles estão sobrecarregados, com cargas de trabalho homéricas. É impossível eles fazerem frente a uma demanda que vem crescendo ano a ano”, enfatizou.

Militares - Em relação a proposta do Governo federal de escalar militares da reserva para atuarem numa força tarefa no INSS, a advogada é bastante cautelosa. “Entendemos que é preciso uma medida emergencial. No entanto precisamos ver que sem conhecimento técnico e sem preparo será difícil. Nós já temos represados quase 2 milhões de pedidos´. E a demanda é imediata. O próprio alto comando militar estipula que seria necessário de 3 a 4 meses para preparar este pessoal. Portanto não teremos militares nos ajudando de início, embora seja louvável a decisão do Governo de trazer militares, de resolver emergencialmente. Além disso isso seria uma questão contingencial . O que precisa é definir metas e soluções não para hoje mas para resolver o problema de forma permanente”, destacou a especialista.

Marcelo aguardava com o filho de sete meses desde as 6h. (Foto: Silas Lima)
Marcelo aguardava com o filho de sete meses desde as 6h. (Foto: Silas Lima)

Justiça - A judicialização é um caminho para quem está esperando pelo benefício. “Muita gente que poderia estar recorrendo ao INSS vai acabar apelando para a Justiça. Porque eles pensam: Para que esperar um recurso decidir daqui 3 anos, se na Justiça tenho decisão mais rápida. Então a gente está aí batendo cabeça porque enquanto Governo diz que quer reduzir judicialização ao mesmo tempo ele toma atitudes que aumentam os processos na Justiça”, analisa.

“Isso vai aumentar muito se a gente não mudar a política de imediato. Se o Governo não mudar radicalmente sua postura com relação a este assunto, as ações na Justiça vão crescer”, alerta.
Ela lembra que pela lei, o INSS tem 45 dias para decidir sobre o encaminhamento do benefício. “Se vai pedir documentos, se tem que marcar perícia, tudo isso tem que ser encaminhado em 45 dias para sair uma decisão de deferimento ou indeferimento. Se o INSS não cumpre o prazo neste caso, o beneficiário pode procurar a Defensoria da União para impetrar ou fazer um mandado de segurança para obrigar o INSS a tomar uma decisão”, explicou Priscilla.

Meire Bortolini, de 55 anos, tem depressão e buscou a Agência do INSS que fica na Rua Anhanduí, na manhã de hoje (20). Era é pedagoga e conselheira tutelar, mas há 5 anos está afastada para o tratamento, que durante esses anos incluiu cuidados reumatológicos. "Primeiro pedi apenas três meses, depois um ano e até hoje não consegui voltar a trabalhar. Por ironia, trabalhava no atendimento de crianças que precisavam de ajuda, e hoje eu quem preciso".

Quando se entra com um mandado de segurança o juiz determina que em 10 dias o INSS preste informações. “Este é caminho que a gente tem encontrado, infelizmente para que INSS tome atitude de decidir. Essa situação vai aumentar isso, a demanda judiciária. Além disso os processos não se tratam apenas de deferir ou indeferir os pedidos, mas sim pedir que INSS tá atrasando até mesmo a concessão de benefícios já aprovados, o que é mais sério ainda”, salientou a advogada.

Estas pessoas precisam dos benefícios para atender necessidades básicas. “São benefícios para fazer frente a despesas essenciais de todo mundo. Se você buscou este direito, você tem que ter reconhecido no prazo legal. Não é possível ter gente esperando 3 a 4 anos por decisão. Tenho cliente que tem câncer que está em fase terminal que ainda não tem decisão. Não é possível isso não pode mais ocorrer”, conclui a advogada.

Marcelo Luiz Antunes chegou em Campo Grande por volta das 6h desta segunda-feira (20). Ele espera, por tempo indeterminado, a esposa receber atendimento, previsto para as 10h. Ele veio de São Gabriel do Oeste, a 140km da capital. "Saímos as 4h da nossa cidade e preciso ficar aqui esperando, com meu filho de sete meses. Não temos onde deixá-lo. Ela fez cirurgia para não engravidar mais e não pode voltar a trabalhar agora".

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