ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
MARÇO, TERÇA  19    CAMPO GRANDE 25º

Comportamento

Aos 80 anos, Carlito não abre mão da camisa social para vender água de coco

Ele está há 20 anos no mesmo local e até o pé de figo que faz sombra para a barraquinha foi ele quem plantou

Alana Portela | 23/10/2019 08:38
Carlito Barbosa oferece água de coco para as pessoas (Foto: Alana Portela)
Carlito Barbosa oferece água de coco para as pessoas (Foto: Alana Portela)

Aparência é tudo, diz Carlito Barbosa. Aos 80 anos, ele mantém o estilo e usa traje social para vender água de coco e garapa. Já virou um personagem de Campo Grande. “Estou sempre bem-arrumado porque esse tipo de trabalho precisa. A roupa é meu uniforme e já venho de casa bem-vestido. Tem de andar limpo e ser asseado porque é um produto manipulado”, diz.

Ele é vaidoso e na lateral do carrinho, colocou um espelho tanto para ele quanto para os clientes darem uma retocada no visual. “Esse espelho tem história. Há um tempo, um carro bateu e caiu o retrovisor dele, mas ninguém pegou da rua e quando vi, o espelho estava intacto. Colei no carrinho e percebi que as pessoas se levantavam e se arrumam. Aí comprei esse maior na intenção de facilitar”.

A garaparia fica na esquina da Avenida Mato Grosso com a rua João Akamine, no Jardim dos Estados há 20 anos. Cansou-se da vida de caminhoneiro quando comprou pela primeira vez uma máquina de fazer garapa.

A ideia surgiu, pois, quando criança, Carlito morava numa fazenda e via seu pai trabalhando na lavoura. Por lá, tinha muita cana e coqueiro. “Cana é fácil pegar, mas o coco precisa de muita água”, conta.

Ele usa o espelho para manter a aparência (Foto: Alana Portela)
Ele usa o espelho para manter a aparência (Foto: Alana Portela)

“Deixei a estrada, comprei máquina e trouxe para esse ponto. Plantei esse pé de figo aqui, coloquei um banco de madeira em volta para os clientes se acomodarem porque quando pedi a licença na prefeitura, eles disseram que não deveria ter nada solto na calçada ou na rua”, lembra.

Na época, vendia bem e com o dinheiro que recebia, sustentava a esposa e ajudava os três filhos. “No início o copo da garapa era R$ 1. O pessoal comprava bastante porque era barato aqui nesse ponto não tinha ninguém fazendo esse serviço”, diz. Os moradores aproveitaram os dias de sol para sentar na sombra e adoçar a boca.

Contudo, duas décadas depois o preço do copo subiu para R$5 e a água de coco é vendida R$6. Carlito trabalha no local de segunda a sexta, das 9h às 17 e aos sábados das 9h às 11h. Recebe benefício da Lei Orgânica da Assistência Social, mas insiste em continuar na ativa. “É minha distração. Os idosos chegam numa certa idade e se acomodam, acho isso um erro porque é aí que aparecem as doenças e enferruja. Tenho medo de enferrujar”, brinca o garapeiro.

Ele furando o coco para vender (Foto: Alana Portela)
Ele furando o coco para vender (Foto: Alana Portela)
Garapa é servida no copo (Foto: Foursquare)
Garapa é servida no copo (Foto: Foursquare)

Com o passar dos anos, os produtos deixaram de ser novidade no local e o movimento caiu. Hoje, são pouquíssimas pessoas que param, cerca de um cliente a cada uma hora de trabalho. Contudo, Carlito é paciente e em sua cadeira de fio, se acomoda e aguarda.

“Tem dia que está vazio, não aparece muita gente, mas sou persistente. Gosto de ficar sentado nessa sombra e esperar o tempo passar. Compro todos os dias às mercadorias e fico até conseguir vender um pouco. Enquanto estou aqui, minha esposa Clarice fica cuidando de casa e me incentivando”, relata.

Carlito aproveita do carisma e usa a sua simpatia para conquistar cada um que passa por lá. Assim que alguém se aproxima, ele abre um sorriso no rosto e cumprimenta. “Bom dia, boa tarde meu querido. Vai um caldo de cana ou água de coco hoje? Está fresquinha”, anuncia.

Se a pessoa aceita, ele já prepara. Coloca a cana para moer e um copo perto da máquina, onde o caldo vai sair. Enquanto isso, corta um limão e pega gelo em bloquinhos e acrescenta na bebida. Se é coco, ele vai ao armazém que fica ao lado, pega da geladeira e corta a parte de cima num piscar de olhos. São anos de experiência e dedicação ao seu negócio.

Assim que o cliente recebe o que pediu, ele oferece o banco para se sentar e ainda bate-papo, para descontrair. Se deixar por ele, a conversa vai longe.

Um banco de madeira foi instalado ao redor de uma árvore (Foto: Alana Portela)
Um banco de madeira foi instalado ao redor de uma árvore (Foto: Alana Portela)
No local ficam todos os utensílios usados na hora de preparar o caldo de cana (Foto: Alana Portela)
No local ficam todos os utensílios usados na hora de preparar o caldo de cana (Foto: Alana Portela)
Ele mostra como usa a máquina para moer a cana (Foto: Alana Portela)
Ele mostra como usa a máquina para moer a cana (Foto: Alana Portela)

O pouco que ainda recebe é economizado porque tem que se preparar para a compra de outra máquina. “Com o tempo, ela estraga porque é um trabalho pesado. Aí preciso comprar outra porque consertar sai muito caro. Essa minha já tenho há quatro anos”.

Nesses 20 anos, Carlito relata que decidiu manter a barraca na cor azul e amarela. “Foi essa a cor da primeira e eu gosto. Todo ano tento dar uma retocada na pintura. Fiz um teto em cima da máquina para os dias de chuva”.

Curta o Lado B no Facebook e no Instagram

Carlito corta o coco para quem quiser a castanha (Foto: Alana Portela)
Carlito corta o coco para quem quiser a castanha (Foto: Alana Portela)
Nos siga no Google Notícias