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Esportes

De ídolo do futebol a gerente de loja de tapeçaria, a vida fora dos gramados

Paulo Nonato de Souza | 03/05/2017 09:26
O ex-meia-esquerda Pastoril em frente da loja que gerencia no bairro Santo Amaro, em Campo Grande (Foto: André Bittar)
O ex-meia-esquerda Pastoril em frente da loja que gerencia no bairro Santo Amaro, em Campo Grande (Foto: André Bittar)

Há vida fora dos gramados. Exatos 26 anos depois de encerrar a carreira aos 38 anos de idade, jogando pela Sociedade Esportiva Ponta-poranense, de Ponta Porã, em 1991, o ex-meia-esquerda Pastoril, de 64 anos, ídolo do Vasco da Gama, Atlético Mineiro e do Operário de Campo Grande nas décadas de 1970 e 1980, garante que se sente feliz em ser reconhecido hoje simplesmente como José Alberto dos Santos, seu nome de batismo.

Sem nenhum embaraço ou vergonha pela nova atividade que realiza, o craque que em 1971, recém promovido das categorias de base do Vasco do Gama, quase foi trocado pelo então igualmente jovem e inexperiente Zico, do Flamengo, diz que encontrou uma função que, se não é a que sonharia, pelo menos é a que o tirou da ociosidade.

De exímio batedor de faltas, habilidoso e um verdadeiro mestre na arte de dominar a bola e criar espaços com seus lançamentos precisos, Pastoril virou gerente de uma loja de móveis, a Tapeçaria Art Moderna, no bairro Santo Amaro, em Campo Grande.

“Dou graças a Deus por ter amigos. Eu estava parado, sem nada para fazer, e aí fui convidado pelo meu parceiro Alex Loureiro, o popular Zé Galinha, para gerenciar a loja de tapeçaria, e aqui estou desde 2012. Não posso dizer que é onde eu gostaria de estar, mas estou feliz aqui”, disse Pastoril, sem esconder que seu desejo era continuar trabalhando no futebol depois que encerrasse a carreira de jogador.

Time de juniores do Vasco da Gama em 1971. Em pé: Gilberto, Marcelo, Brasília, Gaúcho, Zé Luiz e Baiano. Agachados: Nenen, Paulinho Jaú, Pastoril, Roberto Dinamite e Colatino (Foto: Arquivo/Site do Vasco da Gama)
Time de juniores do Vasco da Gama em 1971. Em pé: Gilberto, Marcelo, Brasília, Gaúcho, Zé Luiz e Baiano. Agachados: Nenen, Paulinho Jaú, Pastoril, Roberto Dinamite e Colatino (Foto: Arquivo/Site do Vasco da Gama)
Operário, campeão estadual de 1981. Em pé: Carlos Alberto; Amarildo, Cocada, Cassiá, Leandro e Ivo; Agachados: Vergara, Jones, Arturzinho, Pastoril e Cleber (Foto: Arquivo/Divulgação)
Operário, campeão estadual de 1981. Em pé: Carlos Alberto; Amarildo, Cocada, Cassiá, Leandro e Ivo; Agachados: Vergara, Jones, Arturzinho, Pastoril e Cleber (Foto: Arquivo/Divulgação)

A profissão de gerente de loja de tapeçaria o tirou da ociosidade, mas não lhe devolveu o status que tinha como jogador de sucesso. Longe disso, ele segue na dura realidade do cotidiano, mas sem arrependimentos nem sofrimento pelo ostracismo ou falta de dinheiro que a vida fora do futebol lhe proporciona.

“Não tive sofrimento quando parei de jogar e não tenho até hoje. O jogador tem que estar psicologicamente preparado, porque não é só se preparar para jogar, e preciso se preparar para parar. Quando chega a hora de parar é preciso encarar muito mais coisas que encaramos durante a carreira, e eu soube me preparar. Tive a sorte de ter o apoio da minha esposa, minha grande companheira”, ressaltou Pastoril.

Mineiro de Governador Valadares, Pastoril surgiu para o futebol nas categorias de base do Vasco da Gama em 1969, mesma época de Roberto Dinamite, maior ídolo da história vascaína.

“Eramos dois garotos surgindo da base, e o Paulo Amaral, que era o treinador do time principal, optou pelo revezamento para evitar pressão sobre nós. Quando eu jogava o Roberto ficava no banco, e quando o Roberto jogava era minha vez de esperar”, comentou Pastoril.

Pastoril foi revelado pelo Vasco da Gama na mesma safra de Roberto Dinamite (Foto: André Bittar)
Pastoril foi revelado pelo Vasco da Gama na mesma safra de Roberto Dinamite (Foto: André Bittar)

Em 1971, com 18 anos de idade, e disputado por Flamengo e Botafogo, o Vasco da Gama por pouco não concretizou uma troca com seu maior rival que poderia ter mudado não apenas a trajetória, mas o destino de dois craques do futebol brasileiro.

“O Flamengo insistiu para me contratar e fez uma proposta de troca pelo Geraldo (o meia Geraldo Cleofas Dias Alves, que morreu em 1976 aos 22 anos de idade em reação à anestesia para uma operação de amígdalas), mas o Vasco não aceitou. Diante da insistência do Flamengo, o Vasco topou fazer negócio nas seguintes condições: desde que a troca fosse pelo Zico. Aí o Flamengo não aceitou”, lembrou Pastoril.

