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Comportamento

Da tragédia, a esperança de solidariedade

Lucimar Couto | 26/03/2020 10:04

É tudo novo, estranho, solitário, triste. Fiz 60 anos domingo, 22 de março. Não pude comemorar. Meus filhos, netos e uma nora vieram me ver. Tenho duas. A outra, também enfermeira, estava na UTI do hospital cuidando de crianças contra o terrível vírus. Inimigo tão feroz que, ao contrário de qualquer outra guerra, é invisível. O portão não deixou que nos aproximássemos. Não teve abraços, beijos. Meus netos me cumprimentaram com os pés. É a maneira segura para evitar contágio.

Que momento anormal. Há duas semanas estamos, eu e minha esposa, encarcerados em casa. Não saio para nada. O telefone e o computador são meus meios de contato com o mundo real, onde heróis (profissionais da saúde, segurança, serviços essenciais) se jogam de corpo e alma para salvar vidas, mesmo sabendo que podem estar levando para casa, onde os cônjuges e filhos os esperam, o agente infeccioso. O compromisso com a vida está acima de qualquer sacrifício. É a vida, é real.

Lucimar Couto: diretor do Campo Grande News.
Lucimar Couto: diretor do Campo Grande News.

Parece estarrecedor e ao mesmo tempo esperançoso. Assustador com o que a gente está vivendo neste momento. Caos na saúde, pessoas morrendo, cidades mergulhadas nas trevas, toque de recolher, polícia impedindo o seu ir e vir. Lamento, choro, isolamento. Famílias separadas, dor, solidão. Parece filme de ficção, daqueles tantos que a gente vê e não imagina que um dia pudesse se tornar real. Uma realidade que dói, faz chorar e pensar que a luz pode não estar no fundo do poço.

Mas em meio à tormenta, surge um facho de luz. O tempo que parece ter sido tão pouco para tantas desgraças, foi o suficiente para mostrar que temos feitos muita coisa errada. Em pouco mais de 15 dias, a poluição, em cidades abarrotadas de gente, deu lugar ao ar puro, rios cristalinos, solidariedade e, o mais incrível, nenhum animal afetado pelo vírus. O ser humano é o único alvo. É a oportunidade única de a gente rever nossas atitudes, distribuir o bem, dividir com o irmão, ser, enfim, camarada. O abraço, que hoje não pode ser dado, ganha força e na dor da solidão a importância da solidariedade.

Estou em casa, não sei por quanto tempo ainda. Torço para que volte logo a normalidade, não como era antes do vírus. Que as vidas levadas não fiquem apenas nos números, nas estatísticas frias dos burocratas. A gente está acostumado a ouvir dizer que depois do temporal, o sol volta a brilhar, que a bonança virá, mas espero que não fique apenas na retórica, que esse coronavírus mude as pessoas, mude nossa vida, transforme o mundo num lugar melhor para viver.

(*) Lucimar Couto, jornalista, é repórter do Campo Grande News.

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