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Comportamento

Nos corredores do maior hospital do Estado, só elas assumem o cuidado

Mulheres recebem diversos papeis, entre eles um ancestral: o de cuidar dos filhos doentes

Izabela Sanchez | 13/05/2018 09:14
Erivânia Nascimento da Silva e o filho Daniel, de 9 anos (Paulo Francis)
Erivânia Nascimento da Silva e o filho Daniel, de 9 anos (Paulo Francis)

Uma criança de 3 anos chora na cama de hospital, espaço que divide com outras crianças. Ao lado dela, a mãe. Assim é a rotina da Santa Casa, maior hospital de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande. Observando todas as alas, pode-se falar que o hospital é das mulheres: são elas que ficam ao lado dos doentes, filhos ou não, independente de terem outras tarefas para fazer.

A pediatria está lotada de casos de pneumonia, mas também, de histórias de mães que se desdobram para deixar tudo de lado e estarem firmes ao lado dos pequenos. É o caso de Arlinda Brites, 30, do lar. Ela deixou a cidade de Caracol, a 364 km de Campo Grande. A criança de 3 anos que chora sem, parar é o filho, internado com pneumonia.

“O pai mora com a gente, mas ele trabalha. É da mulher, ela que percebe, eu que percebo. Ele reclama pra mim, não para o pai. Não é fácil estar aqui, fico na torcida pra ele estar sadio e voltar pra casa”. Arlinda, ainda assim, admite que os homens deveriam dedicar-se mais ao ato de cuidar. “Sim, são mais as mulheres que ficam, queria que eles se preocupassem mais. Se eu trabalhar eu já perco o serviço por causa dos meus filhos, pra cuidar deles, pra estar junto com eles”.

Arlinda veio de Caracol para acompanhar o filho (Paulo Francis)
Arlinda veio de Caracol para acompanhar o filho (Paulo Francis)

A crítica, no entanto, é quase isolada. Apesar da sobrecarga, as mulheres afirmam que é “o instinto materno” o responsável pela tarefa, mesmo que essa tarefa seja atravessar o Brasil. Maria Auxiliadora, 49, veio de Senador Guiomard, interior do Acre. Ela acompanha o filho, que tem sopro no coração e necessita de um procedimento cirúrgico. O pequeno Thiago tem apenas dois anos e meio.

“Acho que não porque por a gente ser mãe, é um dom que a gente tem, o homem não, o homem é mais pra trabalhar lá fora, no pesado né, e a mulher não, mais carinho, cuidado dos filhos. O homem até tem, tem homem que tem cuidado sim, só que a mulher é mais delicada pra cuidar dos bebês, mas tem homem que cuida excelente. Mas pra ficar no hospital é coisa de mãe”, defende.

Erivania Nascimento da Silva, 32, trabalha como autônoma, produz massas caseiras, mas desde segunda-feira (7) ocupa-se de cuidar do filho Daniel, de 9 anos, internado na Santa Casa com pneumonia. Além do filho internado, ela deixou outras duas crianças em casa e já sofre de saudade.

“Eu acho que as mulheres cuidam melhor dos filhos. Acho que a mulher aprendeu a cuidar melhor. É muito difícil, tenho tido um pouco de prejuízo. É difícil pra mim cuidar dele, mas tem que cuidar né. Tenho mais dois filhos, já chorei bastante porque acabei de falar com os outros dois: 'mamãe vem embora que eu to com saudade'”.

Quem também veio do interior do Estado e deixou tudo de lado para cuidar dos filhos doentes é Cristine Pinho, 31, que estuda e trabalha como autônoma. Ela acompanha a filha Mariá, de 6 anos, que está internada há 6 dias. Para ela, o “cuidado materno” ocorre porque os filhos convivem mais com as mães. Cristine é mãe solteira.

“É sem explicação porque a preocupação aumenta e tem essa necessidade de ver o filho bem então a gente se dispõe a tudo. É uma coisa natural, um instinto materno, que já vem desde o ventre, a gente quer proteger o filho. A gente já sabe o que o filho gosta, tem todo o jeitinho. Os filhos convivem mais com as mães. Sempre tem essa necessidade do pai ter um jeito com o filho. Mas já sou mais acostumada mesmo, eu que sou mãe solteira”.

Cristine afirma que é difícil encontrar tempo para os “turnos” de mãe, estudante e trabalhadora e fala de um cansaço “físico e psicológico”. Pergunto, então, se ser mãe é “solitário”. Ela nega.

“Ser mãe é um estado que você tem que amar seu filho, não tem outro tipo de palavra a não ser amor. Você quer cuidar, quer ver seu filho bem e muitas vezes a gente até deseja estar no lugar deles. Então solitário não diria, diria assim que a gente sempre encontra força, um instinto”.

Sueli está com o filho há 62 dias no hospital (Paulo Francis)
Sueli está com o filho há 62 dias no hospital (Paulo Francis)

É o instinto meio “cão, meio bicho” que Sueli Hashimoto, 60, explica para estar há 62 dias no hospital acompanhando o filho de 29 anos. A aposentada afirma que foi o instinto materno que a fez deixar o interior de São Paulo e vir correndo atender o filho, que “sumiu” após sofrer uma piora dec orrida de um acidente de motocicleta.

“Graças a Deus sou aposentada e posso ficar em tempo integral. Uma mulher bateu no carro dele, não sei de que jeito foi. A gente ficou sabendo do acidente. Ele foi duas vezes no posto, aí o edema cresceu e ele desmaiou dentro da casa dele e sumiu do mapa, aí instinto de mãe...meio cão, meio bicho”, comenta.

O filho, conta ela, foi desacreditado pelos médicos. Mas para Sueli, ser mãe é também acreditar para além das esperanças racionais. “O que uma mãe não faz? Veio eu e meu outro filho. Falei: vamos conversar, trazer ele de volta. Conversa de mãe e filho e irmão pra irmão. Ele estava sem esperança. Esperança era só eu que tinha, eu e o irmão dele e minha família em São Paulo. Hoje ele já recuperou tudo. Eu acho que a mulher tem um instinto materno que é ao mesmo tempo carinhoso, ao mesmo tempo amoroso e ao mesmo tempo de guerreiro né, porque não é fácil aguentar ver um filho jogado na cama”.

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