ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SEXTA  26    CAMPO GRANDE 33º

Arquitetura

Julieta partiu e deixou saudade do sorriso que brilhava na varanda de madeira

Casa antiga foi deixada por uma das moradoras da Vila Bandeirante, lembrada pela alegria.

Thailla Torres | 09/01/2018 09:44
Casa de madeira pertencia a  Julia, que nunca abriu mão das tábuas por qualquer parede de alvenaria, lembra o filho.
Casa de madeira pertencia a Julia, que nunca abriu mão das tábuas por qualquer parede de alvenaria, lembra o filho.

A casa é antiga e fica em um terreno estreito, na Vila Bandeirantes. Mas há três anos o dono encarou um pintura alegre, para deixá-la mais iluminada. Foi um presente para mãe Julieta Cabreira, que partiu meses depois da pintura. Sempre encantada com a arquitetura de madeira torta, dona Julieta nunca abriu mão das tábuas por qualquer parede de alvenaria, lembra o filho.

"Ela amava essa casa, não trocava por nada. Sempre fomos uma família humilde, mas tínhamos condições de construir uma casa melhor pra ela, porém nunca quis", explica o filho Ari Rech Cabreira, de 63 anos.

Hoje a residência está fechada, apenas sem os pertences da mãe que foram doados, mas com estrutura intacta até que o processo de inventário seja concluído. Quem ama a combinação de madeira e cores, passa encantado em frente a residência com muro que bate na cintura e uma calçada que parece a extensão do quintal.

Ari mostra retrato de Julieta. (Foto: Thailla Torres)
Ari mostra retrato de Julieta. (Foto: Thailla Torres)

"Depois que ela se foi, muita gente bate aqui perguntando se ela está à venda. Algumas vizinhas já disputam a compra", diz o filho.

Apesar da casa ser uma das melhores lembranças, a história com a madeira está com dias contados. "Depois que eu herdar definitivamente, vamos vender", resume.

Na vila, o endereço foi durante anos o ponto de encontro da vizinhança. Julieta era professora e uma mulher política. Do tempo que não havia presidente de bairro e a vila era um ponto esquecido, ela governava levando os interesses da comunidade até o Centro. "Quando tinha comícios, era ela quem ia lá conversar e falar das melhorias, do que o povo pedia, minha mãe sempre gostou de ser política, acho que era o sonho dela".

Por isso o nome do filho foi inspirado em Ary Coelho que ocupou o cargo de prefeito em Campo Grande. "Ela dizia que era uma homenagem". 

O gramado e o pé de manga no quintal era cenário para os encontros no fim da tarde. "Minha mãe reunia toda a mulherada da rua no fim da tarde. Eram melhores amigas e naquele tempo ninguém tinha celular. Então a conversa era aqui, com cafezinho e bolo", recorda.

Assim como Julieta, algumas amigas da rua também já partiram, mas o filho e a neta garantem que até hoje é lembrada no bairro. "Sempre que encontramos alguém, falam da alegria da minha vó. Ela era sempre muito sorridente e falante, acabou ficando marcada na vila, conta a neta Amanda Cabreira Romero, de 35 anos.

Neta e filho são quem cuidam da casa. (Foto: Thailla Torres)
Neta e filho são quem cuidam da casa. (Foto: Thailla Torres)

Outro detalhe é que o bairro cresceu, ficou cheio de muros, mas Julieta nunca quis proteger a fachada. "Antes não tinha esse muro pequeno e nem o portão. Todo mundo foi fechando as casas, menos ela, dizia que assim ela tinha paz. Por isso a criançada adorava brincar aqui. As calçadas são enormes e virava um campinho", conta o filho.

Julieta se aposentou aos 50 anos por conta do glaucoma que a fez parar de enxergar de um olho. Mas levava uma vida tranquila, até que o diagnóstico de câncer aos 80 anos, lhe tirou a saúde. "Foi câncer na tireoide. Mesmo assim ela ficou bem, ia na quimioterapia, fazia o tratamento como se não tivesse nenhum problema", lembra o filho.

De manhã, quem passava na rua via Julieta sentada um banquinho na varanda pequena. "Era justamente por isso que ela não queria muros, podia cumprimentar todo mundo que passava", lembra.

Mas dois anos depois de tratamento, ela foi internada e os médicos não deram expectativas. "Disseram que o caso era grave e estava em fase terminal. Uma semana depois ela faleceu", diz Ari.

De tão conhecida, a neta diz nunca ter visto um velório tão cheio. "Foi a vizinhança inteira, amigos e até pessoas que só ouviam falar bem dela. Muita gente sente falta do seu sorriso ali na varanda"

Curta o Lado B no Facebook e Instagram.

Casa tem muro baixo porque era um dos desejos de Julieta. (Foto: Thailla Torres)
Casa tem muro baixo porque era um dos desejos de Julieta. (Foto: Thailla Torres)
Nos siga no Google Notícias