No mesmo ano, ou seja, no dia 29 de julho de 1971, lá estava Pastoril no gramado do Maracanã, só que pelo Vasco da Gama, na estreia de Zico no Flamengo em jogo pela Taça Guanabara. O Flamengo venceu por 2 a 1, Zico jogou como ponta-direita e só se firmou na condição de titular a partir de 1974.

Ambos tinham praticamente a mesma idade, mas se Zico ainda era reserva do Flamengo, Pastoril já tinha seu lugar de titular no Vasco da Gama. Nesse dia, o técnico Paulo Amaral escalou o Vasco para encarar o Flamengo com Andrada, Fidélis, Moisés, Renê e Batista; Gaúcho (depois Benetti) e Pastoril; Jaílson (depois Valfrido), Ferreti, Dé e Rodrigues.

“Joguei em vários outros clubes do Brasil, mas sou muito grato ao Vasco da Gama pela oportunidade que o clube me deu no futebol. O Vasco faz parte da minha vida”, frisou.

Pastoril com a equipe do Campo Grande News no interior da loja. Não é onde eu gostaria de estar, mas estou feliz, disse ele (Foto: Pedro Peralta)
Pastoril com a equipe do Campo Grande News no interior da loja. Não é onde eu gostaria de estar, mas estou feliz, disse ele (Foto: Pedro Peralta)

Além do ídolo Roberto Dinamite, Pastoril teve vários outros astros do futebol brasileiro como companheiros na sua época de Vasco da Gama, mas um ele considera especial: o ex-atacante Tostão, tricampeão mundial pela Seleção Brasileira na Copa de 70 no México.

“O Tostão é uma daquelas pessoas que você não encontra palavras para uma definição. Eu ainda era só um garoto e não abandonei o futebol porque o Tostão me convenceu a não desistir da minha carreira”, lembrou Pastoril.

Pastoril diz que lembra do episódio com tristeza. Em um jogo do Campeonato Brasileiro de 1972, contra o Santos, diante de um Maracanã lotado, Pastoril foi sacado no intervalo pelo treinador Mário Travaglini.

“Foi uma trairagem de um companheiro que prefiro nem citar o nome dele, mas vi quando ele desceu a escadaria do vestiário do Maracanã com o braço no ombro do Travaglini. Quando chegamos no vestiário, o Travaglini pediu para eu descansar. Fiquei muito chateado porque eu estava jogando bem, e o Tostão ficou os 15 minutos do intervalo conversando comigo”, contou o ex-jogador.

Em Mato Grosso do Sul - Do início de carreira no Vasco da Gama em 1971 até o seu último clube, a Associação Atlética Ponta-poranense, em 1991, foram 20 anos como profissional do futebol. Pastoril chegou para o Operário de Campo Grande em 1981, depois de defender o Mixto de Cuiabá, Goiás e Atlético Mineiro.

“Cheguei no Operário para o Campeonato Brasileiro. O Castilho (o lendário treinador Carlos Castilho) precisava de um canhoto que jogasse pela direita e eu consegui me encaixar. Fiz minha estreia com vitória de 2 a 1 diante da Desportiva, em Vitória, no Espírito Santos, e eu fiz um dos gols.

Embora seja mineiro e tenha jogado em vários outros estados, como Rio de Janeiro, Mato Grosso, Goiás, Paraná e Santa Catarina, Pastoril escolheu Mato Grosso do Sul para viver ao encerrar a carreira.

“Poderia ter voltado para Minas Gerais, mas, como diz o ditado, quem bebe dessa água não esquece jamais. Aqui casei, tive meus filhos, fiz grandes amigos e aqui eu continuo a levar a minha vida”, disse.

No futebol sul-mato-grossense, Pastoril fez sucesso no Operário, é considerado um dos ídolos da história do clube, foi campeão estadual em 1981 e da Copa Kirim de 1982 na Coréia do Sul, mas ganhou título também pelo maior rival do alvi-negro campo-grandense, o Esporte Clube Comercial, em 1987. “Fizemos a final do Estadual com o Corumbaense e nós ganhamos”, lembrou Pastoril.

No Operário, Pastoril jogou de 1981 a 1983. Segundo ele, a passagem pelo clube campo-grandense teve um significado fundamental na sua vida como jogador de futebol. “Depois do Vasco, onde vivi grandes momentos, foi no Operário que tive uma das melhores participações em Campeonatos Brasileiros da minha vida. Acho que nem posso dizer que foi bom, foi mais do que isso, foi ótimo ter jogado no Operário, ter trabalhado com o treinador Carlos Castilho, um mestre”, declarou.

Só o apelido - Já se vão 36 anos de ligação com Mato Grosso do Sul. Do jeito mineiro de ser não restou nem mesmo o sotaque, única exceção é o apelido de Pastoril, que o acompanha desde que saiu de Governador Valadares.

“Pastoril é o mesmo nome do bairro onde eu nasci em Valadares, o bairro Pastoril, do colégio onde estudei, o Colégio Estadual Pastoril, e do time que eu joguei quando era criança lá na minha cidade, o Clube Atlético Pastoril, que nem existe mais”, revelou o ex-jogador.

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