ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
MARÇO, QUINTA  28    CAMPO GRANDE 26º

Comportamento

Usar "bugre" no nome não é homenagem, nem brincadeira, reclamam leitores

Naiane Mesquita | 11/07/2016 18:08
Termo surgiu na chegada dos europeus ao Brasil.
Termo surgiu na chegada dos europeus ao Brasil.

A palavra bugre é uma das mais antigas palavras relacionadas a um índio. No dicionário, remete ao tempo de chegada dos europeus ao Brasil, um tempo em que indígenas nem sequer eram considerados humanos, por serem pagãos, “sem alma”. Em Mato Grosso do Sul, onde essas questões se tornaram ao longo dos anos ainda mais complexas, devido ao genocídio e aos conflitos por terra, basta uma fagulha para incendiar o debate.

Hoje, o motivo foi reportagem publicada no Lado B sobre uma lanchonete que se apropriou do termo ao criar a marca do estabelecimento, a HamBugreria. O assunto rendeu posts nas redes sociais, de gente contra e em defesa do nome.

Antes, a cidade já conhecia o HamBugritos, sanduíche criado pelas Massas Capivaras, que são vendidos em encontros culturais e alternativos com frequência, fazem sucesso entre a galera engajada em temas sociais, mas nunca foram alvo de polêmica.

Apesar de tão incorporado ao cotidiano, quem está imerso nessa questão sente ofensa de forma instantânea. O antropólogo Antônio Hilario Aguilera Urquiza, de 53 anos, acredita que, muitas vezes, por falta de conhecimento, a população usa o termo no comércio, por exemplo. “O primeiro ponto é que em uma sociedade democrática, o comerciante tem o direito de colocar o nome que quiser. Provavelmente eles quiseram destacar a questão indígena, até mesmo homenagear, mas por falta de conhecimento acabaram ofendendo”, afirma.

Para o advogado e doutorando em antropologia, Luiz Henrique Eloy, 27 anos, não há dúvidas de que a palavra na literatura antropológica é bem pejorativa. “É um termo que designa o indígena há muito tempo e que surgiu para defini-lo para como algo não humano, que não era cristão, não tinha alma, não tinha rei, não eram alfabetizados, selvagens, pagãos. O termo bugre é uma palavra preconceituosa, que surgiu de algo errôneo, inferior, um termo bem pejorativo, infeliz e ultrapassado”, defende Eloy, que é da etnia terena.

Na discussão hoje sobre a lanchonete, muitos indígenas disseram não se importar com o conceito, pelo contrário, garantiram que se identificam com o termo. "Minha bisa era Nhambiquara, bugre que tinha orgulho de ser chamada como tal, não entendo porque toda essa polêmica acerca da denominação", postou uma mulher.

Mas para quem estuda o assunto e luta pelo respeito às etnias, o que falta é conhecimento. Uma das mais famosas artistas surgidas em Mato Grosso do Sul, ficou conhecida como Conceição dos Bugres, mas até ela não compreendia o quanto ofensivo é a palavra, diz Luiz Eloy. “Acho que os índios que não ligam de ser chamados de bugres, desconhecem o significado da palavra, a carga histórica que essa palavra trás. É muito infeliz, uma pena que um indígena desconheça o significado dessa palavra. Isso é uma coisa negativa no Brasil todo, em outras partes do País também”, ressalta Eloy.

Antônio Hilario acredita que um ou outro indígena pode pensar isso, mas que não representa toda a população. “Muitos pensam que já passaram dessa fase, mas com certeza os que tem autoestima, brio, se importam. É como ofender a mãe do outro, desqualificar. Eles poderiam ter usado outro termo etnico, mas não esse”, frisa.

Os proprietários da HamBugreria negaram qualquer intenção de ofender a população indígena, mas preferiram não comentar o assunto.

Nos siga no Google Notícias