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Comportamento

Num cantinho no Centro, loja de calçados carrega mais de 53 anos de história

O nordestino José Correa Lima escolheu Campo Grande como lar e, por uma série de fatores, foi parar no ramo dos calçados e cá está até hoje, aos 76 anos de idade

Thaís Pimenta | 27/02/2018 07:45
José Correa Lima é o alagoano a frente da Verlon há mais de 53 anos. (Foto: Paulo Francis)
José Correa Lima é o alagoano a frente da Verlon há mais de 53 anos. (Foto: Paulo Francis)

Se você passar pela Rua 14 de Julho, quase na esquina com a Mato Grosso, sem reparar bem, não vai notar a existência de uma das lojas de sapatos mais antigas de Campo Grande, a Verlon Calçados, que está no mesmo ponto há 53 anos. José Correa Lima, um alagoano de 76 anos, nos recebe com muita simpatia e prosa fácil.

Ele conta que veio para Campo Grande antes mesmo da divisão do Estado, em 1959, porque alguns familiares de seu pai moravam em Mato Grosso do Sul. “A gente sempre foi criado na roça e eu queria morar na cidade, tinha loucura nisso, daí vim pra cá e me encantei com a região, achei bonito demais, o povo era muito bacana também”.

Ao chegar no Estado, foi trabalhar como tratorista em uma fazenda pros lados de Sidrolândia. Lá ficou por sete anos só que um acidente com as máquinas o trouxe até Campo Grande. “Vim ficar na casa da família porque precisei de cuidados mesmo”, comenta.

Depois de recuperado, foi em busca de emprego e o destino se encarregou de colocá-lo na área em que ficaria para o resto de sua vida, dos calçados. Foi contratado em uma grande loja na Antônio Maria Coelho pelo senhor que viria a ser seu sogro, mais uma coincidência. “Lá comecei a namorar minha mulher, estamos juntos desde aquela época”.

Sistema de fichário ainda é usado, mas é uma exclusividade para os antigos clientes. (Foto: Paulo Francis)
Sistema de fichário ainda é usado, mas é uma exclusividade para os antigos clientes. (Foto: Paulo Francis)

Saiu do emprego ainda sem oficializar o relacionamento, solteiro, como ele mesmo pontua. "Cheguei aqui ainda sem estar casado, você acredita?". Numa de suas andanças pelo centro da cidade notou um imóvel à venda e pensou que seria interessante ter a sua própria loja, foi quando surgiu a primeira sede da Verlon.

Naquela época, a moda eram as botas emborrachadas para os homens, os Kichutes e os tênis Conga, além das botinas Zebu. Para as mulheres, chinelinhos rasteirinha tinham ótima saída, como lembra José. "Toda semana eu ia pro interior de São Paulo buscar novidades, foram 21 anos fazendo esse trajeto. Ia pro sul também", conta.

O nome Verlon é, na verdade, uma referência a uma grande fábrica no Canadá, que produzia as botas de borracha e distribuia para ele. "Hoje já fechou a Verlon de lá, a gente continuou", brinca.

Até redes cearenses ele vendia ali. "Isso daí a gente vendia muito pros turistas que ficavam ali no hotel Gaspar, que também é daquelas épocas nossas, foi um dos poucos lugares que continuou".

Papel para embrulhar as caixas de sapatos carregam ares clássicos.  (Foto: Paulo Francis)
Papel para embrulhar as caixas de sapatos carregam ares clássicos. (Foto: Paulo Francis)
Caixa registradora ainda funciona mas está aposentada. (Foto: Paulo Francis)
Caixa registradora ainda funciona mas está aposentada. (Foto: Paulo Francis)

Em 1965 abriu o segundo ponto da Verlon na antiga Feira de rua da cidade. O movimento, seguindo o alagoano, era constante. “Na 14 eu tinha seis meninos trabalhando pra mim, na feira mais quatro”, lembra ele.

Até hoje, mesmo aposentado, José faz questão de estar a frente do atendimento e garante que recebe produtos com frequência das fábricas.

A clientela fixa de mais de 30 anos pode pagar suas compras no antigo esquema de fichário. Para os novos clientes, mais jovens, como os estudantes de Medicina Veterinária que procuram botinas para ir à faculdade, a Verlon oferece a comodidade do pagamento com cartão de débito e crédito. "Isso foi uma coisa que meu filho instituiu e o pessoal gosta. A gente se modernizou também".

Um luminoso na fachada do prédio atraia olhares de quem passava pela movimentada região. Bem em frente a loja, a loja de móveis e decoração José Abraão estava instalada, quase ao lado ficava o Supermercado Soares, o que garantia uma movimentação constante na loja.

O artigo chamativo que identificava o cantinho teve que ser retirado por ordem de Nelsinho Trad. "Ele acusou poluição visual na época, era nosso chamariz", lamenta ele, até hoje.

Aos 76 anos, José ainda atende diariamente na loja e sobe as escadas numa boa. (Foto: Paulo Francis)
Aos 76 anos, José ainda atende diariamente na loja e sobe as escadas numa boa. (Foto: Paulo Francis)

Além da estrutura, detalhes dentro da Verlon provam que muita história passou por ali, como o papel que embrulha as caixas de sapatos, com número de telefone do passado, sem contar o amarelado do papel. "Quando mandei fazer os telefones fixos tinham só um três. Menina, se eu contar, tem uns dias isso tudo daqui viu", brinca ele.

José nos mostra uma caixa registrado, em ótimo estado, já aposentada, nos fundos da loja. "Ela ficou comigo por mais de 40 anos. Aqui nunca teve computador, é tudo na mão mesmo".

Alguns anos depois, quando já havia constituído família com Maria, a filha de seu ex patrão, criado os filhos, veio a terceira sede, na avenida Mato Grosso, mais pra lá da Rui Barbosa. O espaço foi um presente para os quatro filhos do casal. Infelizmente, foi o que resistiu por menos tempo, 15 anos. "Na feira a gente ficou do início até o fim, foram 23 anos".

De 1964 para 2018, o alagoano acredita que o que fez seu negócio prosperar foi o atendimento e o tempo de serviço. "A pessoa chega aqui e pode ficar a vontade, sem pressa, a gente atende numa boa, dá todo o tempo do mundo pro cliente decidir sua compra e o boca a boca faz o nosso sucesso. Com 53 anos de atendimento eu posso dizer que vendo até hoje, pra gente de todo o tipo, de todas as idades, sem preconceito e com um sorriso no rosto", finaliza ele.

Sem preguiça de trabalhar, a Verlon Calçados abre de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 18h e aos sabádos até 12h. A loja fica na 14 de julho, 2737.

Vitrines de calçados femininos, os que mais saem são os confortáveis, para senhoras mais velhas (Foto: Paulo Francis)
Vitrines de calçados femininos, os que mais saem são os confortáveis, para senhoras mais velhas (Foto: Paulo Francis)
Botinas são as queridinhas na loja, tanto para homens quanto para mulheres.(Foto: Paulo Francis)
Botinas são as queridinhas na loja, tanto para homens quanto para mulheres.(Foto: Paulo Francis)

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